Dos promotores iniciais do Compromisso Portugal, António Carrapatoso é quem tem mantido uma mais constante actividade de intervenção cívica, como o próprio, por certo, preferirá afirmar, surgindo múltiplas vezes como comentador convidado nos mais diversos debates televisivos, integrando grupos de «sábios» de análise e monitorização da evolução política e económica da nação e, com igual regularidade também, dando à estampa artigos de opinião política, com particular destaque para a revista Atlântico, como sucede, uma vez mais, no recente número de Dezembro.
Embora algo conotado com o Liberalismo, o Compromisso Portugal, de acordo com o que é possível ler no seu «site» oficial, não estabelece compromisso nenhum em relação ao liberalismo, seja em que circunstância for, afirmando apenas nos seus propósitos gerais de acção:
«O Compromisso Portugal é um movimento de causas que propõe:
Um Estado forte e independente ao serviço dos cidadãos.
Um Estado existe para desempenhar com eficiência e eficácia todas as funções e actividades (mas só estas) que a iniciativa e o interesse individual dos cidadãos e das suas instituições privadas não conseguem garantir.
A flexibilidade e a predisposição à mudança como atitude dos cidadãos e da sociedade no seu todo.
A igualdade de oportunidades como ponto de partida para a liberdade e iniciativa individual.
Acredita na sã concorrência nos mercados enquanto fonte de valor económico e social.
A existência de direitos sociais e de uma rede de protecção social para os que deles realmente carecem.
O Compromisso Portugal pretende intervir na sociedade enquanto essa for a vontade dos seus promotores e seja possível reunir as condições necessárias para a realização das suas iniciativas.
O Compromisso Portugal acredita em Portugal.
E que pode contribuir para fazer do nosso País um melhor sítio para viver.»
Em boa verdade, pelo que fica exposto, não só compromisso algum se vislumbra do Compromisso Portugal com o liberalismo como, mais rapidamente se identificaria como um movimento socialista daqueles que se arrogam do socialismo democrático, em liberdade e moderno, como hoje, de certo modo, se poderá também arrogar o PS desde os idos de António Guterres a José Sócrates, senão mesmo desde os mais recuados dias do «socialismo na gaveta» de Mário Soares, mas já então, de facto, socialismo democrático, em liberdade e moderno
Em causa, não está, como é natural, a genuína e recta intenção do grupo do Compromisso Portugal em verdadeira e valorosamente contribuir para «fazer do nosso País um melhor sítio para viver», como os próprios afirmam nessa extraordinária expressão de tão elevado recorte literário.
Pois bem, neste «sítio» que, todos esperamos, um dia será ainda um melhor «sítio» para se viver, onde se publica a revista Atlântico, António Carrapatoso afirma no referido artigo, intitulado «Politrix», ser a distinção entre liberais e não liberais, o que hoje realmente interessa, tanto mais quanto «em Portugal ainda não temos, nem à esquerda nem à direita, forças e líderes políticos que assumam clara e convictamente um projecto de inspiração liberal para a transformação da sociedade».
Se bem interpretamos a o escrito, António Carrapatoso, à semelhança dos socialistas de há muito e Marx em particular, está preocupado com a «transformação da sociedade» _ não sabendo nós se eventualmente também do Homem também (e já agora da Mulher, não vá sermos acusados de machistas e politicamente incorrectos), opondo apenas ao tradicional «projecto» socialista para tal fim, o da mesma «transformação da sociedade», um novo «projecto» liberal.
Assim, admitindo que, «se o Partido Socialista não vier a demonstrar vontade ou capacidade para evoluir para um projecto de real inspiração liberal, este será aprofundado e promovido com o contributo da sociedade civil, como alternativa política», António Carrapatoso propõe, em consequência, um pequeno exercício, qual seja o de confrontar as políticas seguidas pelo Governo com nove proposições do que, segundo fica subentendido, entende o Presidente da Vodafone Portugal, constituírem-se nove proposições decisivas para uma boa, correcta e sã prática liberal.
Não discutindo a contradição em termos de um socialismo-liberal, nem sequer procurando averiguar qual seja o seu pensamento sobre ser «o ponto de partida do modelo social a igualdade de oportunidades assente desde logo numa formação base de qualidade para todos», o mais extraordinário chega a parágrafos 8, com a proposta de «impostos progressivos para que se promova a coesão social, até ao ponto em que não são inibidores da inovação, da criatividade e da criação de riqueza passível depois de ser redistribuída por diversas outras formas».
Se no Manifesto Comunista, de Marx e Engels, lá está já preconizado o «forte imposto progressivo», logo depois de se defender a «expropriação da propriedade fundiária e emprego das rendas fundiárias para despesas do Estado», quem somos nós para criticar tão alta proposta, mesmo quando, na nossa ingenuidade, sempre havermos crido ser exactamente esse um dos pontos cruciais de distinção entre socialismo e liberalismo, ou seja, da negação de qualquer forma de imposto progressivo, por este último, dada a sua intrínseca natureza em se constituir, de facto, como uma das formas mais vis, iníquas e perversas de esbulho da riqueza alheia, ou seja, da riqueza de todos em geral e de cada um de nós em particular. Engano nosso, por certo.
E dpois de ler e reler o artigo em causa, procurando melhor apreender e compreender o «novo liberalismo» aí proposto, no final, não é possível evitar uma última, terrível e melancólica reflexão mas também uma certeza: neste «sítio», que todos esperamos, um dia, será um melhor «sítio» para se viver, ainda vamos ter de muito penar, por muitos e longos anos, o socialismo que nos esmaga, atrofia e, a pouco e pouco, nos mentecapta (ou socializa) a todos.