Onde está a nobreza?
Desapareceu, parece. É ridículo invocá-la, parece.
Já não existe, as antecâmaras estão certas disso.
Mas o que diz a criadagem nas proximidades dos
salões só se ouve porque estão próximos deles. E estão-lhes próximos, não
porque deles tenha senhorio, mas porque está lá para servir. Todas as certezas
da criadagem são assim sempre de segunda mão, que nem sempre é a mais hábil.
Desapareceu a nobreza? Não. A nossa época
admite-a, exige-a mesmo. Mas no estranho e no colectivo.
Que o herói asiático ou africano tenha sangue
nobre salienta-se muitas vezes, tantas quanto seria ridículo referir se fosse
europeu. Mandela tem sangue real, aqueloutro na Índia tem sangue brâmane. O
político que na Europa se ri da nobreza baixa os olhos perante o nobre hindu,
porque se sabe de baixa casta.
No colectivo é essencial. Os povos são nobres,
têm uma história antiga, os seus feitos maravilhosos. Falássemos de um
indivíduo seria snob, presunção, ridículo. Mas todos os dias ouvimos elogios à
nobreza dos costumes, da postura, das atitudes de povos.
Se bem virmos o teste é sempre o mesmo. Domina
o pequeno burguês e impõe ao mundo a sua ideologia. A nobreza é sempre a dos
outros, e nisso tem razão porque é dela desprovido. A nobreza não é de uma
pessoa individual, porque sabe que como indivíduo não a tem.
O pequeno burguês põe a nobreza onde a vê:
longe de si, no que é justiça. Onde erra é quando olha à sua volta e só vê
pequenos burgueses caso sejam europeus. O que tem de comum o seu erro e o seu
acerto é apelar à abertura, a sua e a dos outros pequenos burgueses, o que bem
precisa. Nasceu fechado sobre si mesmo, sem nobreza, e não acredita que uma
pessoa só, como ele a possa ter. O que mais uma vez é no que tem razão que
justamente o faz triste. Tem toda a razão para achar que vive num mundo
absurdo. É o da sua visão.
Alexandre Brandão da Veiga