sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

60% de muito pouco

Vai começar daqui a pouco o Congresso do PS.
Por causa disso, analistas e politólogos repetem a fórmula de que a esquerda tem em Portugal 60% ( PS - 40%; PCP - 10%, BE - 10%) e a direita 40%.

Eu digo que é 60% de muito pouco.

A abstenção é muito alta. É isso que em preocupa. Como chegámos aqui? Porque é que tantos portugueses estão distantes da política? Porque já não votam? Porque deixaram de se interessar?

Obrigatoriamente os partidos têm de olhar, neste ano de três eleições, para o país e para os portugueses e compreender que não podem governar contra as pessoas ou sem elas.

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O princípio da igualdade - a questão da homossexualidade

O Pedro Norton postou aqui sobre o casamento homossexual. Comecei por escrever um comentário, que já ía longo, daí o presente post.

Embora o Pedro fale em tolerância, e eu perceba o sentido, como pessoa, como mulher e como jurista, tendo a discordar.

Eu não quero tolerância para homossexuais, para negros, ciganos, mulheres ou jovens vindos de bairros desfavorecidos.

Eu quero um princípio de igualdade, na sua dimensão negativa - proibição de discriminação-, mas mais importante na sua dimensão positiva: promoção efectiva da igualdade.

Eu quero ver em Portugal uma cultura que não discrimine as pessoas pelo género, pela cor, pela religião ou orientação sexual, ou pela morada.


Não vemos em Portugal negros no Parlamento, não vemos mulheres CEO, não vemos casais do mesmo sexo a passearem de mãos dadas.

Todos temos amigos ou familiares homossexuais, mas vivem "com discrição" a sua situação ou até a negam, por receio de olhares reprovadores ou represálias.

Portugal não assume a diversidade, e muito menos lhe confere representatividade. Quem olhar para os órgãos de soberania, para a gestão de empresas, pensa que não existem mulheres, negros ou homossexuais no país.

Será que o casamento homossexual, só por si, resolve esta questão? Tenho dúvidas. Continuará a ser um acto privado, cheio de simbolismo é certo, mas privado. Celebrado entre amigos e familiares. No dia a seguir estes casais não poderão ir para a rua de mãos dadas, porque Portugal continuará a ser o mesmo país e o debate não se fez.

Tenho receio que a invocação do tema, e até a aprovação do casamento homossexual, só sirva para deixar tudo lampedusamente na mesma.

Gostava que se debatesse seriamente a questão da falta gritante de igualdade de oportunidades no país e que se tomassem medidas efectivas para a combater.

A título de exemplo, em França um reputado economista socialista recomenda que todas as empresas e o Estado divulguem anualmente um relatório com os dados relativos à contratação, com referência expressa ao género, raça e proveniência, como forma de publicamente fomentar as boas práticas e evitar a discriminação.

Gostava que o meu país promovesse a igualdade com medidas efectivas como esta. Esta é, aliás, a única situação em que gosto e acarinho este desgraçado princípio.

Todavia, já sei que mais facilmente se aprova o casamento homossexual do que se obrigam contratadores públicos e privados a divulgarem quantas mulheres, negros, ou residentes no Barreiro contratam.

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quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Da Visão: Um elogio da tolerância

Vale a pena abordar a questão do casamento dos homossexuais sob três diferentes pontos de vista. O da oportunidade de tal debate, o da forma em que este decorrerá e, obviamente o mais importante, o da sua substância.
1 – Do primeiro ponto de vista, há que chamar os bois pelos nomes. Ao incluir a questão do casamento homossexual na moção que apresentará ao próximo congresso do PS, José Sócrates, longe de revelar um agudo sentido de oportunidade, revela um tremendo instinto de oportunismo. O que está verdadeiramente em causa não é a substância do problema. É o «jeito» que dá discuti-lo. Com o país e o Mundo mergulhados numa crise económica profunda, com um PS muito mais ameaçado à sua esquerda do que à sua direita (seja porque à direita não há lideranças, seja porque o ambiente macroeconómico em que vivemos tende a favorecer o discurso da esquerda), o que melhor pode acontecer ao PS do que liderar uma causa «fracturante» que esvazie o espaço do Bloco e que distraia o país dos problemas mais prementes que atravessa? No plano da pura táctica política há que dar a César o que é de César: «chapeau».
2 – Vamos à forma. Dificilmente este debate sobre uma questão que, na sua essência, é uma questão de tolerância não se fará sob o signo da intolerância. Mais paradoxal ainda, e esta não é senão uma suposição minha, a intolerância será mais marcada «à esquerda» do que propriamente «à direita». Talvez porque os defensores do «não» tenham já interiorizado algumas lições do passado, mas sobretudo porque os tempos são hoje os da estigmatização mediática do «politicamente incorrecto». O «ar dos tempos» não permitirá nunca um debate equilibrado. Quer queiramos quer não, nasce inquinado. Ainda antes de se começarem a esgrimir argumentos, em campo estarão, de um lado, os progressistas, do outro, os homofóbicos ou reaccionários. Ora um debate que se queira sério tem de ser baseado na discussão da substância e não na rotulagem dos protagonistas. A táctica é conhecida mas é anti-democrática e profundamente iliberal. E o facto de se ter tornado aceitável é um preocupante sinal dos tempos.
3 – Dito isto, devo dizer que, em matéria substantiva, apoio sem reservas o direito ao casamento dos homossexuais. Digo bem: ao casamento. Não estou a falar de uma equiparação de direitos de uma qualquer união de facto, mas do direito ao casamento propriamente dito. Porque, no fim do dia, o que estará verdadeiramente em discussão é uma luta simbólica. De um lado, estarão todos quantos, estando inclusivamente dispostos a conceder uma equiparação de direitos, recusam aquilo que – com toda a legitimidade – vêem como uma ameaça para uma instituição que acreditam dever servir os valores da família e da reprodução. Do outro, os que reivindicam que o Estado tem a obrigação de dar à sociedade um sinal político, sem qualquer ambiguidade, de que repele toda a discriminação com base na orientação sexual. Num país em que, mal grado o que acima ficou dito acerca do ambiente «politicamente correcto» em que o debate se fará nos media, a plena integração social da homossexualidade continua a ser uma miragem, estou ao lado dos segundos. Mas sei bem que estaremos a pedir aos primeiros uma violentação das suas consciências. Quanto mais não seja por isso, os seus argumentos merecem o meu total respeito.

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Melómano


Já se escreveu e disse tudo sobre a entrevista de Pedro Passsos Coelho de domingo.

A entrevista tinha três fotos: Callas, uma rapariga cantora das Doce e Francisco Sá Carneiro.

Gostaria de acrescentar que para mim foi uma revelação.

Só quando vi a a foto é que percebi.

Não fazia ideia que o Dr. Francisco Sá Carneiro gostasse tanto de música.

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quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Deus não pode matar-se

Chariots of the Gods, Asha Menghrajani
Ao criar Deus, o homem conferiu-lhe um conjunto de atributos essenciais e únicos. Elejo, entre outros, a omnipotência, a omnisciência e a omnibenevolência. Para que seja consistente a narrativa romanesca e filosófica com que os humanos Lhe cantam a biografia, os atributos divinos têm de revestir necessidade lógica e resistir ao desafio infame do paradoxo. Feito o exercício, é notório que exagerámos largamente pelo menos um dos atributos de Deus, o da sua omnipotência.
Por exemplo, Deus não pode matar-se. Cada um de nós pode, se assim o entender e for oportuno, suicidar-se. Deus não. A arbitrariedade do gesto negaria a Sua eternidade. Ao que acrescem razões morais: Deus não se pode matar porque o pecado Lhe é interdito. Fomos aliás tão mesquinhos ao criá-Lo que, não Lhe conferindo essa autonomia, chegámos ao ponto de O diminuir autorizando-nos a prerrogativa de O matarmos nós – um alemão, Friedrich Nietzsche, foi o seu mais patético e minucioso executor, no final do século XIX.
Mas há mais. Há outro impoder a beliscar a omnipotência divina. Deus não pode fazer que quem viva, não tenha vivido. Estaline ou Mao-Tsé-Tung, a coberto da espúria liberdade do relativismo, deleitaram-se com a manipulação do passado, apagando vidas e reescrevendo a história. É um poder reservado aos humanos. Deus está, nesse aspecto, de mãos atadas: negar existência ao que existiu seria mentir, matéria em que Deus, por lógica, metafísica e ética, é incompetente. A omnipotência divina aplicar-se-á ao presente e ao futuro (com a excepção da possibilidade de se matar), mas não se aplica ao passado.
Deus é uma possibilidade que criámos numa noite de insónia. Oferecemos-Lhe a eternidade para que Ele a viva, minuto a minuto, como um infinito pesadelo.

(Divagação melancólica e livre sobre excertos da “História Natural”, de Plínio, filtrados por “Porquê Ler os Clássicos?” de Italo Calvino, e sobre os artigos “Divine Atributes” e “Paradoxs of Omnipotence” do “The Cambridge Dictionary of Philosophy”)

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Pornografia

Se a população de Braga lesse blogs, saberia que aquela ilustração era de um pintor famoso. Não vou fazer nenhum link, mas lembro-me de ter visto aquela ilustração num post do Manel.

Não resisto a perguntar o que seria se episódios como o do Magalhães no corso em Torres Vedras e da apreensão do livro se passassem com um Governo PSD?

Algumas pistas:Manuel Alegre falaria no alto da sua experiência de resistência anti-fascista, alguém leria poemas, íamos ouvir falar em fascismo, ditadura e 25 de Abril, democracia and so on. Cairía o Carmo e a Trindade. O BE faria umas passeatas nocturnas com umas velinhas em frente a um qualquer mausoléu, ou da embaixada dos EUA.

Governados por um governo de direita tínhamos conversa para um mês e à socapa ainda teríamos um pedido de dissolução da Assembleia da República.

Agora digam-me se desta vez não foi tudo tão civilizado? Onde está o deputado Manuel Alegre? Onde estão os defensores da liberdade?

Desculpem-me por não colocar fotos, mas acho isto tudo muito pornográfico.

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Onde está o teu coração?



Começa hoje a quaresma, os quarenta dias que antecedem a Páscoa e nos quais devemos preparar a passagem do espírito de Deus que, na terra dos homens, distingue e liberta o que é vivo e o que é morto.
Ainda no Egipto, todos os que viviam da verdadeira vida o assinalaram na ombreira da porta de suas casas com o sangue do cordeiro que, em família, comeram no temor do seu Senhor. E logo deixaram de ser escravos e o Faraó os deixou partir para que buscassem o seu Deus.
Jesus Cristo, mais tarde, tornou-se ele próprio no cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, oferecendo-se a todos e a cada um para que, comendo-o, nos tornemos dignos dessa libertação verdadeira pela qual podemos livre e eternamente buscar o verdadeiro Deus.
Uma das diferenças entre as duas Páscoas, sem dúvida, é esta: Deus, agora, está mais próximo, está intimamente presente dentro de cada um de nós. Continuamos a ter que reunir-nos em família, entre irmãos, como é próprio da natureza humana, mas a ombreira da porta tornou-se agora no coração de cada um de nós, no qual Deus toca, libertando e salvando nessa sua terrível e exigentíssima passagem.
Ora, o que aqui quero sugerir, independentemente daquilo em que cada um crê, ou julga crer, é a meditação sobre o coração. Muitas tradições falam do coração como lugar privilegiado dos homens: íntimo, sensível, puro. Mas de que é que falamos quando falamos do coração? Quem já o experimentou, no regresso desse percurso em que fora de nós, buscávamos a Deus, que agora procuramos dentro de nós? Quem já o reconheceu, nesse caminho, em que nos tornámos, e que passa sempre pelas portas da nossa carne?
Crentes e não crentes têm em comum este mesmo mistério: aquilo que eles próprios são e a partir do qual procuram, ou não, a Deus. Deixemos que o nosso pensamento passe pelas portas da carne e se eleve e aprofunde cada vez mais dentro de si. O resto é uma questão de fé: de graça e de liberdade. A este caminho até si, porém, cada um à sua maneira, estamos todos obrigados.

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terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Os livros que lemos e quando os lemos

Batalhas sangrentas, estadistas megalómanos, os mais utópicos dos profetas, alguns laboriosos cientistas, bombistas coléricos, talvez mesmo predicantes economistas, antropólogos ou criminosos em série influenciaram, em algum momento, o curso do mundo em que viveram, moldando assim o que cada um de nós é hoje e, por tabela, o mundo em que vivemos. Tenho a certeza de que o meu interesse perverso por Billy the Kid – que aos 21anos registava a tétrica contabilidade de um morto por cada ano de vida – o meu fascínio cheio de segundas intenções por Madame Curie, uma camisa que, em teenager, usei com colarinho à Dr. Jivago, terão influenciado o que sou hoje e que, confesso, oscila entre a vontade de ser um assassino com ética, o desejo de me fechar no primeiro laboratório com a mais radioactiva das físicas e o nobre idealismo individualista do médico de Pasternak.
Por maioria de razão, os livros que lemos acabam por pintar, a cores mais alegres ou mais sombrias, a personalidade que temos. Os livros que lemos e quando os lemos, tal e qual como os que não lemos quando os devíamos ter lido.
Escrevo isto enquanto folheio, de Andrew Taylor, um livro de despretensiosa divulgação, “Books That Changed the World”. Folheio-o com uma mão enquanto, com a outra, ergo, triunfal e autoritário, “Porquê Ler os Clássicos” de Italo Calvino.
Descobri, assim, apavorado, que a minha vida podia ter sido diferente. Com alguma comiseração biográfica, Goethe escreveu “Os Sofrimentos do Jovem Werther” em 1774. Escassos anos depois, dois apenas, Adam Smith redigiu, com porfiado método, a “A Riqueza das Nações”. O que é que me terá levado, em data incerta, entre 68 e 70, a ler o suicidário Werther, desconhecendo olimpicamente o ensaio de Smith? O romance de Goethe, que li em tradução brasileira e livro de bolso, por mais que eu queira não me sai da cabeça e, por mais que eu não queira, virá sempre atrapalhar-me no amor. Não me arrasta para o suicídio exasperado e romântico, é certo, mas faz-me imaginar que leio os cantos de Ossian à mulher amada, com a consequente e arrebatada erupção amorosa, “beijos vorazes” e proibidos (ou porque proibidos?), afogados gritos e fuga para reservados aposentos.
Se eu tivesse então lido “A Riqueza das Nações” a que outros arrebatamentos teria sido transportado? Estaria eu muito mais interessado na “mão invisíivel do mercado” do que nos “lábios trémulos e balbuciantes” de Charlotte?
Li “Moby Dick” de Melville em vez de ter lido “Das Kapital: Kritik der politischen Ökonomie” de Karl Marx, apesar de ambos serem ficções escritas na segunda metade do século XIX.
Seis anos separam o “Ulysses” de “O Amante de Lady Chatterly”, um e outro escritos na modernista década de 20, no século passado. Atraído pelas lições de classe e sexo de D.H.Lawrence, desrespeitei a cronologia e deixei para adiadas calendas a hermética subversão das convenções narrativas proposta por James Joyce.
Se, rapazinho, frescas faces e cheio de vida, tenho lido primeiro “Das Kapital” em vez do pescador de baleias, se tenho lido primeiro “Ulysses” em vez das saudáveis descrições sexuais de Lawrence, será que estaria hoje a braços com a crise do BPN? Ou enterrado num departamento de estudos semiológicos?
Feliz por ter lido o que li, e quando li, tranquiliza-me o que acabei mesmo agora de ler em Calvino: “Um clássico é um livro que vem antes de outros clássicos, mas quem leu primeiro os outros e depois lê esse, reconhece logo o seu lugar na genealogia."
O arrebatamento de Charlotte e Werther

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Particularidades "IIX"



Para juntar às idiossincrasias destes bloggers do Geração.....

1. Como se pode constatar aqui, vivo obcecado com Tsunamis. Desde miúdo terei tido mais de trinta sonhos envolvendo um tsunami. A onda que chega, o pânico causado pela sua sombra e o seu rumor avassalador terminam sempre com um acordar em sobressalto. Seria recomendável visitar um médico, mas de alguma forma comecei a apreciar a realidade virtual destas experiencias. Estou convencido que vivia em Lisboa para os lados de Santos já no ano de 1755.

2. Gostei de comer os restos de todo o tipo de papas e sopas e mistelas inacreditáveis que os meus filhos comiam quando eram pequenos. Sobretudo se polvilhadas com um pouco de Parmiggiano Reggiano “grattuggiato” de primeira qualidade.

3. Tal como a Sofia G. gosto de ler vários livros ao mesmo tempo. Gosto de consumir os minutos iniciais de uma leitura em curso e entre muitas outras, a tentar situar de novo os personagens ou as linhas de raciocínio do autor, como quando em viagem, acordando num quarto de hotel e não sabendo em que cidade estou, procuro mentalmente refazer o percurso da noite anterior.

4. Gosto de política mas não gosto de partidos políticos Sou gregário mas não gosto de clubes. Ser do Sporting e escrever neste blog são já por si clubismos que representam para mim mesmo uma grande excentricidade.

5. Gosto das cidades Asiáticas tipo “Blade Runner”: Bankok, Seoul, Xangai, Mumbai. Poluídas, densamente povoadas, ricas de experiencias olfactivas estonteantes, consumidas por uma opulência decadente e uma pobreza esmagadora. Tudo me atrai e estimula. São aquilo que uma cidade da idade média provavelmente seria à 1000 anos atrás somando-lhes o motor de explosão, os sacos de plástico, o McDonald’s e as lojas do Louis Vitton.

6. Apesar do irritante reinado de Sócrates (e dos seus clubistas detractores também) continuo a alimentar o sonho de voltar a viver em Portugal “full time”. Apesar de tudo e’ ainda um soalheiro e prazenteiro canto do mundo e a cidade de Lisboa, por mais que a queiramos descrever como um destroço nas mãos de sucessivos incompetentes, continua a resistir ao assalto, mantendo-se orgulhosamente como a mais bela da Europa.

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segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Barcelona, Barcelona, Barcelona - Vicky,Christina


Os périplos de Woody Allen pelo velho continente já nos deram três filmes ingleses, sendo Match Point um 5 estrelas, agora um espanhol(catalão)e fala-se num próximo francês.

Este filme é desavergonhadamente um serviço ao turismo da capital catalã. Estão lá todos os postais de Gaudi.

O filme é um postal filmado a amarelo, laranja e encarnado. As americanas de serviço em passeio turístico por Barcelona são uma rapariga com físico de girafa e a musa Scarlett.

Ambas vão ser alvo da luxúria do pintor Javier Bardem.

Está tudo muito bem até aparecer Penélope Cruz que nos é oferecida em versão muito morena, louca, deusa do sexo, sensual, louca, culta, talentosa, virtuosa, amante livre. Está lá tudo, até a cena a andar de bicicleta, descalça, de chapéu de abas largas na cabeça.

De repente as americanas parecem tão deslocadas como daquela vez que Ava Gardner veio a Espanha ver os touros e os toureiros.

De vez em quando a Academia deixa-se levar por estes arroubos de histórias de países longínquos e gosta de mostrar que mulheres de pele escura, cabelo escuro e narizes tortos até têm um certo interesse.

É um cliché, evidentemente. Por isso gosto da Pê quando Almodovar a filma, não como um poster de mulher fatal, mas como uma mulher bela de carne ( que mata e cozinha) e osso ( quando morre de Sida).

Se o cliché resulta?

Resulta, porque raramente resistimos ao belo.

Quem resistiria a um Javier Bardem especado no meio da arena a agitar levemente a capa encarnada, ainda que saibamos que por baixo está a espada que nos matará?

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Particularidades Partilhadas



Depois de ler as “confissões” das minhas amigas e dos meus amigos da Geração de 60 detectei que algumas das minhas particularidades não eram, afinal, assim tão particulares.

Diminuído na minha singularidade, mas melhor acompanhado, deixo-vos um (pequeno) resumo das mesmas:

1. Partilho com a Sofia Galvão a particular forma de me calçar ainda que com algumas nuances (nunca somos absolutamente iguais, nem nas nossas excentricidades).

No meu caso, calço meias e sapatos enfiando sempre primeiro o pé direito mas visto as calças começando sempre pela perna esquerda. É proibido e, como é evidente, perigoso, trocar os pés nesta importante tarefa.

2. Partilho com o Pedro Norton a escolha dos restaurantes (ou, melhor, a ausência de escolha).

Para mim, são sempre os mesmos. Se um dia for mal servido ou mal tratado, não me queixo. Desapareço para nunca mais voltar (e o cuidado no serviço é muito mais importante do que a qualidade do repasto).

Mas não é apenas o restaurante que deve ser o mesmo. Também os pratos não podem variar. Como se diz no desporto, em equipa que ganha não se mexe.

3. Partilho com o Gonçalo a forma de ler através do sublinhado ainda que (cá está mais uma nuance) apenas quando leio “não ficção”.

Não sei ler de outra maneira. As palavras perdem o sentido e não “casam” umas com as outras. Dançam nas páginas e apenas o sublinhado as alinha e lhes dá a lógica original. Acredito que, na ficção, seja o fio da história o traço unificador.

4. Partilho com a família real inglesa (não faço a coisa por menos) a proibição, por mim instituída entre os Guimarães, de viajarmos juntos de avião.

Na melhor (?) das hipóteses, vamos a Mariana e eu, mas, nunca!, nós e os miúdos (e, estes, nunca todos ao mesmo tempo). E, em qualquer dos casos, sempre com seguro feito na véspera e um testamento assinado e confiado à minha Mãe.

5. Partilho com um grupo de bons amigos o gosto por ser fisicamente amassado jogando rugby numa equipa de veteranos.

Esta particularidade permite-me, de caminho, gastar a totalidade do subsídio de férias em sessões de fisioterapia, anti-inflamatórios e emplastros Leão.

6. Finalmente, e porque não há regra sem excepção, não partilho a opinião negativa da Sofia Rocha sobre "a visão estilizada da vida de muitas mulheres” marcada pelo “contorcionismo e maleabilidade para agradar a terceiros".
Isto, desde que o terceiro seja eu, claro...

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"Milk"


Milk, o filme que deu o óscar a Sean Penn é um excelente filme.
É um excelente biopic, com um argumento bem escrito, que segue de perto a vida do activista e político.

Sean Penn é o herói improvável, o actor dá o corpo e alma ao filme. É impossível ficar indiferente à cena do metro em que um pequeno e insignificante colarinho branco seduz um Deus jovem e belo James Franco. Está lá tudo: a sensibilidade, o desamparo, o desejo. Só essa cena já lhe daria o óscar.

Milk é um homem com um propósito, que faz desse propósito um programa político, que atrai os media como a luz atrai as traças.

É um filme sobre política, é um filme sobre os media. Um filme que serve uma causa.

Será Milk um Product Placement?

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Estou vingado




Não, não vou invocar os Óscares para dizer que tinha razão nesta minha contenda com o Pedro. Mas depois dos meus vitupérios a propósito do Benjamin Button, aqui ficam duas recomendações cinematográficas:


1 - A dúvida. Um argumento perfeito (John Patrick Shanley, autor da peça com o mesmo nome) e dois dos melhores actores da actualidade (Meryl Streep e Philip Seymour Hoffman). Não é preciso dizer mais.

2 - Milk. Sean Penn (a justificar plenamente o Óscar) e Gus Van Sant no seu melhor.


Despachem-se. O único risco que correm é ficar sentados ao lado de uma criancinha vestida de princesa ou de cowboy a comer pipocas. O que, bem vistas as coisas e tendo em conta as temáticas dos filmes em questão, não é muito provável.

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domingo, 22 de fevereiro de 2009

Manifesto patriótico anti-burguês



Aqui vão 13 para o Manifesto em resposta ao Manuel.
Soa a antigo. Mas a actualidade - nas ideias e nos hábitos - deixou-se aburguesar de tal maneira que torna difícil o aggiornamento do manifesto. Acrescentem e zurzam.

1 - Recusar os espanhóis
2 - Calar ao som da guitarra
3 - Achar consolo poético
5 - Não dar nome aos sentimentos
6 - Gostar da causa perdida
7 - Perdoar o toiro abraçado
8 - Gostar de azeite há mais tempo
9 - Usar o encanto escondido
10 - Partir com saudade
11 - Mestiçar
12 - Rezar em andamento
13 - Rir da vaidade

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Particularidades

Atrasado como sempre, aqui vai:
1 - coleccionar livros de listas (os "melhores" hotéis, restaurantes, discos, filmes...) e sublinhá-los obsessivamente até não mais os perceber
2 - praguejar como um taberneiro da Cornualha quando falho um golo
3 - ter desenvolvido uma egocêntrica urticária pela mediocridade
4- fazer 400 kilómetros para comprar um objecto de valor artístico tão difuso como o "Noite Gótica" do Arthur Penn (a Internet sepultou para sempre estes prazeres)
5 - entusiasmar-me SEMPRE mais com biografias reais do que ficcionadas
6 - ter mais dificuldades do que uma criança de 9 anos em recusar um doce, qualquer que seja o ingrediente ou aroma (à excepção dos frutos secos)
7 - Sonhar acordado mais vezes do que, provavelmente, seria conveniente
8 - Sonhar em ter a coragem de fazer uma lista destas apenas com incúrias, inconveniências e impropriedades

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sábado, 21 de fevereiro de 2009

Pedido de desculpas

A propósito da ida do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares à RTP, Augusto Santos Silva, ao programa " Grande Entrevista", em que exigiu, em directo, um pedido de desculpas da RTP pela promoção do programa com recurso à frase da sua autoria sobre a malhação, pedido esse prontamente satisfeito, só me ocorre uma coisa.

O meu próprio pedido de desculpas.

Sr. Edmundo Pedro, eu estava enganada, peço desculpa.
Afinal, temos todos razões para ter medo. Fora do PS, por maioria de razão.

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" O Mandarim maravilhoso"



Hoje há Mandarim Maravilhoso, de Bartók, concerto comentado com a Orquestra Gulbenkian na Fundação.

Não há melhor forma de incutir nas crianças o gosto pela música do que fazer disso uma festa.
Pespega-se a ilustração do cartaz no frigorífico, começa-se a falar do acontecimento dias antes, logo de manhã, hoje vamos ao concerto, Mãe, não me apetece, Não podíamos ir antes ao cinema, ou ao Museu da Ciência ( para quem não saiba o museu da Ciência tem uma casa em construção onde se manobram gruas e uma cama de faquir...).
Não, vamos ao concerto. Prometo lanche na Versailles: chocolate quente e tosta mista.
Então, tá bem.

A música é uma festa que dá cabo da dieta.

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Deputada europeia, com pontinha de mau génio, dá um saltinho ao Porto


Fazia notícia ontem no Público a candidatura de Elisa Ferreira à Câmara do Porto. Hoje continuação do tema nos semanários.

As duas notas que mais me desagradaram:

A primeira, para dar conta que Elisa Ferreira, enquanto se candidata à Câmara do Porto, continua a assegurar o seu lugarzinho no Parlamento Europeu. Em bom português politicamente incorrecto, " Tem um olho no burro e outro no cigano".

A segunda, pelas palavras do Primeiro-Ministro " Ela tem até aquela pontinha de mau génio que só as mulheres com carácter têm: sabe dizer não quando é preciso dizer não."
Ou seja, tem mau génio, mas é só um bocadinho. E até sabe dizer que não, mas é só às vezes, muito de vez em quando.

Uma politica que diz claramente que só lhe interessam os lugares e um Primeiro-Ministro que tem uma tirada machista, tudo junto na mesma notícia e referindo-se à mesma pessoa.

Merecem-se.

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Particularidades


( Rembrandt - National Gallery, Londres)

Vaidade
Inveja
Ira
preguiça
Gula
Luxúria

Deus me perdoe, pois só não peco por avareza.

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sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Particularidades vagas V


Correspondendo ao desafio:


1. Gostar de Portugal.

2. Ser de pouca Fé, com pena.

3. Sentir, no Mar, o passado e o futuro.

4. Dar crédito ao infinitamente grande e ao infinitamente pequeno (com pena).

5. Ter horror ao lugar comum, à burguesia, ao politicamente correcto, à ignorância letrada.

6. Desacreditar nas intensidades momentâneas

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Particularidades (IV)


Quebrar correntes é temeridade que prefiro evitar. Como diria o Pedro, pelo sim, pelo não.

Desta vez, depois de gostos e de ódios, as particularidades são o mote. E, de novo, o Manel toca a trombeta...

Pois, assim, eu me confesso:

1) A desarrumação inquieta-me. Tenho um primeiro momento de absoluta inacção, incapaz de perceber por onde começar e sem entrever onde acabar. No fim, peço ajuda. Não sei arrumar sem ajuda.

2) Leio sempre vários livros ao mesmo tempo. Escolho-os, à vez, por puro impulso. Numa escolha sempre certa, adequada ao que aquele momento concreto me pede...

3) Prefiro camarotes ou coxias. Deve ser o meu lado fóbico, mas confesso que o prazer é outro.

4) Detesto ler jornais já lidos. Vincos amachucados, cantos revirados, dobras desacertadas, tudo me repele. Boa parte do encanto já não está lá. Pura e simplesmente.

5) Calço sempre primeiro o mesmo pé, variando embora entre meias (o esquerdo) e sapatos (o direito). Não sei porquê, mas é assim. E se por um instante a coisa ameaça falhar, um imediato desconforto impede a tragédia. E a ordem retoma o seu lugar, serenamente, dando-me paz.

6) Sou absolutamente intransigente na defesa do meu direito ao silêncio naquela primeira hora matinal que antecede o pequeno-almoço. Nessa fracção curta de tempo, não sou social. Ainda não estou para os outros. Aqueles primeiros momentos do dia são meus e são só para mim. Todos os dias.


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Taras e particularidades, parte III




Não quero que o Manuel me acuse de quebrar a corrente (com todos os cataclismos que isso possa provocar):


1 - Sou tão católico como o Manuel mas já decidi que, pelo sim , pelo não, vou mandar chamar um padre quando chegar a minha hora. É uma questão de cálculo probabilístico.

2 - Sou verdadeiramente obsessivo, com a arrumação dos meus livros. Se alguém me quiser irritar verdadeiramente, basta trocá-los de lugar.

3 - Gosto de repetir restaurantes e refeições. Escolho quase sempre o mesmo em cada restaurante e há vários anos que como tomate com mozarela, no mínimo três vezes por semana.

4 - Gosto de cinema mudo sueco. O facto de ser mudo tem, além do mais, uma enorme vantagem: não preciso de aprender a falar sueco.

5 - Não dispenso uma sesta ao Domingo. De preferência com o ruído difuso (mas mesmo muito difuso) dos meus filhos a brincar no quarto deles.

6 - Adoro o Benfica mas odeio o desporto em geral, especialmente se praticado por mim.

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" A quadratura do Círculo"


Política e media, dois universos distintos, com regras próprias.

Para quem observa sem dominar as regras de nenhum desses sistemas, percebe facilmente que têm espaços, compassos e "tempos" próprios.
Como observadora do fenómeno acho-o muito interessante.
Neste blog coexistem pessoas ligadas aos media, outros ligados à política, pessoas mais conhecedoras de ambos os domínios do que eu, é possível por isso que ( também )neste tema não concordemos.

Há um par de meses, o programa Quadratura do Círculo da Sic-Notícias foi filmado na Figueira da Foz, fora do estúdio normal. O mesmo moderador, dois convidados habituais, Pacheco Pereira e Lobo Xavier e em vez de António Costa, Rui Rio.

Gostei muito de ver aquele programa, foi muito interessante... porque correu mal! Tive oportunidade de perceber porque é que correu mal.
Rui Rio, embora político experimentado e Presidente da Câmara da segunda maior cidade do país, não dominava o meio (a TV), perdia-se nas ideias, não concluía, dava exemplos, parecia crispado.

Vista de fora a tv parece fácil. Naquele momento, quando um "corpo" estranho foi introduzido naquele espaço, parecia um grão na engrenagem.
Aquilo que parece fácil, quatro pessoas, num estúdio, 50 minutos, 3 temas, é afinal mais difícil: exige técnica, profissionalismo ( entenda-se, as regras daquele meio). Naquele dia percebi, por exemplo,que os exemplos longos eram proibidos.

Não sei se foi impressão minha, mas pareceu-me que Pacheco Pereira que zurze habitualmente nos media e na sua má-fé - mas que claramente domina as técnicas e o meio- parecia divertido com a inabilidade do colega de partido. Naquele dia foi patente que não havia má-fé de ninguém, só a falta, pelo político, do domínio de uma técnica específica.

Já vi Marcelo Rebelo de Sousa gastar um programa na RTP2 para distinguir opinião e comentário. Já vi o Miguel Sousa Tavares gastar uma página na Bola para distinguir isenção e independência.

Opinião, comentário, isenção, independência, tanto se me dá.
Tenho gostos e preferências, gosto dos media, gosto da política. Tomo parte, sou militante de um partido político.

Armada dos meus gostos, preferências e ideologia, faço um esforço permanente para que não me toldem o juízo, nem me retirem o bom-senso.
Como política não terei de me esforçar por esconder as minhas preferências.
Mas como política, e se quiser aceder aos media, tenho de me esforçar por compreender e dominar as regras próprias desse sistema.

( a continuar )

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Particularidades / Excentricidades!


Pormenor de Cristo com a Cruz às Costas de Jerónimo Bosch


Respondendo ao desafio do aventureiro Manuel S. Fonseca, feito aqui, indico 6 das minhas particularidades/excentricidades:

• Sublinho (quase) todos os livros que leio: estou sempre à procura do essencial.
• Angustia-me acabar de ler um livro, de tal maneira que muitas vezes não acabo.
• Angustia-me começar a escrever um livro, de tal maneira que muitas vezes não começo.
• Não consigo passar um dia sem ler nem escrever um livro, de tal maneira que estou sempre a acabar e a começar.
• Entusiasmo-me muito depressa, desiludo-me muitas vezes e perdoo com facilidade.
• Não aprendi ainda o meio-termo: passo de excêntrico a central e outra vez a excêntrico; de invisível a evidente e outra vez a invisível - o que para mim é um mistério. Vivo, por isso, às vezes muito sozinho, embora me comova muito com muitas pequenas coisas (nesta altura, por exemplo, comovo-me quase todas as noites relendo as Confissões de Santo Agostinho).

Acrescentaria ainda uma sétima:

• Em termos gastronómicos, gosto de quase tudo, excepto, talvez, de miolos e de puré de batata de pacote.

Já está. Espero que a correia não se parta!

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Alternativa

Foto encontrada aqui
Se, em Portugal, soubessemos em que é que concordamos politicamente, talvez fosse mais fácil saber em que é que discordávamos de facto e com substância.

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quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Particularidades

A cadeia quebrada
Fizeram-me aqui um desafio. E como o dito vem de quem vem e de blog onde eu conheço pessoalmente (e estimo, o que põe muito em risco os próprios) cerca de um terço dos competentes escribas, não consigo furtar-me ao confronto. Vamos lá, então, participar nesta corrente mística, muito hocus pocus, elencando 6 sinais particulares que definitivamente justifiquem internamento imediato em local propício:
1. Ter a mania que vou escrever, numa semana, uma dissertação de mil páginas sobre o uso da palavra dor em Wittgentstein;
2. Detestar que digam “eles” quando se fala dos diferentes poderes;
3. Estimar o catolicismo apesar de funda crença agnóstica;
4. Gostar de pessoas que não aceitam convites;
5. Aceitar todos os convites;
6. Achar que o melhor do presente é a maleabilidade do passado. Futuro? Who cares!
E agora que a coisa ficou lavrada em acta, lavre-se também que quebrei a corrente, a menos que os meus estimados co-bloggers da Geração de 60 puxem dos violinos e se atrevam ao concerto.

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António Aleixo (III)


Para acabar, aqui vão mais 4 das suas quadras:

1. Declaração de princípio:

«Julgando um dever cumprir,
Sem descer no meu critério,
- Digo verdades a rir
Aos que me mentem a sério!»

2. Conselho ao país:

«Quem prende a água que corre
É por si próprio enganado;
O ribeirinho não morre,
Vai correr por outro lado.»

3. Conselho aos governantes:

«P'ra mentira ser segura
e atingir profundidade,
tem que trazer à mistura
qualquer coisa de verdade.»

4. Novo conselho aos governantes:

«Vós que lá do vosso império
Prometeis um mundo novo,
Cuidado, que pode o povo
Querer um mundo novo a sério!»

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quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Viajando para o Japão



Ora bem

A Europa é o principal aliado dos EUA segundo dizem. Talvez quem o ache deva disso informar o governo americano. Apesar de tudo há símbolos. Que a primeira visita da secretária de estado seja ao Japão e que a senhora refira que a Ásia é fundamental para os EUA não ofende ninguém. Mas quem se julga casado e é apenas o número dois na vida alheia tem de pensar porque só vai ser visitado em segundo lugar.


O mesmo se diga de Obama. A sua primeira viagem é para o Reino Unido, para a Alemanha? Não. Para o Canadá.

Para onde vá a Hilária ou o Barak não é o que interessa em si mesmo. Gerem bem os seus interesses e os do seu povo e só os posso aplaudir por isso. Há símbolos na política e os símbolos dizem sempre qualquer coisa. Que os americanos não nos ponham em primeiro lugar é de seu direito e só mostra inteligência da sua parte. Não os critico. Que quem é deixado para segundo lugar ainda se ache preferido é apenas sinal de baixa auto-estima.






Alexandre Brandão da Veiga

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Dustin Hoffman e Manoel de Oliveira




No tradicional Proust Questionnaire da Vanity Fair (edição de Fevereiro) Dustin Hoffman, quando confrontado com a questão “qual a pessoa viva que mais admira”, responde: “o realizador português Manoel de Oliveira que, com 100 anos, ainda trabalha”.
Não sendo a pessoa viva que mais admiro não deixo de concordar que é absolutamente extraordinário.

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A segunda onda


1. A segunda onda do Tsunami aproxima-se agora “in full speed”. O colapso do mundo financeiro na Europa de Leste começa a parecer-se cada vez mais com a crise Asiática de 97. Estou convencido (e espero) que esta seja a segunda e ultima onda a abater-se sobre as nossas costas europeias ocidentais. No entanto, e tal como a segunda onda de 2004, esta vai seguramente ser ainda mais violenta e irá destruir muito do que resta das nossas instituições financeiras. Segundo a definiçao de Putin (from all people..) está agora criada uma "Perfect Storm". A seguir com atenção e temor.

2. Continuando a olhar para a bola de cristal, prevejo que muito rapidamente iremos ver aquilo que são hoje grandes instituições universais dos “media” colapsar como castelos de cartas (ou de papel de jornal).

3. No entanto nem tudo será "doom and gloom". Considerando o nosso blog como uma forma de comunicação “low cost”, sem dívida e independente da publicidade, penso que o Geração 60 conseguirá sobreviver a tudo isto.

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terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Viva a diversidade!

Há por aí uns movimentos de esquerda que estão a ficar quase-perigosos. Andam todos contentes porque já têm, segundo vários cálculos, 20% do eleitorado. Parece que em França se passa o mesmo, já que lá também o eleitorado à esquerda do PS chega aos mesmo números nas sondagens. Essa esquerda proteccionista e algo revanchista (if you get my meaning) está à conquista de tudo. Ontem soube que um amigo meu tinha sido convidado para um blog por essa esquerda (não sei qual blog), sendo que se lhe havia sido atribuído o epíteto de "ideologicamente diverso" e que era essa a razão-mãe do convite. Ora isso mesmo, ideologicamente diverso (o meu amigo é de "centro-direita", diz ele, logo de direita, logo neo-liberal, logo responsável pela crise, etc. etc.). Já viram? São generosos. Afinal aceitam todos os desvios, sexual, racial, e mesmo político. Assim fico descansado, pois não haverá perigo se chegarem novamente (if you get my meaning) ao poder.

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Velhos são os novos (e vice-versa)

Depois de ler o post do Pedro estive quase para não ir mas procurei um pouco mais e cheguei a um excelente sítio de críticas de cinema. Não consigo explicar porque não me ocorreu fazer isso antes. Parece que gostava de dizer mal dos nossos críticos (com excepção do Eurico de Barros, cujos textos todavia não se podem ler na net - e como já ninguém compra o DN...). E encontrei os famosos Rotten Tomatoes. Aconselho vivamente o site. E fui ver o filme. E acabei por gostar, não, acabei por gostar muito. Mas percebo que é um filme que ó se gosta ó se não gosta. E confesso que não consigo bem explicar porque gostei. Mas a explicação deve estar relacionada com a coisa de o filme brincar com a idade. Ao princípio parece mesmo que nem a avó morre, nem se janta e os 10 primeiros minutos não são o melhor do filme. Mas gostei, gostei mesmo. Mesmo tendo quase 3 horas. Ora viva a diversidade.

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Lucrécio e a Gestão

Lucrécio foi um poeta e filósofo latino, de seu nome completo Titus Lucretius Carus, que morreu no ano 55 a.D. e escreveu uma grande obra de inspiração Epicurista chamada “De Rerum Natura”.

Não é deste livro que aqui se fala mas de uma frase, também dele, que diz (mais ou menos) o seguinte:

“Lamento o modo pelo qual aquilo que queremos é escolhido mais por ouvir dizer do que pela evidência dos (nossos) próprios sentidos”.

Vem isto um pouco a (des)propósito de um artigo do Finantial Times, (já com algum tempo mas que agora reli) com o título “Os vencedores têm de ser obsessivos com os factos na sua procura da verdade” (“Winners must be fact obsessed in their pursuit of the truth”).

O autor do texto começa por afirmar que as decisões tendem a ser tomadas com base em informação imperfeita, realidade que se pode considerar trágica até pelos efeitos naturalmente inesperados - e potencialmente negativos - que este tipo de gestão tende a provocar.

Com base neste facto, defende que os “analytics” – o uso rigoroso de dados / informação no planeamento e “modelling” de cada negócio – são hoje a chave para bater a concorrência. É necessário saber “bater as teclas” certas e ter a capacidade (a competência) para interpretar os dados de forma inteligente e actuar de acordo com o que nos diz a informação.

Ainda no mesmo sentido, um Professor americano, Davenport de seu nome, que publicou há tempos um artigo na Harvard Business Review (intitulado “Competing on Analytics”), escreveu que as companhias leaders não sabem só que produtos querem os seus clientes; sabem também os preços que estão dispostos a pagar, quantos itens comprarão ao longo de uma vida e que gatilhos (triggers) farão disparar as (suas) vendas.

Diz ainda que a decisão fundada em factos (fact based decision making) tem de fazer parte da cultura de qualquer empresa devendo ser constantemente enfatizada e comunicada pelos executivos seniores.

Uma boa forma de pôr o conceito em prática é perguntar em face de qualquer questão:

“Pensamos que é assim ou sabemos que assim é?”.

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A senhora que não tem nada para vestir


Na entrevista de ontem à Sic, Carlos Queirós disse que o que herdou tinha resultados, mas não tinha equipa. Imagino que a frase vá ser tema de opinião, comentário, artigo, jornais, blogs. Vai ser dissecada, ridicularizada, então não havia equipa?!

Imaginemos uma senhora amiga da ex-mulher do Deco. Imaginemos. Ía de avião até Barcelona, passar uns dias de férias na mansão. Chegada lá, a sua mala não aparece, tinha sido extraviada.

Estava quase na hora do jantar e da festa e a senhora sem mala. A rapariga solicita, abre os numerosos roupeiros do quarto de vestir. Reluzem lantejoulas, brilhos, padrões de zebra,leopardo e tigre Dolce & Gabbana, peles de cobra e de crocodilo, tops, penas, mini-saias,vestidos de noite com rachas vertiginosas Roberto Cavalli.
Filas de sapatos alinhados de cores berrantes com plataformas e 12 cm de salto.

A Senhora perante aquele cenário estaca. Tudo aquilo será apropriado para brasileiras, bonitas como Deus as faz, com menos 20 cm e menos 20 kg, para sambar ou para a praia.

A Senhora sente falta das suas roupas pretas e cinzentas, sem decotes, nem rachas. Não tem corpo, e se tivesse faltava-lhe a vontade, de vestir aquelas roupas ou de calçar aqueles sapatos.

Sente falta do seu sobretudo escuro, da camisa de seda branca de laço, da saia preta, da sensação de decência e conforto.

Especada perante os roupeiros abertos, a Senhora, nua, conclui que não tem nada para vestir.

Qualquer mulher consegue entender isto.

Jaciara, não é nada de pessoal.

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António Aleixo (II)


E agora: de quem falaria ele?

1. Antes das primeiras eleições:

«Sem que o discurso eu pedisse,
Ele falou; e eu escutei.
Gostei do que ele não disse;
Do que disse não gostei.»

2. Depois das primeiras eleições:

«Tu, que tanto prometeste
Enquanto nada podias,
Hoje que podes – esqueceste
Tudo quanto prometias…»

3. Antes das segundas eleições:

«Vinho que vai para vinagre
não retrocede o caminho;
só por obra de milagre,
pode de novo ser vinho.»

4. Depois das segundas eleições:

Vamos deixar em suspenso!

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segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Big Pharma and the Medici Effect


Manter em vida o chamado “Big Pharma” e’ neste momento um desafio gigantesco. Ao peso de uma pressão reguladora que pretende medicamentos “risk free”, associa-se por um lado um forte decréscimo de produtividade no desenvolvimento de medicamentos apartir da sua raiz química em benefício da área das chamadas “small biotech” e por outro o aumento do numero de medicamentos conhecidos como “blockbusters” pelo seu enorme sucesso comercial, que terminando nestes anos as suas patentes ficam assim a mercê de genéricos que a 30% do custo do medicamento original chegam a “comer” 70% do mercado em menos de um mês após a sua comercialização.

Considerando que o desenvolvimento de um destes “blockbusters” custa hoje cerca de mil milhões de dólares, e que se uma vez era possível comercializar o produto após 5 anos de desenvolvimento, hoje em média são necessários 15 anos para finalizar o processo de desenvolvimento e aprovação, (o que resulta em escassos 5 anos de exclusividade para recuperar o investimento feito), resulta pois quase impossível manter o clássico modelo de negócio farmacêutico, mantendo ao mesmo tempo, um pipeline rico de produtos, de elevado throughput e capaz de gerar trabalho estavel e bem pago.

Tudo isto para referir que estão assim reunidas as condições para o vento de mudança estratégica que está a começar a varrer muitas organizações (em particular as que têm como base uma forte competencia em R&D) na direcção de encontrar novas formas de colaboração que permitam diminuir os custos e aumentar o acesso à inovação e a novas sinergias tecnológicas.

A transformação de grandes campus de investigação ate’ agora de propriedade exclusiva de uma empresa em espaços abertos onde plataformas tecnológicas são partilhadas por inúmeras “ventures” que se apropriam de equity e dividem o risco, ou inclusivamente o spin-off comercial de algumas competências com a criação de empresas dentro de empresas, de forma a absorver custos fixos e a diminuir a necessidade de despedir, são assim e tambem exemplos de uma nova forma de ver a investigação e o desenvolvimento. A Olandesa Philips esta a construir um High -Tech Campus em Shanghai á imagem do open campus que desenvolveu nos seus headquarters em Eindhoven. Considerando que muitas das novas indústrias de desenvolvimento mais recente têm como génese modelos de negócio que se baseiam exclusivamente neste tipo de princípios de "open-campus", penso que iremos ver mais e mais exemplos desta fragmentação e desagregação de competências e de tecnologia em indústrias tradicionais que por definição tem sido muito mais monolíticas e agarradas as suas “working ways”. Os tempos são propícios a mudança e quem neste momento, em que os modelos tradicionais se encontram em profunda crise, se mexer depressa e bem, adquirirá seguramente vantagens competitivas que permitirão não só a sua sobrevivência financeira a curto prazo mas também a garantia da criação de valor e de produtos inovadores durante a incerta e misteriosa década que se aproxima.

Para quem se interessa por temas de inovação e colaboração recomendo dois excelentes livros da Harvard Business School Press: “Science Business” de Gary Pisano, e “The Medici Effect” de Frans Johanssen. Este segundo livro em particular, abre com um muito interessante exemplo em que refere o Peter’s Café na ilha da Horta nos Açores como tendo sido nos anos, um epicentro de inovação das artes náuticas, e um prolifico e creativo local de encontro de gente rica em muitíssimas e variadas disciplinas profissionais e proveniente de praticamente todo o mundo.

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domingo, 15 de fevereiro de 2009

NY Clues

Encontrando-me sozinho em Nova Iorque num destes últimos sábados (dos amigos e amigas que ali tinha já nenhum lá vive), resolvi dedicar-me a um boémio programa nocturno. Assim, debaixo de uma tempestade de chuva e vento dirigi-me à Village para assistir, no muito underground off-off Broadway Cherry Lane Theatre, a “SPIN”, cinco pequenas peças teatrais escritas por uma serie de emergentes playwriters e interpretadas por um brilhante e jovem cast. O monologo de um agente da CIA lutando contra os seus fantasmas após ter torturado e morto um prisioneiro em Guantanamo, um telefonema entre um drogado em reabilitação e a namorada ninfomaníaca, um actor de filmes porno tentando seduzir uma actriz de filmes fetiche, e um concurso televisivo entre um soldado morto no Iraque e a Britney Spears tentado premiar quem mais misérias viveu (ganha a Spears naturalmente), é um conjunto de temas que me fez pensar estar perto do mais original e criativo “juice” teatral. Naturalmente que ao ler aqui esta virulenta crítica fiquei um pouco como o João Wemans ao ler o Pedro aqui.


Após tamanha dose de cultura, acabei a noite no muito radical-chic e trendy "Le Poisson Rouge", onde por volta da uma da manha se apresentou este fantástico Matthew Dear e os seus Big Hands de quem aqui deixo um rasto e que me perdoe o Manuel S. Fonseca.


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Tales of 3 cities

Três boas razões para regressar à leitura de banda desenhada e em particular à sua forma menos popularizada, a “Graphic Novel”

“Berlin” de Jason Lutes. Dois volumes ambientados durante o dramático período da Republica de Weimar, numa reconstrução histórica e política ritmada e empolgante.



“New York” de Will Eisner. Uma muito acida e irónica perspectiva sobre a cidade, pelas mãos do maior autor de todos os tempos.



“Kiki de Montparnasse” de Catel e Bocquet. A vida da talentosa companheira de Man Ray e musa de muitos dos grandes da louca Paris dos anos 20.


Enjoy.

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Come On In My Kitchen

Bem procurei a versão do Chris Thomas King de que falei no meu renovado perfil. Encontrei uma bem mais antiga – o original de Robert Johnson (um génio!), cantado em 1936, no Texas.
Este blues, sublime, junta a dor da perda e a dor do reencontro. Ela foi-se embora com o melhor amigo e não voltará jamais. Mas depois, a tanta angústia, junta-se a muito maior aflição da recolha da “woman in trouble” que o inverno abandonou à porta de casa.
Quem será? A que “babe” é que Johnson diz, plangente, “you better come on in my kitchen, it's goin' to be rainin' outdoors”? Blues de infidelidade ou de aceitação? Dor de corno ou amor redentor? Decidam.


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sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Nem a avó morre...




«The curious case of Benjamin Button» é um dos filmes mais aborrecidos e previsíveis («nem a avó morre, nem o Benjamin nasce») que tenho visto ultimamente. Um verdadeiro hino aos lugares comuns de que só se «safa» o trabalho de caracterização. Seguramente não é por acaso que o argumentista desta adaptação do conto de F. Scott Fitzegrald (Eric Roth) é o mesmo que em tempos assinou o patético argumento de «Forrest Gump», outro filme pelo qual nutro uma especialíssima implicação.

Em suma: uma verdadeira banalidade a evitar a todo o custo.

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António Aleixo (I)

Muito se tem querido falar, a propósito da actual crise, de um hipotético regresso das doutrinas de Karl Marx. Numa visão mais patriótica (e talvez igualmente eficaz !? ) aqui proponho, em alternativa, o regresso de António Aleixo. E justamente em relação à crise, que os nossos economistas teimam em não saber explicar, começo aqui por lembrar o que ele há muito dizia:

«A ninguém faltava o pão,
Se este dever se cumprisse:
- Ganharmos em relação
Com o que se produzisse.»

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quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Uma Torre


Aos domingos visitamos museus e edifícios históricos, palácios e castelos.
Neste domingo calhou ser a Torre de Belém.

A Torre de Belém não é grande,é pequena.
No primeiro andar temos uma sala, uma sala pequena. Terá, se tanto, setenta metros quadrados,chama-se a sala do Governador. É a divisão mais importante da Torre. Tem janelas a nascente,a norte e a poente.

Do lado nascente tem uma placa que diz (eu copiei):" Os Governadores da Torre de Belém"
Continua: " O cargo de Governador da Torre de Belém foi desde sempre de prestígio e de distinção real. Para residência de sucessivos Governadores da Torre de Belém foi construído nas suas imediações um palácio."
Elenca de seguida os Governadores,suas valias e contributos, condes, nomes muito compridos, gente ilustre.

Deixem-me ver se percebo:

Primeiro entendeu-se que a Torre de Belém era muito importante;
Depois nomea-se um Governador;
O Governador tem de morar nalgum sítio;
Constrói-se um palácio;
Cobram-se impostos para financiar o palácio.

Isto tem quinhentos anos, ninguém nos pode acusar de falta de coerência.

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quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Democracia e a Realidade

A democracia tornou-se, nos demagógicos tempos que vivemos, numa espécie de fim de linha a que nos vamos habituando e a que temos de nos habituar porque, depois dela não há, diz-se, outra realidade social, não há outro regime, nem outra esperança. É bom, por isso, que nos habituemos. Ela é, toda, a presunção do último encontro, do último estado, o fim do progresso. O que é agora, é o que será.

E o que é hoje? Um regime da inclusão de que ninguém tem o direito de se excluir. O braço que pretende estender-se e abraçar ou aprisionar o mais distante e perdido ser, a quem aconteça existir hoje e no futuro. É o regime que quer que todos estejam representados e de que ninguém se deve escapar porque até o seu escape pretende estar previsto na sua magnânime elasticidade. A democracia é para todos estarem representados porque a democracia é essa representação de toda a suposta diferença.
Nesse acordo (ou será coro?) social que pretende ser a democracia actual, porém, o que de cada um está representado não é a sua individualidade, a sua diferença ou a sua singularidade, mas, e só, a aceitação do acordo. Esse é o seu limite. Não importa o que cada um é. Importa que se inclua não com o que é mas com o incluir-se em si. E, caso não queira aceitar esse acordo social de inclusão, então sim, está fora, está excluído, porque não participa da grande unanimidade em que tem a possibilidade de se incluir mas que preferiu não aceitar. Aí é, impiedosamente, excluído, auto-excluído. Não que não tivesse oportunidade de se incluir, mas porque não quis.
O que fica, então, desta democracia é uma espécie de ficção em que cada um reconhece os outros pelo filtro de um acordo e que se fica, toda, no filtro desse acordo e não no que cada um é realmente. Tal resulta numa forma de demissão da individualidade, num silêncio temeroso de qualquer afirmação de uma intimidade, de uma singularidade e de tudo o que possa por em causa o que é toda a realidade: o acordo social que se presume ser suficiente representação de todos e a que todos e cada um se deve submeter em nome da expectativa de todos os outros.
Esta democracia tomará, por fim, conta da própria realidade, e entende por realidade o sistema da manifestação do acordo social. Fora disso, qualquer manifestação põe em risco as expectativas dos outros, lança um princípio de desacordo e não pode, por isso, ser tolerado. Reduzidos à manifestação da sua aderência ao acordo social, os indivíduos vão-se esvaziando a si próprios de uma existência íntima, perigosa porque os pode conduzir à rebeldia, indesejável porque os conduz à impiedosa auto-exclusão e ineficaz porque lhes fecha as portas da comunicação e de toda a relação. Exaurido o homem não peca, não erra, nem prepara conflitos. É um ser genérico gerido por um Estado ex-machina, zeloso, omnipresente e intrusivo, que se vai fazendo representar por todos aqueles que atinjam o estado ritual da fiscalização dos outros, quer sejam estudantes, professores, funcionários ou polícias, quer sejam artistas, cientistas ou presidentes de institutos, quer sejam jornalistas, médicos, advogados ou governantes, quer sejam tarefeiros, viajantes ou porteiros.
A arrogância dos actuais pregadores da democracia degradada em demagogia, a sua presunção de superioridade moral e a sua acção moralista e moralizadora, conduz a um processo de instauração de sentimento de culpa, a uma nova cegueira e a uma nova forma de totalitarismo: aquele em que se supõe que o mundo está descoberto, revelado e que é um estado definitivo. É um mundo onde o perdão se obtém com a humilhação pública, dissimulada mas suficiente para o espectáculo da superficialidade, que se tornou bastante para nele existir, mesmo sem alma.
Quando se escreve, como frequentemente lemos, que o mundo está perigoso, será que é disto que se fala?, do medo de pensar que se torna aos poucos na ausência de pensamento? É uma recusa da complexidade, uma recusa da teoria, uma recusa de criar a diferença como se todos estivéssemos chegado a um ponto em que, pensar, divergir e opor-se, fosse uma forma de subversão intolerável. Não está ainda escrita a nova ortodoxia, mas vai-se fundamentando e fortalecendo através do politicamente correcto, do humor oficial, do enfado dos comentadores ao que não é maioritário nem triunfante, dos alinhamentos das televisões que pesam da mesma forma política, cultura, desporto e entretenimento, na evidência com que se proclamam lugares comuns como se fossem pensamento próprio, pela força ignara das multidões que se agregam por causas que julgam defender e compreender. Através de tudo isso, o indivíduo é acossado, marginalizado e avisado. E a realidade tornada numa ficção no vazio.

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O conformismo ou o mundo como ele está

Detemo-nos frequentemente com pensamentos negativos. Detemo-nos na construção de paradoxos que nos conduzam a becos sem saída. Vivemos no esgotamento de um modelo de sociedade que ainda luta denodadamente por persistir. As duas posições (a que visiona o seu e esgotamento e a que o tenta sustentar) conduzem a uma luta destrutiva e, se bem virmos, os combates actuais são baseados em presunções de intenções, denúncias e calúnias e não em diálogos ou em confronto efectivo de ideias.

O espectáculo da política é isto. Só se propõe o que é inócuo e vazio, o que está dentro dos limites aceites pela crítica ou as violências que estão dentro dos limites suportáveis pelas pessoas, as quais, se foram tornando imunes e indiferentes a essas agressões. O liberalismo social, que uns defendem, conduz a que uma desagregação da sociedade e das suas estruturas, resulte no voluntarismo, no isolamento e na violência. Consiste na atomização do homem movido apenas pela sua vontade e não por valores em que lhe seja permitido compreender a sua situação de indivíduo, por um lado, e de ser de convívio por outro. A vontade como primado de toda a acção é esse mesmo isolamento. Por outro lado, o homem isolado, enfraquecido, torna-se um ser acossado, egoísta, desconfiado, incapaz de reconhecer o outro e de se reconhecer a si mesmo através dos outros. Nesse estado é reduzido a uma existência numérica, pura quantidade, igualitarizada e insignificante na vida económica onde a ausência de uma possibilidade de construção de qualquer empreendimento o torna um simples escravo dependente do Estado.
Falo do homem comum que é aquele que, ligado a uma tradição e às elites com que se identifica, torna fortes e livres as sociedades. Não falo das oligarquias, nem das tiranias que se edificam no mancomuno entre o poder político e o poder económico. O poder económico casado com o poder político são o oxigénio de que, oligarquias e tiranias, se alimentam, como também as democracias degradadas em demagogias. A nobreza do Povo está na identidade do homem comum com uma consciência pátria. Mas a nobreza de um Povo também está na sua capacidade de subjugar os tiranos, os oligarcas e os demagogos, em nome da liberdade de ser o que são e recusarem ser o que se lhes quer impor que sejam.
Importa ter coragem de afirmar hoje de que é que depende construirmos os caminhos da liberdade, humanamente concebível como libertação. A nossa primeira proposta é afirmar que o mundo não é uma realidade predeterminada e, por isso, o saber que conduz à consciência individual não é definido por decreto ou por imposição de qualquer doutrina filosófica, artística ou científica. A segunda afirmação é a de que cabe à família o papel principal na educação dos mais novos escolhendo os valores em que os deve iniciar, o lugar e a forma de os instruir e ensinar para os preparar para a vida adulta. A terceira afirmação é a de que cabe ao Estado garantir a liberdade dos indivíduos na sociedade onde estes convivem e conflituam.
Um dos erros da contemporaneidade é a presunção de que, depois de tudo o que já houve, não há nada de novo por que lutar. É uma idade do conformismo activo. É a época em que uns, a maioria, pergunta aos outros, em minoria: aonde existe esse outro modelo de política ou de regime de que esses outros falam, e ficam satisfeitos por não haver. Perante o unanimismo conveniente de quase todos os Estados actuais, os que estão em minoria são refutados não pelo pensamento mas pela chamada realidade pragmática. O argumento mais estúpido a que os mais estúpidos podem recorrer, como quem diz: isso que estão a defender não existe. Eis a resposta do conformismo. Mesmo quando se trata de um conformismo travestido de vanguardismo. Seria ele o triunfo da sociologia (falsa ciência) sobre o pensamento. Mas não é porque o pensamento é sempre pensamento de um ideal e os conformistas só acreditam em falsos idealismos, ou seja, em idealismos que são desejos que partem de um sentimento derrotado de inferioridade pessoal, social ou cultural. Querem apenas inverter a sua posição no mundo como ele está. Não têm um ideal comum que transcenda os seus interesses imediatos. Raciocinam como quem quer justificar um roubo: o roubo da realidade ao seu destino ideal. O fim da evolução, pela presunção de se ter atingido um estado perfeito, é a nova alienação, o novo totalitarismo. O que tem de grave é que apenas pretende perpetuar uma forma de poder que esvazia os indivíduos e os escraviza não física, mas mentalmente. Leva a um grave esclavagismo que é o que destrói a humanidade do homem. Não conduz à revolta mas à passividade, à indiferença: ao conformismo. O mundo como ele está, é a vitória do conformismo. E é nisso que ficaremos, se nos deixarmos impassíveis e de cócoras perante o espectáculo degradante da demagogia política.

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Da Visão: É a política, Estúpido!




A crise financeira foi o que se viu. Sobre a seriedade e a profundidade da crise económica já ninguém tem dúvidas. Como de resto ninguém duvida que seremos forçados a mudar, estruturalmente, de hábitos e de estilo de vida. Quando muito o Mundo já só se divide (e mesmo assim, cada vez menos) para discutir quanto tempo durará a depressão. Ora, se a História serve para alguma coisa, diria que é, paradoxalmente, chegada a altura de pensar na política.
Os próximos meses serão seguramente de instabilidade no sector e nos mercados financeiros. Os próximos anos serão provavelmente de um duro reajustamento a um novo paradigma económico sem algumas das facilidades e dos excessos do passado. E na economia, os tempos de reajustamento e de mudança de paradigma são necessariamente tempos árduos e plenos de angústias e incertezas. E disso, por mais que nos custe a admitir, já ninguém nos livra. E é precisamente por isso que é necessário começar a tratar, já, da política. Porque será política a próxima crise. Porque está criado um caldo explosivo para fazer da política o cenário do próximo terramoto. E não falo apenas «da rua» e do aumento do descontentamento dos contribuintes, do desespero dos desempregados, da angústia dos que não conseguem projectar o amanhã. Falo de uma crise da própria Democracia e dos valores Liberais (digo bem: Liberais) que a sustentam.
Durante as últimas décadas, em Portugal seguramente, mas também em boa parte do Mundo ocidental, fomos cuidando pouco da Democracia. Habituámo-nos a dá-la por adquirida, dispensámo-nos de a fortalecer e de a cultivar quotidianamente, deixámos de nela participar, entregamo-la às máquinas partidárias e fomos «à nossa vidinha». Esquecemo-nos da importância dos velhinhos «checks and balances» e fomos olhando, sem qualquer sentido de urgência, para a lenta degradação da Justiça sem a qual não há Democracia que sobreviva. Em regra, pouco mais fizemos pelos valores que, desde sempre, formaram os pilares dessa mesma Democracia. Dir-se-ia que a Liberdade estava para sempre conquistada, que a tolerância era um «acquis» civilizacional sem retrocesso possível, que o respeito pelo indivíduo – que sempre fora umas das marcas maiores do nosso legado liberal - era um «fait accomplit».
Pois bem, é tempo de olhar para a História e de perceber que não é assim. A degradação da política, a desvalorização da Liberdade e as crises económicas formam um cocktail explosivo. Precisamos, mais do que nunca, de cuidar dos valores liberais que são, há mais de duzentos anos, o sustentáculo da democracia e da civilização ocidental. Precisamos de dar substância à nossa vivência democrática, de defender, sem quaisquer concessões, a Liberdade (política, de religião, de opinião, mas também económica). Precisamos de cultivar a tolerância e o respeito pelo indivíduo sem temores nem hesitações. Precisamos de estar vigilantes e de nos defender dos demagogos que sempre fizeram deste caldo de descontentamento o seu «habitat» natural.
Precisamos, insisto, de começar rapidamente a cuidar da política.

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terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Kirill da Rússia



Não é num pontificado que se mudam séculos de História. Mas havendo um novo patriarca habituado ao diálogo, sobretudo com o catolicismo, será interessante ver o que se passa por esta via. Parece ser mais um passo para ultrapassarmos a divisão pirosa entre Leste e Ocidente europeus, que só traz prejuízo para a Europa.

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Sócrates e Salazar (II)

Há uns dias, num comentário a um post da Sofia Rocha neste mesmo blog, falei do clima de autoritarismo e de medo que hoje nos é imposto a partir da esfera do poder. Fi-lo a partir das inacreditáveis e inaceitáveis palavras do ministro Augusto Santos Silva numa reunião do Partido Socialista (na qual este disse que aquilo de que gostava mesmo era de malhar nas pessoas da direita, sendo que o fazia com um especial prazer sempre que essas pessoas, sendo de direita, fingiam ser de esquerda) e das críticas que lhe foram – ou tentaram ser – feitas por um grupo de militantes desse Partido, encabeçado pelo histórico Edmundo Pedro, que pretendia discutir a vida interna do PS e o clima de medo que hoje se vive na Administração Pública.
Acabei classificando estas atitudes dos principais membros do nosso actual Governo como próprias de um regime como foi o de Salazar, sendo que este último tinha ao menos o bom senso de não se vangloriar delas em público. Esta comparação, porém, mereceu os reparos prontos e entusiastas de um nosso visitante, que apenas por via da minha ignorância e/ou má-fé a conseguia perceber.
Dado o excessivo vigor da argumentação, resolvi nada mais dizer. Permito-me agora, no entanto, sugerir muito veementemente a leitura do artigo ontem publicado no Jornal de Notícias, por Mário Crespo, no qual se compara o actual regime que nos é imposto por estes senhores do PS (pois que não confundo as duas coisas), não com o regime de Salazar, é certo, mas com os regimes de Chavez, de Mugabe, de Castro, de Eduardo dos Santos e de Kabila. E o ponto, meus senhores, é este: podem sempre continuar a dizer que somos ignorantes, mal intencionados, ou loucos, mas uma coisa é certa: vamos sendo cada vez mais!

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2.000 Euros por cabeça

O Governo fez publicar um anúncio de página inteira de medidas para combater o desemprego no jornal Público.

Já escrevi aqui que em Portugal não se cruzam o direito da segurança social, parente pobre, com o direito do trabalho, parente nobre.

As reformas do direito do trabalho dão brado e afugentam o eleitorado. De modo que, em vez de atacar os problemas de frente, contornam-nos, fazendo uns pequenos enxertos no direito da segurança social.Estes não são contestados e rendem votos.

Em vez de assumir que temos de encarar, neste momento difícil da economia, que talvez fosse de equacionar uma excepção legal ou moratória quanto às formas de contratar,são-nos propostas medidas como oferecer 2.000 euros por cabeça! ( para contratar sem termo jovens ou desempregados.)

Não gosto de ser arauto da desgraça, mas não há neste momento em Portugal quem esteja interessado em contratar um trabalhador sem termo, vulgo efectivo.
Se o fizer, fá-lo-á apenas por dinheiro, por estes dois mil euros. Significa que à primeira oportunidade, extingue o posto de trabalho ou faz um despedimento colectivo e não há em Portugal meios de inspecção suficientes para detectar a fraude, muito menos para a sancionar!

Em ano de eleições e com a crise a bater à porta,o Governo paga para não ouvir desempregados, trabalhadores, patrões e sindicatos - que era quem ouviria se ousasse introduzir alterações na lei laboral para vigorar em 2009 e 2010.

Não são 2.000 Euros por cabeça que resolvem, ajudam ou sequer minoram o problema do desemprego em Portugal. É uma medida eleitoralista e irresponsável.

Daqui só posso concluir que quem pensa e decreta estas medidas:

- Nunca trabalhou numa empresa privada;
- Nunca foi trabalhador por conta de outrem;
- Nunca esteve desempregado;
- Nunca foi empresário;
- Nunca teve de contratar trabalhadores;
- Nunca teve de cessar vínculos laborais.

Quem já oferece 2.000 euros por cabeça, já só pode estar de cabeça perdida.

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segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Jogo de Azar?


Aparentemente, na semana passada duas pessoas ganharam (ou julgavam ter ganho) dois prémios de quatro milhões de euros nas slot machines do casino de Lisboa. Esta semana os jornais anunciaram que, de acordo com o casino e a Inspecção de Jogos, tudo não passou de uma falha técnica no sistema central de computadores sendo o "prémio verdadeiro" de apenas 20 euros… A justificação avançada é que os prémios que sairam eram imprevisíveis...
Mas afinal se a máquina avariou isso não é "apenas" um azar do casino? E o imprevisto não é o essencial de um jogo de azar? Ou será que afinal os casinos sabem sempre o risco que correm? Se sim, onde é que vão parar a sorte e o azar?

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