sexta-feira, 6 de julho de 2018

Pobreza da literatura III






Vejamos agora os temas. Parece que se alargam, fala-se do Terceiro Mundo, a geografia alastrou. Épocas recônditas parece surgirem da literatura. A que imensa glória assistimos….

Não me parece. Havendo hoje o conhecimento que existe da História e da Pré-História, poder-se-ia esperar que isto inspirasse os escritores. Mas nada surge sobre a Pré-História, nomeadamente a europeia, os indo-europeus não inspiram ninguém, o romance histórico quase despareceu. Salvo na perspectiva do curioso, do turista. A aristocracia, quando aparece, é sempre na perspectiva do «eles». «Eles eram assim», «naquela época eram assim». O ser humano do passado é visto como paisagem.

E mesmo a suposta expansão geográfica é apenas aparente. As outras culturas são vistas sempre de uma forma turística. Em suma, o escritor actual confunde a aventura com a sueca que comeu quando fazia o Interrail ou o Erasmus. Tudo previamente organizado, o risco contido, sempre com possibilidade de socorro, apoio on line ou transporte alternativo, ou socorro institucional que acode nas maiores aflições.

Também desapareceram a politica, o mundo da finança, a guerra. É verdade aprecem em romances delicodoces que dão a impressão de vivermos num mundo que sabe desvelar os seus arcanos. Mas a verdade é que nos podemos perguntar: quantos escritores conhecem os produtos financeiros? Quanto conhecem os mecanismos do poder?

A novela, a novelita que se faz, quando traduz alguma verdade existencial, reduz-se assim à autobiografia, e no pior dos casos, à autobiografia corporativa. O livro sobre o escritor em crise de criatividade, o livro sobre o escritor na crise da meia idade, o livro em que o escritor vê os filhos crescer, e se sente velho, o livro em que o escritor fala do escritor…

O mundo do escritor reduz-se cada vez mais a si mesmo. E se ainda fosse um mundo fascinante… Mas o escritor reflecte o seu mundo pequeno burguês, que não vem da grandeza e não vai para lugar nenhum. O seu impasse, que é mero fracasso, é anunciado em público e celebram-no por isso. É a sua mediocridade que é publicitada e glorificada… até ser esquecida.


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