sexta-feira, 6 de julho de 2012

Frei Tomás Soares



Mário Soares diz o que lhe apetece. A Democracia permite-o, a idade favorece a mesma liberdade mas o decoro não o recomenda. No início de Maio passado, o ex-Presidente dizia: «poderá ser a própria ‘troika’ que vai ao ar». Esta semana, na RTP, afirmou que «o Governo funciona como se Portugal fosse um Protectorado» e vaticinou: «Qualquer dia os ministros não podem sair à rua», «A População não é tão paciente como se julga», arrematando: «Vamos ver o que vai acontecer!».

O Homem para quem não podia haver ruas proibidas, em 1985, em plena campanha das Presidenciais. O mesmo que, por isso, atravessou a Marinha Grande, contrariando quem lhe dizia que «não podia ir por ali» porque «a população não é tão paciente como se julga». O político que sabe que a ameaça não dobra o carácter de quem serve o País, em Liberdade, ainda hoje refere este episódio como sinal da sua imunidade às afrontas públicas de violência. (deve ao incidente a subida de intenções de voto de 8% até à vitória na segunda volta). Este homem é o último a poder dizer qualquer coisa que possa incitar o Povo a fazer o mesmo.

Mais: a violência na Marinha Grande deveu-se, sobretudo, à memória fresca que o Povo tinha do Governo do Bloco Central (1983-85) que cumprira com rigor e determinação, todas as exigências impostas pelo FMI, então por cá em socorro das contas portuguesas. Nessa altura, a obediência cega e castigadora do Primeiro-ministro Mário Soares não «tornou Portugal num Protectorado» mas sim num Estado que honra compromissos internacionais e que consegue reerguer-se quando cai.

Nessa altura, o Povo português soube atender às palavras do corajoso Ministro das Finanças do mesmo Soares: «Está em causa, muito cruamente, a própria capacidade de assegurar, em termos de financiamento externo, o funcionamento corrente da actividade económica. E quando um problema se coloca com esta clareza, deixa de haver margem para recorrer a malabarismos contabilísticos com o intuito de disfarçar quanto custa, a cada um de nós, a chamada crise portuguesa»*.

Soares foi salvo pela competência de Ernâni Lopes, pela resistência do Povo, pela possibilidade de desvalorizar a moeda provocando mais inflacção e pelos Fundos Europeus subsequentes que viriam a curar mais depressa as feridas inflectidas pelo Centrão político.

A par da liberdade de verbo, precisávamos da sua experiência de quando conduziu o País no aperto imposto pelo FMI. Um sacrifício para o qual não encontrou brechas na sociedade portuguesa e que, como nos lembramos, provocou fome em Setúbal, como então denunciou o bispo D. Manuel Martins.

Apesar de Soares nada ter a perder e de a opinião ser livre em Portugal, as palavras do fundador do PS, construtor da democracia portuguesa e ex-Chefe de Estado podem desencadear um efeito adverso ao esforço comum que hoje nos é pedido. E são desmerecedoras da coerência a que parecia ter-nos habituado.

*Diário da AR, 26 de Outubro de 1983

(escrevi este texto há quatro dias e deixei-o arrefecer. Mas permanece actual)




5 comentários:

miguel vaz serra....... disse...

Querida Inez
Concordo com tudo principalmente a parte em que diz que o Ministro da época, Ernâni Lopes, salvou o momento.
Muita coisa mudou.
Agora o Ministro Gaspar está LONGE de salvar nada muito pelo contrário e o povo é outro.
Tem mais curriculum, é portanto mais "Licenciado"...Pois é...
E Mário Soares TEM razão.
O PM está a passar das marcas e vai pagar caro esse cegueira lamentável.
Como eu disse em relação ao defunto Governo da ditadura Sócrates, repito agora:
Este Governo já caiu só não se ouviu ainda o estrondo!!!

Inez Dentinho disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Inez Dentinho disse...

É na dificuldade que se forja o caracter. Diz o Povo. Digo eu. Soares não é fixe. É demagogo, desde que nada mais quer - ou pode querer - da política. Marca a agenda política com a irresponsabilidade de quem nada tem a perder e de quem reinventou a história ds últimos 38 anos para conquistar o lugar do único herói da democracia. O que seria de nós sem Salgueiro Maia, Jaime Neves, José Manuel Casqueiro, o bispo de Aveiro, Eanes, Sá Carneiro, Freitas, os cercados do Patriarcado, do Palácio de Cristal e da Constituinte?
Cansam-me os pertensos Lancelot do Campo Grande com as suas cartas de amor, e outras intimidades indigestas, fazendo-nos crer que o amor pode ser puro e público ao mesmo tempo.
Todas estas considerações alargadas não desautorizam as razões do post. Válidas para quem amargou, reuniu louros de ter amargadp e não ajuda a nova geração a atravessar uma nova fase de amargura.
Inez Dentinho

miguel vaz serra....... disse...

Querida Inez
É verdade..... Subscrevo tudo, mas quando digo que ele tem razão é em relação a este Governo perdido entre os interesses partidários, dos "amiguismos", do tudo vale para engordar mais os porcos e emagrecer ainda mais os famintos.
Deixo-lhe aqui um link dum video que não podemos, portugueses,perder.
http://videos.sapo.pt/kzZH4Ua8qCjuDPNQkL9a

Táxi Pluvioso disse...

Este deveria estar na cadeia pelo dano que causou ao país, ao pôr os seus amigos da Internacional Socialista à frente dos interesses nacionais. Mas enfim, foi um bom político, tinha noção que era um incapaz, uma nódoa sem capacidade alguma para governar, o que faz dele um bom político foi ter essa consciência e não ter fugido como Guterres e Durão, chamou o FMI para endireitar as contas (se Guterres o tivesse feito não estaríamos nesta situação).