segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

À volta de Herman Van Rompuy

É curiosa a reacção dos meios de comunicação social à escolha de Herman Van Rompuy para presidente do Conselho europeu.

Os comentadores passam o tempo a criticar a política espectáculo, a ausência de substância dos políticos, o excesso de marketing na política. Eis que lhes é dado de bandeja o oposto. E eis que se queixam da ausência das mesmas características.

Afinal vem ao de cima o que o comentador político e os meios de comunicação social precisam: de espectáculo. Apenas sabem apreciar a cena teatral, queixam-se da falta de texto, mas quando ele aparece afirmam que é maçudo, pouco atraente, cinzento. Especialistas de pirotecnia sem foguetes, não sabem apreciar política.

No que me respeita apenas me posso lembrar que Jean Monnet só foi conhecido a partir dos anos 80, quando foi cerca de 30 anos antes que fez o que de mais relevante tinha a fazer. Churchill era considerado um doido antes de ser primeiro-ministro. De Gaulle um arrogante. Joåo XIII um papa de transição, João Paulo II um exótico. Augusto um fedelho irrelevante.

Não, a imprensa queria uma estrela já conhecida, com currículo no estrelato. Mais uma sua característica sua que vem ao de cima: a imprensa é conservadora, prefere apostar em valores seguros, em bilheteira garantida. O senhor ainda não fez nada e já se lamenta ter o dever de ser um fracasso. O político tem de ser sexy. A cada um o seu gosto. A sensualidade é mais gozosa procurada alhures, parece-me.

As alternativas são mais apelativas, mas algo discutíveis. Mais visíveis e em grande medida apenas por serem menos substantivas. Blair o campeão do marketing, que descobriu que era possível conciliar economia de mercado com o socialismo, segundo dizem. Pena que tenha feito essa descoberta quase duzentos anos depois dos saint-simonistas, e mais de cem anos depois das sociais-democracias do Norte da Europa. Ideias velhas em roupagem sempre nova, a imprensa gosta disso.

E no entanto, quando começa um novo órgão, um novo posto, a tarefa de consolidação é a mais importante. E essa é feita discretamente. César foi imenso mas seria mais um episódio juntamente com Pompeu, Cipião ou Sylla. Foi preciso o trabalho (inicialmente) discreto de Augusto para que a ditadura se tornasse império. A ditadura são pessoas, o império uma instituição.

Ignoro o que sejam os resultados de Herman Van Rompuy. O futuro o dirá. Sei que o facto de ser um intelectual incomoda os senhores comentadores porque frequentemente não gostam de quem tem mais cultura que eles. Mas tenho mais confiança num discreto organizador e consolidador cujos resultados se verão em anos que em espectáculo de pirotecnia que deslumbra o transeunte e deixa no seu rasto apenas custos, um olhar cansado e um cheiro de pólvora queimada.


http://www.reuters.com/article/idUSLI45257420091119

3 comentários:

joão wemans disse...

Bem visto!

Táxi Pluvioso disse...

Mas podiam ter escolhido (dado o tacho) a gajos/as mais bonitos.

De facto não importa pois a Europa morreu.

UM BOM NATAL A TODOS

commonsense disse...

Jornalista é alguém que ganha a vida a explicar aos outros aquilo que ele próprio não compreendeu.