segunda-feira, 28 de julho de 2008

Diplomacia Comercial


Um dos mais escandalosos sinais da ineficácia de Portugal hoje, é o desperdício de energia vital, seja intelectual, seja laboral. Sabemos que temos uma dimensão pequena (população e Km2 de território) e que estamos “encurralados” entre a Espanha e o Oceano infinito. Sabemos, também, que não temos petróleo nem outras matérias-primas valiosas. Sabemos que não temos indústrias poderosas e que a agricultura foi sendo inviabilizada pelas cotas europeias (ou francesas). E sabendo isto o que fazemos?

Um país não cresce se apenas produzir internamente para o mercado interno. A não ser que seja muito rico e auto-suficiente para, sem recurso à importação, satisfazer todas as suas necessidades. Não sendo, como mesmo os mais ricos não são, tem de estabelecer um equilíbrio entre as importações e as exportações. Ou seja, se importa e paga o que importa, também tem de exportar para ter dinheiro para comprar. Ora, sendo um país pequeno em população é um país pequeno em mercado interno e as suas actividades, se apenas se dirigirem ao mercado interno, não ganharão dimensão que lhes permita combater ou acompanhar a concorrência dos países estrangeiros que desenvolvam a mesma actividade e vejam no mercado português um destino para expansão do seu mercado-alvo. Pensar na concorrência obriga a ganhar dimensão e para ganhar dimensão é necessário ter os olhos postos não no mercado português mas no mercado mundial. Para concorrer no mercado mundial é preciso ter vantagens competitivas que, primeiro, justifiquem os custos da distância e que, segundo, justifiquem a opção pelos nossos produtos ou serviços. Estas duas vantagens têm de ser criadas, tem de ser pensadas, construídas e depois aplicadas.
Não vamos insistir no que é mais evidente para dar o primeiro grande passo no sentido do mercado internacional e que é obviamente o nível de educação dos portugueses. A educação, que não é só a literacia com que tantos hoje se contentam, deveria desenvolver as qualidades humanas que dão superioridade aos povos: disciplina, conhecimentos (sensibilidade e inteligência) e coragem.
Entretanto, teremos de começar a andar como sabemos, e a necessidade é a principal causa do desenvolvimento de qualidades que no remanso da pacatez conformada e abúlica estão adormecidas. E começar a andar, aqui, significa identificar as actividades que nos podem diferenciar e identificar os mercados a que elas se podem dirigir. Não penso que deva ser o Estado identificar essas actividades nem esses mercados. Essa tarefa cabe aos empresários ou aos empreendedores. Mas penso que o Estado tem uma obrigação fundamental pela capacidade que um Estado tem no diálogo com outros Estados. Ou seja, o Estado não tem de dizer aos empresários ou aos empreendedores o que fazer, mas tem o dever e o alto interesse de proteger ao mais alto nível os seus cidadãos estejam eles onde estiverem.

Era à diplomacia portuguesa que queria chegar. Das diversas funções e justificações para a actividade diplomática, uma deveria ter um forte investimento e uma forte fiscalização: identificação de oportunidades e preparação de terreno para o investimento português, protecção ao mais alto nível dos interesses dos portugueses, empresas ou empresários, que se internacionalizam e captação de investimento estrangeiro para Portugal. A diplomacia comercial é um vector absolutamente fundamental para criar uma corrente de confiança e de apoio à sustentação de uma política económica baseada na força da iniciativa privada e na disponibilidade com que alguns arriscam as suas vidas e os seus negócios gerando, directa ou indirectamente, benefícios para todos. Porque sempre que alguém faz a mala e parte sem garantias e sem rede é, lá fora, um português. É um português que há-de voltar. E é menos um português que aqui fica a lamber feridas enquanto o país precisa de se regenerar e de se arriscar. É um português que vai gerar oportunidades, que vai gerar emprego, que vai representar Portugal, que vai trazer capital, que vai trazer investimento, que vai ser um exemplo para outros e, por isso, demonstra-lhes que é possível.

As Embaixadas têm de estar onde se conseguir um equilíbrio entre o fluxo de portugueses e dos seus interesses e os custos dessa localização. Mas se houver um investimento em que o governo central exija resultados, então, toda a implantação de Embaixadas será dirigida para uma diplomacia comercial que envolve o Estado, mas que acima de tudo desenvolve uma actividade que dá frutos por ser dirigida e focada na identificação de oportunidades nos dois sentidos. Resulta da identificação de um mercado a que os empresários e os empreendedores estão despertos e, por isso, o Estado deve desenvolver iniciativas para se representar até ao ponto de, se não houver, abrir uma Embaixada.

Naturalmente, que essa actividade de diplomacia económica deverá ser acompanhada de uma diplomacia de representação com o desenvolvimento de encontros bilaterais, com fomento de relações geo-estratégicas, de protocolos de cooperação entre Estados, de programas especiais nas áreas da educação, do turismo, programas de geminação de cidades e com actividades de divulgação da cultura portuguesa, sobretudo, na perspectiva em que nos possamos diferenciar de anglo-saxónicos, alemães e holandeses, franceses, italianos e espanhóis.
Muitas das localizações têm já representação portuguesa. Mas essas nós perguntamos: o que têm feito para criar esta corrente comercial? Como justificam o investimento do Estado nas suas Embaixadas e o retorno que delas pode vir mas não vem? Se o Estado somos todos nós, então como é que o nosso dinheiro está a ser gasto se quando precisamos de o investir ele está a ser gasto sem qualquer vantagem para nós?

As embaixadas servem para representar mas também para potenciar, desenvolver e afirmar Portugal. Deve movê-las o estrito interesse nacional e o interesse nacional são os interesses dos portugueses actuais e vindouros. O interesse nacional é determinado por interesses políticos realizado em alianças, desenvolvimento das relações com os parceiros tradicionais, e pelo interesse económico determinado pelas conjunturas que propiciam o reforço ou a abertura de uma nova frente diplomática.
Acresce, no caso português, a relevância que podem ter as nossas características. A não hostilização da diferença, a adaptabilidade a novas condições, uma cultura de proximidade e de convívio bem contrária à tradição anglo-saxónica, são factores que podem diferenciar a presença portuguesa no mercado global e que, no fundo, é um património histórico que nos pertence. Mas ter uma rede é fundamental para ter um respaldo institucional, sobretudo, nos mercados onde as diferenças culturais, políticas e operacionais são muito grandes. É também na construção desse respaldo que a nossa competitividade pode aumentar.

Já que temos a despesa podíamos também ter algum proveito. Se as Embaixadas portuguesas fossem postos avançados, na Ásia, no Médio Oriente, na África, na América Latina e no leste europeu, naqueles lugares onde os nossos produtos e serviços podem ser vantajosos e competitivos, então, as portas do nosso pequeno mercado interno abrir-se-iam ao mundo e a nossa dimensão deixaria de ser um problema que nos atrasa e inibe de pensar na medida da nossa visão. A nossa dimensão será sempre a dimensão da nossa alma. O que queremos ver do outro lado do espelho?

1 comentários:

Anónimo disse...

João Luís,
Sempre que se fala deste assunto - Portugal -desperto normalmente de forma um pouco nervosa, porque o sinto muito; ainda mais quando se trata da nossa posição no Mundo.
Comparando com o que é hoje, vêm-me à memória recordações do que foi, ainda em minha vida de jovem filho de diplomata (até 1974), a importância da nossa terra por esse mundo fora, e o prestígio que tinha. Mau grado os ataques políticos generalizados -que demonstravam a nossa dimensão real- pude constatar que Portugal tinha muitos e bons admiradores, desses que viam a grandeza da nossa Alma ...
Com todos os defeitos que se lhe possam apontar, o Estado Novo transmitiu aos vindouros o
património territorial e espiritual constituido ao longo de séculos.
Não soubemos ou não quisemos aceitar a herança - estamos agora perante inecertezas bem maiores que as que nos afligiam à 30 e tal anos.
Julgo, como o João Luís, que "A nossa dimensão será sempre a dimensão da nossa alma. O que queremos ver do outro lado do espelho?". Penso,
com Esperança, que as sementes que fomos deixando por vários continentes hão-de, um dia, dar fruto.
João Wemans