quinta-feira, 20 de março de 2008

Da Visão: Os barões atrapalhados

Parece que as «elites» do PSD andam muito preocupadas com a deriva populista em curso no «seu» PSD. E têm boas razões para isso. O que está em causa é, de facto, uma tentativa desabrida de lhes «roubar» um partido que julgam ser seu por direito ou por disposição testamentária de Sá Carneiro. Ou, dito de outra forma, o que está em causa é uma estratégia para perpetuar, com o apoio das bases e graças a meia dúzia de truques grosseiros de secretaria, a liderança de Luís Filipe Menezes. Que de resto nem se preocupa em esconder ao que vem e iniciou, esta semana, a refundação simbólica do partido para grande escândalo de militantes que, ainda há pouco tempo, se entretinham a virar do avesso as «setinhas» do PSD.
Dito isto, é preciso dizer duas coisas. A primeira é que as «elites» que agora estrebucham são precisamente as grandes responsáveis pelo estado a que chegou o PSD. Quando, no Verão passado, o Dr. Marques Mendes iniciou a sua suicidária fuga para a frente, todas estas cabeças pensantes concluíram, em uníssono, que o seu momento ainda não tinha chegado. Estávamos praticamente a meio da legislatura, o Eng.º Sócrates ainda gozava da fama de supremo reformista e tudo o que estes putativos salvadores do PSD desejavam era que o Dr. Mendes aceitasse continuar a imolar-se, em lume brando, até que as circunstâncias aconselhassem a que algum deles saísse, triunfalmente, da confortável toca onde tinha procurado abrigo durante a invernia socialista. O Dr. Menezes, já se vê, trocou-lhes as voltas e ganhou um partido que estava obviamente «maduro» para lhe cair no colo. Os barões, ainda incapazes de entender como é que o céu lhes caiu tão brutalmente na cabeça, queixam-se agora do desbragado populismo do autarca de Gaia. Talvez um dia percebam que só podem legitimamente queixar-se do seu próprio tacticismo incorrigível.
A segunda coisa que interessa entender é que, com ou sem Menezes, o partido dificilmente voltará a ser controlado pelas «elites». Explico porquê: contrariamente às guerras do passado, a actual contenda no PSD não é uma disputa entre líderes desavindos. É uma verdadeira «luta de classes». Entre os auto-proclamados herdeiros do «verdadeiro» PSD (popular, é certo, mas prudentemente dirigido por elites) e as «bases» do partido que vêm em Menezes o instrumento da sua própria emancipação e afirmação política. Ora, à medida que se acentua esta clivagem classista entre «bases» e «barões», só um homem parece poder arbitrar esta guerra: Cavaco Silva. Porque é Presidente, porque soube colocar-se prudentemente acima da contenda, mas sobretudo porque, não fazendo parte das elites tradicionais do partido, é hoje o exemplo maior de uma liderança eficaz do partido e a grande referência de um PSD com efectiva vocação de poder. É portanto o único com legitimidade histórica e «inter-classista» para «impor» uma liderança saída dos círculos mais «elitistas» do PSD. E se não puder «nomear» directamente o próximo líder do partido tem, no mínimo, o poder de «vetar» qualquer candidato.
Para o bem e para o mal, o poder no PSD já não regressa, por culpa própria, aos barões do partido. E mora cada vez mais em Belém.

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