quarta-feira, 27 de junho de 2007

Consenso e Governação

E se o Primeiro Ministro deixasse cair o actual ministro das Obras Públicas e acolhesse no Governo um novo ministro, próximo do PSD e com elevadas credenciais junto dos empresários e gestores? – Isso nem seria extremamente original, pois seguiria o exemplo recente de Nicolas Sarkozy, que convidou ministros socialistas para o governo. Angela Merkel também lidera há algum tempo um governo de coligação, ao centro, com bons resultados na política europeia e que assiste à recuperação do crescimento económico do seu país. António Guterres (bem, este não é um grande exemplo) tomou uma posição semelhante quando no seu primeiro governo convidou Sousa Franco para as Finanças, o que se viria a revelar crucial para a bem sucedida adesão de Portugal à moeda única(1). Precisamente.

Como em outros países, as políticas públicas em Portugal podem ser divididas num grupo de políticas bem sucedidas e num outro de políticas problemáticas. O melhor exemplo das primeiras é dado pelas políticas associadas à integração europeia e, sobretudo, pelas políticas em torno do Euro. Para estas políticas, a avaliação global é obviamente positiva. E tem havido algum consenso, nestas áreas, que, aliás, se está outra vez a manifestar. Discute-se nestes dias mais recentes o tratado “simplificado” da União Europeia e a forma de o ratificar. Notam-se já passos no caminho de um consenso que eu apelidaria de responsável, com as declarações do Presidente da República, do Governo e, inclusivamente, segundo os jornais, da “ala barrosista” do PSD. (A integração europeia é um somatório de tratados negociados entre Estados e isso nem sempre é bem feito com ratificações por referendo.)

Mas esse consenso não existe em Portugal para muitas outras políticas públicas. Entre elas podemos dar os exemplos mais importantes das políticas relacionadas com o mercado do trabalho e com as obras públicas. O resultado da falta de consenso é que estas políticas ou estão fixadas na Constituição ou são muito voláteis. Quem pôde, nos idos anos 1970 e 1980, fixou os seus princípios sobre o mercado do trabalho na Constituição, para assegurar que eles se perpetuassem. Hoje, os governos estão um pouco de mãos atadas por essa constitucionalização de princípios (embora não totalmente). Quanto às obras públicas, acontece o contrário. Como não estão constitucionalizadas (felizmente) e como não há consenso, são muito voláteis. Cada leva de governantes altera facilmente as orientações dos grandes investimentos públicos. Por outro lado, os governos acabam por tendencialmente forçar esses grandes investimentos para manietar as opções dos governos futuros.

Portugal precisa de obras públicas e muitas e é fundamental que isso seja entendido pela grande maioria da população (como penso que já o é). Faltam instrumentos que permitam a criação de consensos entre os partidos do arco do Governo e da correspondente co-responsabilização. Um ministro das Obras Públicas com simpatias social-democratas seria uma solução.

Note-se que mais obras públicas não implicam necessariamente mais Estado. Margaret Thatcher, esse nosso ícone dos anos 1980, liderou a construção do túnel do Canal da Mancha apoiando-se em privados. Havia então na Grã-Bretanha duas condições fundamentais para isso. Foram elas, mercados financeiros desenvolvidos (que Portugal já tem, graças ao Euro) e agências de regulação (idem, ibidem).
Falta convencer, pelo menos aqueles que gostam de Economia e que ainda não estão convencidos, que Portugal precisa de obras públicas, lideradas por privados, mas isso já não cabe aqui.

(1) Em Portugal, temos outros casos de geração de consensos como nas importates revisões constitucionais de 1982 e 1989.

2 comentários:

Inez Dentinho disse...

Quando a afirmação política se exerce na base da diabolização do «rival» que ocupou o cargo anteriormente; quando o debate se joga nas considerações pessoais mais do que na qualidade das respostas de interesse nacional, torna-se estreito o caminho comum da solução mais eficaz para o País. Todos querem valer, um de cada vez. Vanitas!

Manuel S. Fonseca disse...

Para além de louvar o post do Pedro, que toca num ponto fulcral, o da necessidade de de contrariar rupturas constantes das grandes opções políticas, do que estamos a precisar, na Geração de 60, é que a Inez Dentinho transforme o ímplicito do seu comentário num post de todo o tamanho. Há ali muita "food for thought" que eu gostava de ver mais explicadinha.