segunda-feira, 14 de maio de 2007

I. Vangelo di un pagano. Testo greco a fronte, Porfirio, Bompiani, 2006

A uox populi diz que o modernismo fez enfraquecer o cristianismo, que hoje em dia somos muito mais esclarecidos, que nunca houve tanta descrença. Vários erros de perspectiva e de presunção, porque há demasiadas épocas da História para se poder fazer essa comparação de forma tão simplista. Mesmo Nietzsche o suposto anti-cristão por excelência está bem longe de o ser no sentido popular.

Se bem virmos no longo prazo, e tudo ponderado, houve dois grandes anti-cristãos. Porfírio e Maomé. Símaco, Juliano o Apóstata, Hipácia e tantos outros são brincadeiras de crianças ao pé destas personagens. Plotino não deu grande importância ao cristianismo, confundindo-o muitas vezes com a sua vertente gnóstica, pelo que não pode ser bom exemplo.

Sobram Porfírio e Maomé. Pode-se dizer que ambos eram grandes admiradores de Cristo. A tal ponto de o primeiro reconhecer que Cristo é abençoado pelos deuses e o segundo faz d'Ele quem recebe os homens no Juízo Final. A História tem demonstrado que essas admirações podem ser tanto mais perigosas quanto sinceras são. O facto de Cristo ser de sangue judeu não impediu a existência de anti-judaísmos na Europa. O anti-semitismo de Himmler não o impediu de ter grande admiração pelo Islão e pela Turquia. E turcos e persas odeiam os árabes e por eles são desprezados, sendo certo que isso não os impede de venerar mais que qualquer outro homem um árabe, Maomé.

Que Porfírio admirasse Cristo não evita que tenha sido o mais poderoso anti-cristão sob o ponto de vista intelectual. Em Plotino o cristianismo ainda não tinha importância bastante. Em Celso a crítica é coberta e enfraquecida pelo insulto, em Símaco, pela dignidade do vencido que se sabe vencido, e que apenas já só deseja preservar o que pode ser preservado. A aventura de Juliano foi romântica, mas de muito breves efeitos.

Porfírio é o único que concilia uma consciência da importância do cristianismo, um momento de viragem em que ainda seria possível travar a predominância cristã, um conhecimento a aprofundado das fontes bíblicas. Mas igualmente o que luta contra o cristianismo com armas que se lhe assemelham.

1 comentários:

João Luís Ferreira disse...

O confronto entre a modernidade e o cristianismo não é uma questão de época nem uma questão temperamental. É um confronto de finalidades do pensamento filosófico. Para o cristianismo o saber é o saber da verdade revelada por Cristo, para a modernidade o saber é o conhecimento da matéria (dito muitas vezes conhecimento da natureza) o qual permitirá reconstruir a realidade com o mesmo poder de um Deus, presumivelmente, inexistente. É o confronto entre a esperança e o pessimismo.