sexta-feira, 29 de maio de 2009

Abel e Caim

Pelo menos desde Abel e Caim, sabemos todos que não há guerras tão letais como as guerras fraticidas.

Ninguém escreverá nada sobre Dias Loureiro e o BPN como escrevem hoje Vasco Pulido Valente e Miguel Júdice no jornal Público de hoje.
Os restantes escribas podem baixar a pena.

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O descapotável

Nos tempos que se seguiram ao 25 de Abril de 1974, a febre revolucionária de esquerda estava ao rubro. Muitos portugueses, saídos de uma ditadura de direita, sonhavam com a patine de uma ditadura do proletariado. O ódio ao capital e aos capitalistas, se já existia, ganhou corpo nessa altura e perdurou até hoje.
Muitos filhos família ainda conservavam alguns sinais recentes de abastança, aventurando-se a sair de casa com o carro, cabelos ao vento. Os comentários variavam, mas não destoavam entre o “burguês” e o “reaccionário”. A resposta vinha então, na cartilha politicamente correcta de então: “- Ando a descapitalizar os meus pais”.
Portugal continua um país pobre, descapitalizado, que cultiva o ódio aos ricos, olha de lado quem cria riqueza, não encoraja os empreendedores, não celebra a iniciativa privada. Muitos olham o Estado como o providenciador natural, alguns até esperam que o Estado lhes faça a riqueza.
Portugal tem hoje 2 milhões de pobres e ainda não percebeu que estaria bem melhor se tivesse 2 milhões de ricos. A riqueza não deve ser motivo de vergonha para um país, só a pobreza o é.
35 anos depois, discute-se a possibilidade de criminalizar o enriquecimento ilícito. Admito que seja um caminho possível para combate ao flagelo da corrupção, mas fico com a impressão de que se trata apenas da criminalização do enriquecimento.
O ilícito aqui vai só à boleia.

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quinta-feira, 28 de maio de 2009

Este desporto não é para o Ronaldo?


Ronaldo perdeu por causa do Manchester ou o Manchester perdeu por causa de Ronaldo? Hoje ouvia-se, sobretudo, que foi a equipa do Manchester que não esteve à altura de Ronaldo. Ao contrário do Barcelona que teve uma equipa, o Manchester pareceu depender totalmente de Ronaldo. Mas fica no ar a dúvida se isso se deveu à ausência de alternativas ou ao domínio que Ronaldo exerce nas equipas que joga. Ronaldo foi de longe o melhor jogador do Manchester. Mas até que ponto a sua presença numa equipa não transforma o futebol: o jogo deixa de ser colectivo para passar a ser o jogo do Ronaldo. Há uma diferença entre o Manchester não ser muito mais que o Ronaldo e o Manchester sumir-se perante Ronaldo.
Esta impressão é provavelmente injusta para o Manchester e o Ronaldo: muitas vezes o Manchester juntou o colectivo à diferença do Ronaldo mas quando ontem o colectivo sentiu dificuldades desistiu de o ser e investiu tudo no Ronaldo. Só que esta impressão (ainda mais presente na selecção) começa a fazer de Ronaldo um jogador quase antipático: individualista, sem saber perder, o que foi muito acentuado pela transmissão televisiva e alguns comentários que ouvi no estrangeiro. Foi então que me ocorreu que o Ronaldo pode estar no desporto e continente errados. Ele é o típico ídolo desportivo americano: rejeita perder, é igualmente competitivo com colegas e adversários, quer ser ele a decidir os jogos. Nos EUA é isto que faz um grande atleta: os americanos consideram o carácter competitivo e a recusa em perder como um dos maiores atributos pessoais (realçaram isso em Obama quando ele jogou basketball durante a campanha) e gostam do individualismo no jogo (consideram que se trata de assumir a responsabilidade do jogo). Na Europa, tudo isto é normalmente entendido como vaidade e egoísmo...
A verdade é que o Ronaldo promove a concentração do capital desportivo enquanto na Europa se prefere o capitalismo popular…

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Do I: As eleições europeias são tudo menos europeias

As eleições europeias costumam ser tudo menos europeias. Por vezes fala-se de Europa, mas não se faz política europeia. E o que falta à Europa é política. Melhor, um debate político correspondente à sua relevância política. O denominado défice democrático europeu é mais produto da falta de política que da falta de instrumentos democráticos. A prová-lo está o paradoxo de ao crescimento dos poderes do Parlamento Europeu ter correspondido uma diminuição na participação eleitoral europeia.
A União Europeia é dos entes políticos que mais e mais diferentes formas de representação democrática prevêem. Muita da legislação europeia envolve a participação dos governos nacionais (representando os seus cidadãos e controláveis pelos parlamentos nacionais), do Parlamento Europeu (directamente eleito pelos cidadãos) e da Comissão Europeia. Acresce que as políticas europeias beneficiam normalmente de um processo muito alargado de consulta dos interesses afectados. Há até quem defenda que a União é democraticamente superior aos estados. Do que a União necessita é de um debate político correspondente ao seu impacto político. No debate europeu discute-se sempre a razão de ser da União e não as suas políticas. É como se cada discussão entre duas pessoas casadas se transformasse sempre numa discussão sobre a subsistência do próprio casamento.
A Europa e a política.
Alguns estudos indicam que mais de 50% da legislação que entra em vigor nos estados-membros é de origem europeia. Partes importantes (se não mesmo predominantes) das políticas sociais, de protecção do ambiente e do consumidor, por exemplo, são fixadas a nível europeu. Mas a Europa também determina o que podem os estados fazer e como o podem fazer. Fá-lo de forma directa ao regular as formas de intervenção do estado na economia ou ao alargar o leque de beneficiários de muitas políticas sociais dos estados aos cidadãos de outros estados-membros. Fá-lo também de forma indirecta ao criar um espaço político e económico de mobilidade de pessoas, empresas, serviços e produtos. Este espaço põe em concorrência as próprias políticas dos estados que competem entre si para atrair investimento, empresas e pessoas. A nossa mobilidade exprime a nossa preferência relativamente a essas políticas. Esta mobilidade não se esgota na economia, mas alarga-se a outras dimensões da vida. A circulação dos cidadãos europeus pode hoje ter na sua base a procura de uma melhor educação ou cuidados de saúde ou até mesmo a escolha de um modelo de vida diferente, o que facilmente põe em tensão valores fundamentais de diferentes sociedades. Que direitos deve ter em Portugal um casal homossexual casado em Espanha e que decide vir viver para Portugal ao abrigo da liberdade de circulação?
O impacto político da União é hoje mais que pressentido; é claramente sentido. Só não é entendido. Trata-se a política europeia como política internacional. Vive-se na ilusão de que o essencial da política europeia ainda é a protecção do interesse nacional. A verdade é que na grande maioria das políticas europeias não existe "um" interesse nacional. Existem antes diferentes posições ideológicas sobre a melhor política em geral. As políticas europeias são hoje mais fruto de diferentes interesses políticos que dos interesses nacionais. Para qualquer actor social e político, a Europa é apenas mais um nível de decisão através do qual procura promover os seus interesses e preferências políticas. Se num estado a sua posição é minoritária, é mais que natural que tente promover certas políticas através da Europa. A preferência pela Europa é, neste caso, um mero resultado da preferência por uma certa opção política. Os sindicatos britânicos "preferem" a Europa ao seu próprio estado como centro de decisão das políticas sociais, pois sabem que o equilíbrio de forças lhes é aí mais favorável. Os ambientalistas portugueses encontraram na Europa uma forma de reforçar o seu poder. O mesmo sucede aliás com os governos nacionais que por vezes "transferem" para a Europa decisões com elevados custos políticos a nível nacional.
A natureza ideológica e não nacional da política europeia é confirmada por vários estudos que concluem que o voto parlamentar europeu assume crescentemente uma natureza ideológica, de acordo com a tradicional divisão esquerda/direita. A disciplina partidária nos grupos políticos europeus apresenta igualmente resultados muito semelhantes aos dos parlamentos nacionais e até ligeiramente superiores aos do Congresso norte-americano. Os deputados europeus votam mais de acordo com a ideologia que com a nacionalidade.
Isto só surpreende quem não se dá ao trabalho de pensar nas questões suscitadas por alguma da legislação mais importante recentemente adoptada ou discutida na Europa. Matérias como a regulação do tempo de trabalho, os contratos a prazo, o direito de asilo, a protecção de dados pessoais ou dos direitos de autor, a liberalização de certos sectores económicos ou o combate ao aquecimento global, são matérias em que não existe "um" interesse nacional. A divisão é sobretudo ideológica e vai muito para além das fronteiras nacionais.
É possível que nalgumas matérias ainda exista "um" interesse nacional e os governos nacionais agem sempre como se assim fosse, mas muitas vezes quando se fala de interesse nacional o que existe é uma preferência governamental por alguns interesses nacionais em vez de outros. A correspondência necessária entre a dimensão política da Europa e o debate político que a deve suportar exige que as eleições europeias sejam menos sobre a nossa posição na Europa e mais sobre qual a Europa que queremos. Mas não é fácil tornar europeias as eleições europeias.
O governo europeu.
Uma primeira hipótese é transformar as eleições europeias na escolha de um "governo europeu". A candidatura de Durão Barroso à presidência da Comissão antes das eleições é um primeiro passo nesta direcção. Claro que haverá quem lembre que as regras do Tratado dizem que é o Conselho que escolhe a Comissão e o seu presidente, e que o Parlamento "apenas" aprova tal escolha. Mas algumas revoluções políticas fazem-se através da prática constitucional. Será possível o Conselho escolher outro presidente no caso de a maioria parlamentar corresponder aos partidos que apoiam Durão Barroso? Os partidos ficam politicamente vinculados ao candidato que apoiarem perante o eleitorado. É verdade que os grupos políticos europeus ou apoiam Barroso ou criticam o seu nome, mas sem apresentarem uma alternativa. Estas eleições europeias ainda não serão um confronto entre diferentes líderes europeus e os partidos que os apoiam. Porém, o simples facto de se ser contra ou a favor de Barroso é uma forma de personalização da campanha e, goste-se ou não, é dessa forma que as pessoas se identificam com a política.
A candidatura de Barroso criou um precedente. Os eleitores europeus vão começar a associar as eleições europeias à escolha do presidente da Comissão. Tem dúvidas de que nas próximas eleições vamos ter uma competição eleitoral entre diferentes grupos políticos europeus e os seus candidatos a presidentes da Comissão?Há outra consequência. Durão Barroso será o primeiro presidente da Comissão "sujeito" a um sufrágio universal. Se vencer, terá uma legitimidade popular de que nenhum outro presidente da Comissão beneficiou.
Claro que existe um limite e um risco na "politização" da Comissão Europeia. O limite é que a sua composição está dependente de propostas de governos ideologicamente distintos, resultando numa heterogeneidade ideológica que mesmo um presidente forte não conseguirá dominar totalmente. O risco é que a sua politização afecte a sua imagem de neutralidade e independência técnica. Teme-se que a politização da União a possa desintegrar. A sua natureza consensual seria fundamental para evitar uma maior oposição social e política. Este risco existe, mas alimentar a actual ilusão pode comportar um risco ainda maior: o de que União seja vista como uma forma de fazer política sem debate político. É por isto que o debate sobre as políticas europeias se transforma sempre num debate pró ou contra a Europa.
São as políticas, estúpido!
Ficou famosa a frase colocada no quartel-general da candidatura de Clinton à presidência norte-americana: it?s the economy, stupid. Na Europa também precisamos de algo que nos lembre o que é decisivo para os cidadãos. O discurso europeu é dominado por uma espécie de existencialismo institucional permanente. É um discurso dominado pelas elites e que fica frequentemente reduzido a um discurso entre elites que discutem incessantemente o desenho institucional da União. Está tanta gente ocupada com a mecânica do carro que ninguém se lembra da sua condução.
Enquanto isso, os cidadãos continuam a avaliar a União a partir das políticas que os afectam. E a assimetria não podia ser maior entre as esperanças que os cidadãos depositam na Europa e a capacidade desta para lhes corresponder. De acordo com o eurobarómetro, entre as matérias em que os cidadãos mais desejam que a União intervenha estão o combate ao crime, a ciência e a tecnologia, o crescimento económico, a energia, a imigração, a defesa e a política externa. Tudo matérias em que a União tem pouco poder?
Mesmo em áreas como os sistemas sociais, de educação e fiscais, uma maioria de europeus (embora com importantes divergências entre estados) defende a existência de uma verdadeira política europeia. Mas isso não acontecerá com o actual orçamento. Este corresponde a pouco mais de 1% do PIB, enquanto a média nos estados anda próxima dos 20%. A União é sobretudo uma força reguladora. Pode oferecer direitos e impor deveres, mas apenas legislando, e não pagando. Tem um chicote grande e uma cenoura pequenina.
É por tudo isto que a atitude dos cidadãos face à Europa é quase esquizofrénica. Recorda uma piada de Woody Allen: duas pessoas que passam o tempo a dizer mal da comida de um restaurante e concluem a queixar-se que as doses são pequenas. E se nas presentes eleições os partidos, em vez de falarem das doses e da arquitectura do restaurante, nos dissessem o que gostariam de servir ao jantar?

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Onde está!? Que agora é só pau, ou pedra...


No último Domingo celebrou-se na Igreja a festa da ascensão de Jesus ao céu. Depois de morto e ressuscitado, Jesus continuou a aparecer junto dos apóstolos, ensinando-lhes o caminho e manifestando-se-lhes através dos seus sentidos. Com efeito, eles viam-no, ouviam-no, tocavam-no e cheiravam e comiam (peixe) com ele, tal como todos nós fazemos diariamente uns com os outros. Ao fim de 40 dias, porém, elevou-se aos céus, deixando de estar visivelmente presente entre nós.
Ora, a primeira leitura desse dia diz algo que me tem deixado pensativo e que aqui resolvi partilhar. Respondendo à habitual pergunta dos seus seguidores, que mais uma vez queriam saber se aquele era o momento em que ele iria restaurar a realeza de Israel, Jesus «respondeu-lhes: ”Não vos compete saber os tempos nem os momentos que o Pai fixou com a Sua autoridade. Mas ides receber uma força, a do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, por toda a Judeia e Samaria e até aos confins do mundo.” Dito isto, elevou-se à vista deles e uma nuvem subtraiu-o a seus olhos. E como estavam com os olhos fixados no céu enquanto ele se afastava, surgiram de repente dois homens vestidos de branco, que lhes disseram: “Homens da Galileia, porque estais assim a olhar para o céu? Esse Jesus, que vos foi arrebatado para o céu, virá da mesma maneira, como agora o vistes partir para o céu.”» (Act. 1, 1-11)
A verdade é que, também eu, esperando quase sempre que Deus venha forçar os outros ao reconhecimento da minha realeza e autoridade, tenho muita dificuldade em relacionar-me com este Jesus que deixou de mostrar-se, como tudo o resto, aos nossos sentidos. E é por isso que tenho ficado a pensar nesta última afirmação destes dois homens, surgidos de repente entre aqueles que o procuravam, como sendo uma profunda lição de fé: «Da mesma maneira que o vistes subir para o céu, assim o verás descer até junto de vós.»
Mas fico a pensar: como vi eu Jesus subir aos céus? Sei bem que me hão de dizer que Jesus se “vê” agora nos seus gestos, na sua palavra e na sua Igreja e que esses foram os “contactos” que durante esses 40 dias resolveu deixar entre nós. Está muito bem. Mas isso é a teoria. Na prática, de facto, nos seus gestos, na sua palavra e na sua Igreja, como vejo eu Jesus elevar-se ao céu?
A verdade é que olho pouco, vejo pouco e creio pouco. Fico sempre olhando mais para essa glória que espero venha a ser aqui restaurada, para essa vitória que Deus me há-de dar sobre todos os outros, e até sobre mim, que fielmente O servirei se assim Ele bem me servir! E, no entanto, estes dois homens, vestidos de branco, puros, castos, despidos da sua vã glória, continuam repetindo para que eu os oiça: «Assim como o viste subir ao céu, assim o verás descer junto de ti.»
Na verdade, que vemos nós, olhando a cruz, onde Jesus já não se encontra? Vemos a cruz, que carregando, no-lo mostrará!? Será? Talvez. Assim eu veja, em mim, esse caminho que Jesus fez em toda a sua vida e que culminou na sua própria elevação ao céu, para que na minha vida ele se me descubra, de repente, em tudo, em todos, agora, tornando-me mais forte por vê-lo e por sabê-lo dentro de mim.

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quarta-feira, 27 de maio de 2009

Tanta teoria

Porque é que há arquitectos que pensam tanto sozinhos em outras coisas que não arquitectura, em vez de pedirem ajuda? E porque é que este admira tanto o poder? O poder, em geral, claro. Para ele, Lisboa não precisa de praças para estar. Mas sim praças monumentais. Para vermos bem o Rei. Tiananmen deve ser a que fica mais próxima, em estilo. Vamos ter um bom sítio para concursos de papagaios de papel.

Esta é talvez a melhor parte (com vários erros históricos): "A minha posição é que não há nada para restaurar. Na época pombalina não havia desenho algum, era um terreiro, ponto final. A não ser que queiram restaurar o desenho do Estado Novo, feito no início dos anos 1930. Deixar o que está também não faz sentido porque é um desastre, é a ocupação daquela praça pelo automóvel."

Mas claro, também se fala de ritual (nunca falta essa palavra nestas coisas): "O cais adivinha-se ao longe mas está ligeiramente submerso, por isso a chegada será uma espécie de ritual."

E a cereja no topo: "O problema que a praça tem é o desconforto ambiental para as pessoas estarem. Parto do princípio que não é uma praça para estar, como as praças espanholas fechadas, cheias de esplanadas. É uma praça de cenografia, de grandes acontecimentos, que nas suas bordas terá sítios onde as pessoas possam estar e criaremos as condições para isso."

E, pronto, um homem dá-nos aquilo que quer e a mais não é obrigado. E os cidadãos, servem para quê? E ficamos assim, sem pestanejar?

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domingo, 24 de maio de 2009

Do Expresso: «Geração Maizena»


“O Dr. Paulo Rangel tem que comer muita papa Maizena antes de chegar aos calcanhares do Dr. Basílio Horta!”…

A frase deu manchetes e primeiras páginas coloridas. Mas, como tudo o resto, logo foi esquecida. E talvez não devesse.

Manuel Pinho pôs-se na posição do ancião, senhor do juízo último sobre o estatuto dos demais. Nesse palanque, estabeleceu uma hierarquia entre Paulo Rangel e Basílio Horta. E alvitrou que, para vencer a distância, Paulo Rangel deveria crescer.

Se fosse vista por um estrangeiro, a cena soaria muito estranha. É claro que não saberia o estrangeiro que uma certa geração se julga dona e senhora da democracia portuguesa.

Embora tenha acedido ao poder há muito pouco tempo, Pinho depressa passou para o lado dos que tratam a democracia como coisa sua. E, como todos os conversos, a sua defesa é veemente e implacável. Rangel é apontado como o usurpador. E, ainda por cima, um usurpador atrevido, já com veleidades de comentar adultos quando, na menoridade dos seus 41 anos (!), mal deixa os cueiros.

Esquecer depressa demais esta história é, afinal, recusarmo-nos a perceber uma das mais sérias patologias da nossa democracia. O seu fechamento em torno de alguns, poucos, identificados geracionalmente com aqueles que fizeram o 25 de Abril, antes deste, a resistência ao Estado Novo e, depois, o PREC e o 25 de Novembro.

Paulo Rangel não fez nada disso. Por uma razão simples: era uma criança. Enquanto os outros preparavam ou faziam a revolução, ele aprendia a ler e a contar.

Apesar disso, ou talvez por causa disso, é, seguramente, uma lufada de ar fresco na nossa política recente. É diferente, bem preparado, gosta da reflexão tanto quanto da acção, vem da sociedade civil, tem uma carreira profissional sólida. Não precisa da política, mas gosta dela. Entrega-se-lhe com sentido cívico e com ela firma um compromisso moral.

Aliás, é bom notar que Paulo Rangel não é o único. É apenas um dos poucos que conseguiu romper a blindagem do regime. Mas há mais, muito mais. Gente válida, com sucesso nos seus percursos profissionais. Gente interessada na coisa pública e genuinamente empenhada em causas colectivas.

Estão por aí, em todo o lado, disponíveis para um país que lhes vira as costas. À espera de um sinal, de uma abertura, de uma razão para intervir. Da política, não querem benesses, nem estatuto, nem dinheiro. Tudo isso arranjariam noutro lado. Da política apenas gostariam de ter a oportunidade de participar na construção de um país capaz de futuro e ambição.

São a Geração Maizena. E estão aí. Arredados dos corredores do poder. Pelos Drs. Pinhos desta vida.

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sábado, 23 de maio de 2009

Chavismo

O Chavismo A é uma doença epidémica, que se propaga de um país com um regime totalitário de esquerda e está a atingir Portugal em grande velocidade e intensidade.

As manifestações mais recentes e reconhecíveis, são:

.Uma vontade irrepreensível de nacionalizar empresas e contornar regras nacionais e comunitárias de aquisição de produtos.

.Jovens estudantes barbudos, com ar desvairado revolucionário de esquerda,nascidos em Democracia, a gritarem impropérios e a chamarem fascista ao Primeiro-Ministro que visitava uma escola secundária em Lisboa.

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quinta-feira, 21 de maio de 2009

A Constância do Banco de Portugal...


Diz o Jornal «i» que, por lapso, os administradores do Banco de Portugal não receberam durante o ano passado o aumento que lhes era devido e que, por causa disso, o mesmo aconteceu aos corpos directivos das outras Entidades Reguladoras. Como tal, para reparar o mal, as administrações do Banco de Portugal e das ditas Entidades deverão receber este ano um aumento de 5% (2,1% relativo a 2008 e 2,9% relativo a 2009). Parece-me justo, pelo menos em nome do direito de cada um à remuneração devida pelo trabalho realizado, coisa que, na nossa civilização, apesar de ser tão maltratada a tradição judaico-cristã, vem sendo defendido desde o livro do Eclesiastes.
A oposição, no entanto, barafusta, dizendo que isto é uma vergonha e que o Governo tem que inverter esta situação, já que de nenhum modo se pode aceitar uns tais aumentos neste terrível tempo de crise em que vivemos. Convenhamos que também têm razão. Segundo ouvi, na TSF, o aumento destes administradores, em alguns casos, representa, por si só, mais de dois ou três salários mínimos. Ora, quando tanta gente não tem aumentos, nem emprego, nem coisa nenhuma, não está certo que os altos quadros da administração pública sejam assim recompensados pelo Governo.
Para além de tudo, não poderá deixar de nos parecer estranho que o Governo, ainda que por lapso, não aumente os ditos gestores quando deve e pode fazê-lo, aumentando-os, no entanto, agora, quando não o pode nem deve. O «Expresso On-Line», talvez por isso, confirmando embora o lapso de 2008 e o prejuízo que isso causou aos dirigentes das várias Entidades Reguladoras, noticiou ao final da tarde o comunicado feito pela administração do Banco de Portugal, no qual afirmam que, contrariando até o disposto na lei, também este ano não receberão qualquer aumento, com o que infirmam o que no jornal «i» e nas rádios se vai dizendo.
Enfim, a confusão está instalada e cada um há-de pensar o que quiser. Fica, no entanto, a pergunta: será que o Sr. Governador do Banco de Portugal não recebe, no fim do mês, um recibo de ordenado, como toda a gente na função pública? Será que não o assina, ficando com uma cópia, na qual pode ler o que recebeu, o que descontou, as despesas de representação e o subsídio de almoço? Então e não reparou que não tinha sido aumentado? E não o reparou durante um ano inteiro? E não sabia que disso dependia a justa remuneração de alguns dos seus pares? E ninguém lhe disse nada? Nenhum dos outros administradores? Nenhum dos seus assessores? Nem o seu motorista?
Ora, a dúvida que nos foi imposta desde o deficit estabelecido por este Banco às contas do Governo de Santana Lopes, depois dos casos do BCP (de que ninguém parece já lembrar-se), do BPN, do BPP, dos estranhos empréstimos da CGD, etc., instalou-se agora definitivamente entre nós. Com efeito, como poderemos nós acreditar que o Banco de Portugal é capaz de exercer o seu papel regulador no mercado financeiro em Portugal, se o Sr. que o dirige não é sequer capaz de controlar o que recebe ao fim do mês?
A questão é grave, porque, na descrença quase total que os portugueses vão tendo relativamente à legitimidade da autoridade dos seus governantes, esta é mais uma instituição pública que vai ficando irremediavelmente manchada. Não podemos estranhar, portanto, que, também em relação a esta Entidade, as pessoas se comecem cada vez mais a perguntar: Afinal, para que serve o Banco de Portugal? Ou: Afinal, a quem serve o Banco de Portugal? Com efeito, é normal que entre nós se instale esta desconfiança, quando a incompetência e o erro parecem ser a única constância do Banco de Portugal.

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JBC... sempre


João Bénard da Costa vai fazer-nos muita falta. Porque morreu um homem maior.

Com João Bénard da Costa parte o testemunho vivido de uma boa parte da nossa história recente. Parte alguém capaz de intervir e de pensar, um homem de cultura, um homem de causas, um homem de valores, um homem de princípios.

O cinema sentirá o vazio que deixa. Mas, muito para além do cinema, é também o seu lugar na sociedade que é insubstituível. Faltará a sua palavra atenta, o seu olhar inteligente. A sua inconfundível voz, pausada pelo peso de um discurso sempre relevante.

João Bénard da Costa era um homem raro. Um homem admirável. E Portugal anda falho de gente susceptível de admiração.

Hoje, ficámos mais pobres, mais tristes, mais órfãos. Por isso, numa ironia plena de sentido, chorar por João Bénard da Costa será também chorar por nós.

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terça-feira, 19 de maio de 2009

Feira do Livro

A feira do livro deste ano esteve diferente e muito melhor. Muito melhor mesmo. Incomparavelmente. Quem foi o responsável? Quem pôs na ordem os grémios dos editores? Alguém sabe?

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Ora bem,

vejamos, nas legislativas não vou votar. Volta e meia assim faço. Não votarei por duas razões. Gostava de ter um governo de maioria relativa, para irmos aprendendo a viver com esse estilo tão europeu, e não gosto de nenhum dos candidatos em quem poderia deitar o meu voto, como se diz.
Nas europeias, acho que vou votar (se estiver por cá, claro). Para contrariar, se calhar. Mas também porque a Europa é o melhor que nos aconteceu e acontecerá. Ora, seguramente não votarei no homem de Coimbra que representa o que de mais antigo este país tem. Nele não voto de certeza.
E hoje li uma entrevista de que gostei. Gostei muito mesmo. Um homem de direita e católico (coisas que não sou muito) e com ideias bem fabricadas (coisa de que gosto e muito). Achei mesmo interessante. E gosta de Europa sem complexos. Tem uma posição inteligente sobre o federalismo (não é um bicho-de-sete-cabeças), sobre os referendos (não são sacrossantos) e sobre o défice democrático (existe sempre que se tem poder executivo - acho que é mais ou menos isto).
Mas depois pensei (erro): mas será que vou deitar o voto nele e ele vai mesmo para lá? E se for mesmo? Depois muda a direcção do partido e ele fica silencioso? Bem, não se pode ter tudo e vou mesmo votar no Paulo Rangel (se não mudar de ideias e estiver por cá, claro). Por causa de uma entrevista? E porque não?
Não é ainda comum neste país dizer-se em quem se pensa votar, mas aqui fica dito.

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II. Riscos do Vaticano II

Mas o segundo vício que foi potenciado com o Vaticano II é o da submissão ao século. E este vem dos não católicos. Como a Igreja vem ter com eles, acham que vem prestar vassalagem. Simpatizam com ela vagamente quando faz o que a modernidade quer. Aceitam as suas desculpas tanto quanto as exigem quando se trata de Galileu ou da colonização, acham-na simpática quando tem actividade humanitária, querem-na julgar apenas pelas suas categorias de modernidade. Mas não admitem que seja uma religião. E que tenha doutrina própria.

Quando a Igreja vê os seus missionários morrer em África ou na América Latina ou na Ásia, vítimas de perseguições e de uma presença de humanidade no terreno, acham que mais não faz que o seu dever, e deixam quando muito saltar uns condescendentes elogios de passagem. Mas sempre que se afasta da modernidade, sempre que lembra que não é feita para a modernidade porque a ultrapassa, surge logo o coro de protestos. Não se admite que a Igreja invoque a eternidade, porque isso é obsceno para a modernidade. Que seja simpática, agradece-se. Que seja uma religião, parece retrógrado.

Este fenómeno diz muito mais sobre a modernidade que sobre a Igreja. A modernidade está aberta ao diálogo, mas apenas nos seus termos. Não admite uma efectiva – logo, profunda – diferença, mas apenas a disparidade que ela mesma criou. A modernidade é um jardim à inglesa que sob a aparente liberdade obedece a regras bem estrictas que não se deixam enunciar à primeira vista.







Alexandre Brandão da Veiga

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O Estado do Estado, no Nicola



No café Nicola em Lisboa, teve lugar ontem um encontro do candidato Paulo Rangel com bloggers. O candidato,blogger actualmente em licença sabática,é autor do livro de ensaios "O estado do Estado".
Foram mais de duas horas de troca de ideias. Falou-se de fetichismo, exclusividade e hiperidentidade.

O ESTADO, que já não existe tal qual o pensámos.

Defende o candidato que "A evolução tecnológica e as possibilidades de mobilidade que lhe andam associadas alteraram radicalmente as condições de manifestação e de exercício do poder político e, designadamente, do poder político estadual. Desligaram-no definitivamente do comutador territorial: o espaço deixou de ser a base fundamental das relações políticas".

A esta mudança de natureza das relações de poder, Paulo Rangel chama a " medievalização do poder", no que quer significar " a enorme dispersão e multiplicidade dos centros de poder e a erosão do seu fundamento territorial".

O que vem a culminar na constatação de que "o modelo estatal, enquanto modelo único e homogéneo de organização de convivência política, exibe sinais de degenerescência e declínio."

Paulo Rangel defende ainda que se assiste " a um fortalecimento de um sem-número de poderes de facto (económicos, desportivos, religiosos, culturais), muitos deles com origens transversais, sem qualquer elemento de conexão ao tradicional poder dos Estados.


A EXCLUSIVIDADE, que já não existe.

A existência de centros autónomos de imputação de poder, significa também que esses nichos de poder criam laços de pertença com as pessoas que os integram "criando nexos de lealdade política que competem com o Estado. Laços que por não serem esclusivos são sobreponíveis ao vínculo estadual".

A EUROPA, a hiperidentidade portuguesa.

Paulo Rangel declarou-se não ser um fetichista do referendo (momento quente da noite) denunciando a estratégia antifederalista: "urdiram uma estratégia maquiavélica cujos contornos só agora se tornam claros. Primeiro tornaram "federalista" um insulto,depois adoptaram uma solução desigual e agora denunciam a desigualdade dessa solução!

Quanto à perda de identidade nacional, suscitada pela audiência, Paulo Rangel respondeu com o conceito de "hiperidentidade" de Eduardo Lourenço, um povo que diz tão mal de si próprio, tem de estar bem seguro da sua identidade.

A TURQUIA, A RÚSSIA.

As dificuldades da integração turca ( a ter em conta o deficit democrático e e o estatuto subalterno das mulheres turcas), e a necessidade de pensar em soluções progressivas para a integração. Registou-se alguma contestação na sala.
A defesa da ideia de uma Europa do Atlântico aos Urais. A constatação de que os Russos são europeus e que a cultura europeia não abdica dos contributos de Tolstoi, Dostoievski, Tchaikovsky ou Prokofiev. Por esta altura sentiu-se um friozinho siberiano na sala.

Noite quente no Nicola, um candidato com ideias firmes sobre o projecto europeu, o estado do Estado em pano de fundo.

Paulo Rangel, o candidato que é o estado da arte nas eleições europeias.

Todavia, fica-me uma pergunta. Não será justamente por causa de uma obra de arte de um russo que tantas vezes concebemos os russos como não europeus?
Será que de cada vez que pensamos na Rússia pensamos nesssa obra maior de Serguei Eisenstein "Ivan, o Terrível". Será que uma obra de arte tem tanto poder?

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segunda-feira, 18 de maio de 2009

O humor tem ideologia?

O Yes, Minister/Prime Minister era a série favorita de Margaret Thatcher. E também de Friedrich Hayek. Não é difícil compreender porquê. Para além de ser uma série engraçada, o Yes, Minister tem também uma acentuada consonância ideológica com as posições de Hayek ou Thatcher. A série apresenta uma forte influência da teoria da escolha pública; a concepção da intervenção estatal como geradora de custos e ineficiências, ou a noção de uma motivação egoísta no comportamento de políticos e burocratas – os primeiros motivados pelo desejo de ganhar eleições e exercer o poder, os segundos pela maximização orçamental dos seus serviços, da qual derivam prestígio e poder – são temas recorrentes da série. Como referem John Blundell e Colin Robinson, do Institute of Economic Affairs (“the UK's original free-market think-tank”): “To anyone versed in economics these programmes are not only entertaining but also pure public choice”. Um dos criadores da série, Antony Jay (ou melhor, Sir Antony Jay – foi nomeado cavaleiro em 1988, por sugestão do governo… Thatcher) descreveu a teoria da escolha pública como estando na base de praticamente todos os episódios do Yes, Minister/Prime Minister (para além de se auto-descrever como um “radical right-winger”). A sua perspectiva é corroborada ainda hoje: um artigo de 2006 na revista do Institute of Economic Affairs, a Economic Affairs, caracteriza a série como um instrumento ideal para leccionar a teoria da escolha pública.

Isto leva-me a uma questão: o humor é ideológico? A ligação entre o Yes, Minister/Prime Minister e a teoria da escolha pública sugerem que não: afinal, há muita gente que rejeita a escolha pública ou é de esquerda mas aprova o Yes, Minister/Prime Minister. O melhor exemplo é Tony Benn: doyen e símbolo da esquerda britânica, mas também fã da série. Contudo, creio que a resposta não é tão simples: o YM/YPM foi co-escrito por um anti-Thatcherista, Jonathan Lynn (depois de Thatcher ter participado num sketch do Yes, Minister, Lynn disse que ela tinha tomado “her rightful place in the field of situation comedy”); e a série tem um lado que apela à esquerda também. Sir Humphrey representa não apenas o burocrata que defende os seus interesses, ele é também o símbolo do privilégio, da tradição, das classes sociais educadas em escolas privadas (e que enviam os seus filhos a escolas privadas), das “old boy networks” de Oxbridge. Seria a série tão popular sem este lado? Suspeito que não.

O teste mais contemporâneo à relação entre humor e ideologia é-nos dado por programas como o Colbert Report ou o Daily Show. Suspeito que há muitas pessoas de direita em Portugal que gostam do Colbert e do Jon Stewart (aliás, há algum tempo atrás, João César das Neves caracterizou o Daily Show como “genial” num artigo de opinião – embora o seu “compliment” se tornasse crescentemente “backhanded” ao longo do texto). Mas esse não me parece um indicador fiável: é muito mais fácil rirmos do humor político quando ele é sobre outros países, sobre políticos em quem não podemos votar, e cujas decisões nos favorecem ou prejudicam de forma muito mais indirecta. Nos EUA, há uma boa parte da direita que não acha nenhuma piada ao Jon Stewart (como disse o Bill O’Reilly, “You're Jon Stewart. If you go to Alabama you're going to be killed. You can't go where these center-right people are because they'll stone you to death”). E, igualmente, há uma boa parte da esquerda que não acha piada p.ex. ao P.J. O’Rourke (ver este artigo do New Republic. Frase-tipo: “Can [O'Rourke]’s stuff really being getting worse every time, we wonder? Of course the answer never ceases to be in the affirmative.”) Em Portugal, temos muito pouco humor político (aliás, temos muito pouco humor tout court, mas essa é outra história…) que seja ideologicamente alinhado: o humor político que temos aponta em geral para os alvos fáceis e óbvios, e raramente se aventura por questões controversas. Uma excepção em termos de humor politicamente alinhado (& nothing else of what I said above…) é o sketch dos Gato Fedorento sobre o aborto. A reacção muito distinta que suscitou da parte de figuras ‘pró-vida’ e de ‘pró-escolha’ leva-me a pensar que o humor é (também) mediado pela posição ideológica.

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I. Riscos do Vaticano II


Já se glosou que bastasse o tema do papa e do preservativo. Curioso que quando se trata de teologia a única referência que venha à cabeça da modernidade seja a do látex. Não me importa o comentário pequeno, mas o que o move. Não a boca de cena, mas o seu pano de fundo.

Provavelmente boa parte dos termos em que decorreu a discussão tem a ver com os riscos do Vaticano II, o preço que se teve de pagar pelo concílio. Se em português conciliar tem uma dimensão de pacificação a verdade é que cada concílio teve os seus preços. Está no século, faz parte da vida humana, não é de estranhar.

Entendamo-nos: o Vaticano II teve aspectos bem positivos. Na perspectiva popular, o ritual da missa em vernáculo e os aspectos mediáticos são os que mais sobressaem. No que me respeita parece-me que os dois aspectos mais relevantes são outros: a revalorização da patrística e o ecumenismo.

A patrística desde meados do século XIX que vinha a ser revalorizada. E com razão. Esquecê-la é ignorar tesouros de sapiência e sobretudo de ambição (a teandria, por exemplo) que foram esquecidos por uma versão por vezes menos poética da escolástica. Associado a esta renovação está um novo assento para o ecumenismo. Sem a patrística, traço comum a católicos, ortodoxos orientais e protestantes, não seria possível fazer do ecumenismo mais que um rol de boas intenções, sérias porque experimentadas pelas guerras, mas inconsistentes sob o ponto de vista dogmático. Ecumenismo não é diálogo das religiões, é bem mais vasto que isso. É o passo para a efectiva união das igrejas. E o Vaticano II foi um momento particularmente importante neste percurso.

É verdade. Mas como nada aparece sem preço, dois perigos maiores surgiram do Vaticano II, dois malentendidos que este poderia gerar. A Igreja apresenta-se perante o século pronta a dialogar com ele. E desta disposição ao diálogo surgem dois malentendidos que a penhoram neste momento.

O primeiro malentendido nasce entre os católicos sobretudo. Vivendo na modernidade esperam e acabam por acreditar – que se entraria numa era da pastoral perfeita, ou seja, que a vida do dia a dia e a pastoral deixariam de viver em dissonância.

Quando isso não acontece o católico sente-se derrotado. Se perde o referendo sobre o aborto afirma que está em minoria, mesmo que todas as sondagens digam que é maioritário. Sempre que perde no século sente-se derrotado, menorizado. Porquê? Porque vive numa ilusão da pastoral perfeita.

Ora a verdade é que tal pastoral perfeita nunca existiu em época nenhuma. Basta ver a dissonância que sempre existiu entre a prática dos países cristãos e a pastoral. Em nenhuma época se pode indicar ausência de dissonância. É valido para o cristianismo e para todas as religiões. Mas em boa verdade para todas as mentalidades e as suas práticas. A Europa tem durante quase todo o segundo pós-guerra a esquerda como paradigma de legitimidade, como o centro sacerdotal, e no entanto vota à direita. O jornalista, o líder de opinião, o intelectual facilmente apoia ditaduras soviéticas, albanesas, chinesas, e no entanto a maioria da população vota em democratas-cristãos, conservadores ou liberais.

Que seja assim em todas as épocas é asserção que é conhecido até ao enfado. Mas o católico do Vaticano II, que assumiu o mito da pastoral perfeita, esqueceu-se desse dado de base. Que o budista faça guerra, o muçulmano persiga o cristão, o liberal retire liberdade ao trabalhador nunca espantou ninguém. Que o católico viva num mundo de pastoral imperfeitamente vivida custa-lhe mais que nunca.

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Tigres domados

Vi ser construído de raiz o primeiro bairro social em Peniche.
Não são os bairros simples de pescadores de casinhas térreas ( ao pé da Papôa ou a poente do Forte), mas os grandes blocos brancos que ficam ao lado da praça e em frente aos correios e para onde se mandaram os excluídos (etnia cigana, africanos vindos das colónias e outros).
Desde logo se tornou conhecido como o "Cambodja". É um mercado de droga, toxicodependência e prostituição para desespero das poucas famílias trabalhadoras que lá também viviam.
Aqueles vivem da prática de crimes. A situação agravou-se com o Rendimento de inserção social. A partir desse momento, foi todo um modo de vida que se cimentou.
Alimentam-se nas pastelarias - Peniche deve ser a localidade portuguesa com mais pastelarias por metro quadrado. Divertem-se a assaltar os adolescentes que têm de ali passar para ir para escola.
Arrisco que todos vivem dos subsídios do Estado. Pagamos para que não trabalhem, para os manter dopados, calmos e para não aborrecer os burgueses.
É quase como no circo, entopem-se os tigres de carne para que o domador entre na jaula sem grande perigo.
Isto não é a crise porque é assim há 15 anos.
Crise, são os pequenos comerciantes a fechar todos os dias, lançando para o desemprego os seus proprietários e trabalhadores. Estes sentem-se desamparados e envergonhados da sua condição, não frequentam as pastelarias.
Das duas, uma: ou têm vergonha, ou têm medo dos tigres. É que às vezes os tigres chateiam-se e abocanham a cabeça do domador.

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domingo, 17 de maio de 2009

Sondagens

Já que estamos a falar em grandes séries, e como vêm aí muitas sondagens (três eleições em 5 meses - é só fazer as contas), nada melhor que relembrar o Yes, Prime Minister. Já agora, para os políticos que acreditam em teorias da conspiração sobre sondagens: sim, as que vos dão maus resultados foram feitas exactamente assim...



Last & least, uma curiosidade: no vídeo, o Humphrey conclui a sua exposição dizendo ao Bernard, "There you are, you see Bernard. The perfect balanced sample". No livro da série (The Complete Yes, Prime Minister - BBC Books), a frase final é "You see, Bernard, you're the perfect Balanced Sample". A diferença é pequena, mas a segunda versão é ainda mais engraçada.

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Filmes



A Lusa indica que Jorge Jesus, o treinador do Sp. Braga, considerou que as notícias que o dão como próximo treinador do Benfica são "filmes" criados pela comunicação social. Fico só com uma dúvida: estes filmes são de ficção ou documentários?

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sexta-feira, 15 de maio de 2009

Bem visto

"(...) Sem ensino pré-primário, uma escola sem moral, uma ideologia de facilitismo e de irresponsabilidade, bairros sociais que são guetos, integração social e moral impossível e uma sociedade avessa a impor valores, conduziram a esta situação socialmente explosiva. E para percebermos o que se passa, nem falei da Crise. Neste caso não há crise, há uma catástrofe social cozinhada em lume brando nos últimos anos da nossa política."

O que de melhor vi escrito sobre a Bela vista. Luís Campos e Cunha no Público de hoje.

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i?

Desci para comprar o jornal, o que já faço raramente por causa da Internet, e ia comprar o "Público" quando me lembrei que afinal havia outro. E pedi. A resposta ao meu pedido foi: o quê? Importa-se de repetir? Eu insisti da melhor forma que pude: queria-o-i por favor. Também podia ter tentado: tem-o-i? Mas lá o consegui o i.
Mas isto é nome de jornal? Não há uma escola de dar nomes? Ou foi de propósito para que houvesse reacções como a minha? Fora isso, parece um bom jornal e os 10 primeiros minutos que passei com o dito foram agradáveis. Uma boa crónica (um bocadinho socialista, digamos) do Pedro Lomba, boas fotografias, uma ou duas reportagens de fundo que parecem interessantes, agrafado, política doméstica qb sem ser em excesso, e mais.
Era bom que fosse bom porque apesar de tudo é bom ler jornais.

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quinta-feira, 14 de maio de 2009

Boston Legal (Alan Shore & Francisco Louçã)

O Miguel Poiares Maduro e eu tínhamos já há um tempo acordado em vir a discordar sobre a interpretação que cada um de nós tem sobre a série de televisão Boston Legal. O post do Miguel dá-me finalmente a hipótese de explicar porquê.
A série, como o Miguel diz, é fantástica: bem-feita, bem pensada, bem representada, inteligente, divertida, enfim… se do ponto de vista da encenação tivesse que lhe pôr algum defeito, seria apenas o facto de que o seu ritmo não permite seguir com a necessária calma os argumentos que, francamente, são bons. Até aqui, portanto, estamos de acordo.
O Miguel pensa, no entanto, que a série simboliza o reencontro daquilo a que ele chama as duas almas americanas: a liberal e a conservadora. Diz, com efeito, que por intermédio da amizade tolerante e sincera de Alan Shore e Denny Crane, esses dois amigos ideologicamente opostos que, no seu discurso e no seu comportamento, violam todas as regras do politicamente correcto, a série promove a reconciliação desses dois lados adversos da América.
Ora, eu penso, bem ao contrário, que a série promove abertamente a defesa do politicamente correcto. Em primeiro lugar porque é bom não esquecer que um desses supostos lados da América, nomeadamente o lado conservador, representado por Denny Crane, está, muito significativamente, com Alzheimer. Quer dizer: defende os valores tradicionais, ou socialmente maioritários, mas já não se lembra bem porquê. A defesa que faz dos seus valores, aliás, é muito pouco racional, ficando-se quase sempre pela afirmação veemente dos factos. É, no fundo, um tonto, embora muito divertido.
Alan Shore, pelo contrário, representando, de acordo com o Miguel, o lado liberal (embora, na verdade, represente a esquerda liberal norte-americana), é de uma inteligência afilada e de uma sinceridade genuína, ambas enraizadas num sentimento profundamente humano que transporta para tudo aquilo que faz, seja para os casos que defende – sempre causas minoritárias e socialmente fracturantes –, seja para a amizade tolerante que mantém com este seu amigo conservador, ao qual já prometeu – imagine-se – desligar a máquina que o mantenha apenas artificialmente vivo quando chegar – porque vai chegar (!) – a altura.
Assim, a nossa discordância resume-se nisto: o Miguel crê que esta série propõe uma reconciliação dos lados conservador e liberal da América através de uma linguagem e de um comportamento politicamente incorrectos. Eu julgo, bem ao contrário, que esta série é a apologia pura e simples do politicamente correcto. No cerne do nosso desacordo está, assim me parece, a actual incompreensão generalizada sobre o que é o politicamente correcto, normalmente entendido de um modo puramente formal, como um discurso irreverente, que não obedece aos cânones institucionais e que choca, por isso, com as tradições já sem sentido que, em nome de um poder particular e já velho, apenas artificialmente são mantidas.
Isto, no entanto, é apenas a sua propaganda: uma mera forma de comunicar que atrai facilmente aqueles que normalmente são contra o poder instituído e apressados nas suas conclusões: falamos, claro está, dos adolescentes, que entre nós engrossam as fileiras do partido português oficialmente defensor do politicamente correcto: o Bloco de Esquerda.
Materialmente, porém, o politicamente correcto é bem uma outra coisa – ou melhor: duas. Movimento de origem marxista, é o defensor intransigente ou da verdade absoluta, quando o seu partido esteja no poder, ou do relativismo absoluto, quando o seu partido esteja na oposição ao poder.
A expressão, com efeito, foi pela primeira vez utilizada, num discurso, por Mao Tsé-Tung, tendo a partir de então designado, no contexto comunista e maoísta, tudo aquilo que estava de acordo com a linha maioritária do partido e com o pensamento do seu presidente. Mais tarde, porém, a chamada nova esquerda norte-americana, mantendo o mesmo nome, deu-lhe o sentido exactamente contrário, não reconhecendo ao pensamento político e à prática social maioritários qualquer direito que lhes permitisse impor os seus próprios valores e, neste sentido, descriminar as minorias.
O politicamente correcto, assim, tal como no último quartel do século XX se tem espalhado por todo o mundo ocidental, significa o combate contra os valores pretensamente naturais e absolutos que sustentam a realidade social instituída (nomeadamente os valores da cultura judaico-cristã, branca, ocidental, patriarcal, heterossexual, euro-americana e capitalista), em nome da defesa de um direito a uma liberdade absoluta e formalmente igual (sobre este assunto pode resumidamente ver-se BESSA, António Marques, e PINTO, Jaime Nogueira, Introdução à Política, Ed. Verbo, Lisboa/S. Paulo, 2002, vol. III, págs. 70-75).
Ora, não há como não ver aqui o discurso e a agenda de Francisco Louçã e de Alan Shore. Concedo, de bom grado, que o segundo é muito mais divertido, tem muito melhores argumentos e, sobretudo, é incomparavelmente mais condescendente. Mas aqui estamos outra vez enredados já apenas na questão da forma. Materialmente - é bom que não nos iludamos -, são ambos terrivelmente perigosos, estando apenas à espera que o amigo/adversário entre em coma para então lhe desligar a máquina e assim impor de uma vez por todas a sua própria - e única - verdade.

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quarta-feira, 13 de maio de 2009

É bom ter a quem olhar

«Modelo de príncipes, exemplo de senhores, espelho de contemplativos és tu, bem aventurado Nuno! Tu foste firme e forte em combate, tu foste comedido e apiedado na vitória, tu foste justo e misericordioso na paz, tu foste obediente e devoto no claustro. Assim como em toda a situação sempre te comportaste com dignidade e brio e como nos teus dias de vida alcançaste honra e glória assim também alcançaste no céu a eterna bem-aventurança».

Oração composta pelo Infante D. Pedro, citada pelo seu irmão o Rei D. Duarte em documento escrito em 21 de Julho de 1437, em latim.

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terça-feira, 12 de maio de 2009

Já não é proibido proibir!


Ontem, ao ver e ouvir Carmelinda Pereira, tive o meu momento nostálgico. De repente, e sem aviso, revi esses tempos longínquos em que tudo era simples…

A crise tem solução. Uma única solução. E óbvia, ainda por cima. Proibir os despedimentos! Os males do mundo e os males dos trabalhadores – em rigor, uma e a mesma realidade – resolvem-se de uma penada se o Estado proibir os patrões de despedir.

Perante a estupefacção da entrevistadora, Fátima Campos Ferreira, que aventou, “mas, então, vamos proibir as empresas de ir à falência?!”, logo Carmelinda Pereira nos sossegou, “isso, é preciso que o Estado proíba os empresários de declararem falência!”.

Durante anos, lembrei o PREC e a sua retórica atribuindo a cândura da minha memória à infância de então. Contudo, ontem, ouvindo Carmelinda Pereira, percebi que talvez não fosse assim. Afinal, há quem continue apegado a verdades simples. Cegamente apegado. E, como à época, a verdades demasiado simples.

No fim, fica a certeza do revisionismo. Quarenta anos depois, já não “é proibido proibir!”.

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segunda-feira, 11 de maio de 2009

A melhor série televisiva…


O título do post é uma provocação ao Gonçalo. É o principio de um debate há algum tempo prometido... Boston Legal é a melhor série televisiva em exibição! É o espelho das duas almas americanas. Denny Crane (William Shatner, esse mesmo: o Capitão Kirk da Star Treck ) e Alan Shore (James Spader) são dois advogados excêntricos de sucesso, amigos inseparáveis mas ideologicamente opostos. São eles o centro da série e da sociedade de advogados em torno da qual tudo gira. O modelo da série não podia ser aparentemente mais clássico: um escritório de advogados e, em cada episódio, dois casos jurídicos resolvidos com o habitual sucesso. A primeira novidade reside no carácter disfuncional da sociedade de advogados. A Crane, Pool and Schmidt está para o conceito de uma sociedade de advogados como os Sopranos estão para o conceito de família…. De forma notável a série nunca cai, no entanto, no absurdo e muito menos no ridículo. Ao contrário de outras séries (recordo-me de Ally McBeal) consegue manter a credibilidade. Muito se deve ao facto de, no meio de tantos advogados excêntricos, existirem duas ou três personagens que são âncoras de estabilidade e apego à realidade. Da mesma forma que o palhaço pobre sempre necessitou de um palhaço rico estas séries disfuncionais só funcionam se tiverem alguns personagens que tornem credível tudo o que se passa à sua volta. Neste caso, essa figuras são desempenhadas por Candice Bergen, John Larroquete e Rene Auberjonois. São eles que permitem a Shatner e Spader brilhar. A excentricidade dos seus personagens permite-lhes dizer o que seria inaceitável noutro contexto. Alan Shore e Denny Crane violam todas as regras do politicamente correcto (na linguagem e no comportamento: bebem, fumam, "assediam" as mulheres, utilizam palavras quase fora de uso no actual contexto americano…) e ao fazê-lo permitem que tudo se discuta nesta série: os argumentos de todos os lados e quase todo o tipo de argumentos.
A série é, igualmente, notavelmente escrita. Em cada episódio há uma história mais ligeira e uma que representa um tema fundamental na sociedade americana: a tortura, o uso das armas, o aborto, etc. O que é fantástico é que, embora sendo perceptível um certo favoritismo por um dos lados da questão, a série nos apresenta ambos os pontos de vista. E fá-lo de uma forma profunda e com um rigor digno de um artigo académico! Só West Wing demonstrava a mesma preparação e profundidade no tratamento dos temas.
Mas a série termina sempre com Crane e e Shore: a América conservadora e a América liberal que se encontram naquele terraço. As suas diferenças permitem à série representar as duas Américas. A sua amizade permite à série oferecer aos americanos a esperança de algo bem mais difícil de concretizar: reconciliar essas diferenças.
Não sei se isto quer dizer alguma coisa: apesar de Bóston Legal ter tido um número recorde de nomeações para os Emmy não irá voltar este ano…

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domingo, 10 de maio de 2009

Bloco central ?

Há cerca de 15 dias, numa entrevista que deu a Mário Crespo, na SIC, Manuela Ferreira Leite terá dito algo que fez parecer a Augusto Santos Silva que ela estaria a abrir a porta para a formação de um futuro bloco central. Caiu-lhe tudo em cima, como de costume, mas desde então não se fala noutra coisa. Debates nos meios de comunicação, afirmações de políticos (sobretudo de dirigentes e ex-dirigentes socialistas), comentários de comentadores, insinuações de jornalistas… enfim: não se fala de outra coisa.
José Sócrates, entretanto, do alto da imponência a que o obriga a sua estratégia de comunicação, não fala sobre o assunto, mandando alguns ministros e deputados, porém, dizer sobre o “assunto” que a questão é prematura, já que o PS luta apenas e ainda por uma maioria absoluta. Manuela Ferreira Leite, pelo seu lado, sem qualquer estratégia de comunicação, disse que a hipótese do bloco central, em abstracto, é obviamente possível, mas que, em concreto, sendo ela presidente do PSD e José Sócrates secretário-geral do PS, é uma absoluta impossibilidade. Isto ao mesmo tempo que outros militantes do PSD diziam também coisas sobre o assunto, nem sempre concertadas com o discurso da sua líder.
Enfim, a confusão instalou-se e toda a gente fala sobre este “desassunto”. No meio da confusão, porém, há algo em que vale a pena reparar: os pressupostos da discussão. É que, embora me pareça que a tropa do circo da política mediática não se tenha apercebido disso, todo o debate sobre o eventual bloco central assenta unicamente sobre a hipótese da vitória do PSD nas próximas eleições legislativas – coisa que, no entanto, até agora ninguém admitia.
De facto, atendendo às sondagens, se o PS ganhar as eleições com uma maioria relativa, as soluções para um governo estável apenas excluiriam, em princípio, uma coligação com os Verdes. Com efeito, quer com o BE, quer com o PCP, quer com o PSD, quer com o CDS/PP, o PS teria hipótese de constituir uma maioria absoluta na assembleia. Assim, embora eu creia que muita coisa vai mudar até lá, o facto é que, no caso de uma vitória do PS nas eleições legislativas - e de acordo com as actuais sondagens - não se vê qual é a necessidade do dito bloco central.
Agora, se o PSD ganhar as eleições, de acordo com o estado actual das sondagens e excluindo a hipótese de uma coligação com o BE e com o PCP, não se vê que fosse possível um apoio estável ao governo por meio de uma coligação entre o PSD e o CDS/PP, pelo que, aí sim, seria imperioso pôr-se a hipótese da constituição de um bloco central, sendo que Ferreira Leite nunca o faria, como já disse, com José Sócrates.
Em qualquer caso, portanto, o bloco central, de que tanto se fala, não acontecerá, a não ser que o PSD ganhe as eleições e o PS troque de secretário-geral, pois que com este Ferreira Leite não faz acordos. O interessante, assim, é que pela primeira vez toda a gente põe abertamente a hipótese (embora, ao que parece, sem verdadeira consciência disso) do PSD ganhar as eleições legislativas. Convenhamos que é um ponto de viragem. A continuar assim, quando chegarmos a Julho, teremos as televisões a falar sobre as vantagens de uma maioria absoluta do PSD (por comparação com uma sua vitória com maioria apenas relativa) no quadro de uma estabilidade governativa favorecida, nesse caso, pela boa relação pessoal e institucional de Manuela Ferreira Leite com Cavaco Silva.

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Compre mais, LEYA mais


A LEYA está na feira com um conjunto de stands que se apresenta como um todo unitário.
Os stands estão pensados para a livre circulação, existe uma "praça central", onde nos podemos sentar com as crianças, cestos para levar livros, e o apelo de marketing para levar 4 livros e apenas pagar 3.
Os livros dos autores portugueses estão em destaque: Saramago, Lobo Antunes, Cardoso Pires.

Todo o ambiente me lembra o de um shopping: cómodo, aparatoso, fácil,colorido, prático, pensado para os clientes, com um apelo descarado para que se comprem produtos, livros neste caso, com a música de fundo a criar boa onda.

Muito pouco de esquerda, portanto.

E eu, que não sou de esquerda e não acho que os livros tenham de ser comprados a quem mostre o carácter sisudo de um bibliotecário de Alexandria, atiro-me áquilo como gato a bofe.

E a menos que me digam que todo aquele aparato foi conseguido ás custas de trabalho infantil asiático, quando ler A hora má, Os ratoneiros,ou A mancha humana, noite fora, sem barulho, vou sentir-me realizada.

Feliz mesmo quando ler Travessuras da menina má, quanto mais não fosse porque este veio de graça. E a graça que as meninas más têm.

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Vocação proprietária


Somos tão obececados pela propriedade, que não nos basta sermos proprietários das casas em que habitamos.

Nas aldeias, compra-se com antecedência e esmero o pedaço de terra do cemitério onde teremos a última morada, exibindo com orgulho a respectiva caderneta predial.

Nas cidades, mandamos gravar o nosso nome numa banal cadeira de plástico num estádio de futebol.

isto não é uma vocação proprietária, é uma vocação totalitária.

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sábado, 9 de maio de 2009

Caderno de Encargos

E se a culpa não fosse do arquitecto? Se o arquitecto até fosse bom, mas a culpa fosse do resto? Por exemplo, do caderno de encargos. Se o caderno foi, olhe faça aí uma coisa bonita no seu computador para ver o que dá, então pode ser que arquitecto tenha feito o seu melhor. Mas esse caderno estaria errado.
Em primeiro lugar, o projecto deveria incluir o parecer de um arquitecto paisagista (bem, espero que não tenha incluído...). Num espaço tão grande, ele é necessário. Os arquitectos (tout court) não têm de perceber de bancos de jardim (aliás fazem-nos quase sempre sem costas), nem de ventos, nem de sol, de árvores ou de protecções. Depois, deveria ter o parecer de alguém que tivesse estudado a circulção e o uso que as pessoas fazem ou querem fazer da praça. Os arquitectos se calhar têm de perceber de circulação, mas não necessariamente em espaços tão grandes. O autor do projecto propõe uma placa que acaba com um metro de altura - para as crianças poderem cair. Não sei, fica a dúvida de tudo isto.
Onde não fica a dúvida é que o caderno deveria ter obrigado a uma consulta histórica. O que é que o Terreiro do Paço tem que ver com uma carta portuguesa do século XVI? É isso que é ser moderno? Quando começou a ser feito, já "só tínhamos" o Brasil e, quando foi acabado, com o arco, nos anos 1850, não tínhamos império nenhum que se visse (África só viria mais tarde). Qual a lógica? Como Rui Tavares especulou mais abaixo, Pombal teria inclusivamente projectado a plantação de amoreiras, como símbolo industrial. Pombal e D. José são o símbolo do recentramento português, o início da longa mas feliz fase de perda dos impérios. Pombal foi o ministro que se vendeu como defensor da economia nacional (não que eu goste particularmente disso), coisa que de facto aconteceu no século seguinte, no século em que a praça ficou finalmente pronta.
Em suma, obriguem este arquitecto a consultar um arquitecto paisagista, alguém que conheça os percursos e as vontades das pessoas que por lá passam e, para não fazer grandes erros de referência, alguém que saiba que aquilo esteve pronto apenas em meados do século XIX e que nada tem que ver com impérios.
Caso contrário, ficamos com algo para as gaivotas verem do ar - sim, num vídeo que se pode ver no "Expresso", uma das vantagens do desenho é que fica muito bonito visto do ar.
PS: depois de ter escrito isto, vi que há mais gente a pensar de modo semelhante. Ver aqui.

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quinta-feira, 7 de maio de 2009

That's all folks!




Pensei «citar» o Vasco Granja e chamar «Koniec» a este post. Mas não é verdadeiramente de «Koniec» que se trata. Desde logo porque sempre gostei mais do liberalismo dos Looney Tunes do que da animação polaca que traumatizou a minha meninice (nessa época de candura, «animação polaca» queria dizer isso mesmo). Mas sobretudo porque «Fim» é uma palavra demasiado radical. Se é verdade que se interrompe aqui a minha participação no Geração de 60, não é menos verdade que o Geração de 60 não acaba aqui. E muitos menos o Geração de 60 acaba em mim.

Desde a primeira hora que impus a mim mesmo duas regras simples para que o Geração me fizesse sentido: que o Blog continuasse a ser fiel ao seu editorial e que fosse para mim uma fonte de prazer. O Geração é e continuará a ser o lugar de liberdade que sempre foi. Mas o meu lado hedonista fala agora mais alto. O prazer foi-se. Pelo menos por agora. E com ele, afasto-me eu também.

Não sou homem de grandes sentimentalismos (ou pelo menos de públicos sentimentalismos) mas quero agradecer, emocionado, o muito que aprendi e me diverti com cada um dos meus companheiros de blog. Com os que estão e com os que estiveram. Orgulho-me muito do percurso de liberdade que fizemos em conjunto. Orgulho-me sobretudo das velhas amizades que se cimentaram e das novas cumplicidades que se geraram. Devo, em particular, uma palavra à Sofia Galvão. «À chefe», como carinhosamente sempre foi conhecida entre nós. Sem ela, sem o seu entusiasmo original, sem a sua preserverança, sem o seu sentido de dever, o Geração de 60 nunca teria sido o Geração de 60 e eu não estaria aqui hoje.

E porque a ocasião é especial, despeço-me citando um Ruben A. que tem para mim um significado muito especial: fico com a secreta esperança de que, um dia destes, ao descer a Rua do Ouro, hei de entrar «numa daquelas lojas que são misto de café, leitaria e casa de pasto», hei de pedir uma cerveja bem fresca que me saberá «pela alma» e hei de dar com todos vocês, «sentados a um canto a tomar um copo de água gelada».
Até sempre.
PN

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quarta-feira, 6 de maio de 2009

P. Rangel, M. Pinho, B. Horta e P. Maizena...

Ontem, dia 5 de Maio, na Assembleia da República, Paulo Rangel, que já fez parte do Geraçãode60, lançou o seu novo livro: “O Estado do Estado”. Um livro que recomendamos e que dá conta do esforço de alguém que, definitivamente envolvido nestas coisas da política, não quer ficar enredado nelas, antes parando para pensá-las, organizá-las e escrevê-las. É aquilo a que se pode chamar, com toda a propriedade: uma política de verdade.

Isto é tanto mais importante quando, também ontem, depois das infelizes e exorbitadas declarações de Basílio Horta sobre uma proposta que Paulo Rangel pretende apresentar à Comissão Europeia, Manuel Pinho veio defender o presidente da Agência Portuguesa para o Investimento, dizendo – e citamos – que «o líder da bancada do PSD, Paulo Rangel, tem de comer muita papa Maizena para chegar aos calcanhares de Basílio Horta.»

Ora, apesar de desconhecermos as virtudes dos calcanhares de Basílio Horta, mas fazendo fé nas palavras do senhor ministro, fomos procurar saber, em nome da igualdade de oportunidades, o que pode a papa Maizena fazer pelos pezinhos de Paulo Rangel. Eis o que descobrimos no site da Unilever:

«Com uma enorme tradição e contando com mais de 150 anos de existência, o amido de milho Maizena é um produto cem por cento natural, proveniente das melhores variedades de milho. As suas principais propriedades são o poder espessante, a confecção rápida e o sabor neutro, estando assim especialmente indicado na confecção de sopas e cremes, molhos e pratos cozinhados e ainda sobremesas e pastelaria.»

Parece, assim, estar tudo explicado. Manuel Pinho e Basílio Horta pensam que Paulo Rangel é um político igual a tantos outros que eles tão bem conhecem, pelo que é, afinal, com amizade que lhe recomendam a ingestão (no caso de Basílio Horta é mais a ingerência) da papa Maizena, por meio da qual acreditam que o candidato do PSD poderá facilmente alcançar um poder mais espesso e denso, com o que seria depois capaz de confeccionar inúmeras políticas rápidas e sem sabor – nomeadamente sopas, cremes, molhos e sobremesas adequadas a todos os gostos e às mais diferentes ocasiões –, que é justamente a concepção que estes senhores têm da política.

São essas, com efeito, as políticas do governo de José Sócrates, nomeadamente as de Manuel Pinho e as do seu Aquiles: Basílio Horta. Não são, porém, as de Paulo Rangel, como está à vista de todos e a leitura deste seu livro cabalmente mostra. Pedimos, por isso, a Paulo Rangel, que continue a comer tudo aquilo que quiser – inclusivamente leite com Nesquik e papas Cerelac e Maizena, se gostar –, mas que, na sua vida política, se mantenha como até aqui: sério, empenhado e verdadeiro. Só assim poderá vir a ter uns calcanhares suficientemente fortes, com os quais, para proveito de todos, dê um valente chuto nos rabos desta gente.

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terça-feira, 5 de maio de 2009

domingo, 3 de maio de 2009

Unicidade



O Primeiro-Ministro, José Sócrates, apoia a candidatura de Durão Barroso a Presidente da Comissão Europeia.

O candidato da PS às Eleições Europeias, Vital Moreira, disse ao Público há três dias que quer mudar a "hegemonia de direita" na UE liderada por Durão Barroso.

Resulta daqui uma contradição insanável.

Na hegemonia, as pessoas conversam.

Na unicidade, dão-se tabefes.

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sexta-feira, 1 de maio de 2009

Europeus e Norte-Americanos



Há já alguns anos calhava-me regularmente a tarefa de dar a uma classe de norte-americanos seniores uma aula sobre a história da língua portuguesa. Certa vez, numa dessas aulas, alguém me perguntou como é que eu, enquanto europeu, via os americanos.
Inesperadamente forçado a sair da rotina própria daquelas sessões, querendo dizer a verdade, mas sem ferir susceptibilidades, lá fui balbuciando qualquer coisa até que, também de repente, me lembrei de contrapor a imagem que os europeus têm dos norte-americanos à imagem que eles nos tentam dar de si mesmos.
Para tal lembrei o exemplo de McGyver, o famoso herói daquela série televisiva que, por toda a Europa, fosse legendado ou falando em espanhol e em alemão, nos mostrava aquilo que os norte-americanos queriam que nós pensássemos deles: o norte-americano é um povo cujo poder não advém nem da tradição, nem do dinheiro - coisas que que McGyver não tinha -, mas da sua criatividade e competência técnicas, através das quais o seu grande saber científico e as suas naturais virtudes morais são postas ao serviço de toda a humanidade.
Assim, de canivete e calças de ganga, sem nenhuma agenda própria para além do bem-estar material e moral da humanidade, McGyver passeava pelo mundo inteiro, nunca impondo a sua presença, antes respondendo aos pedidos e/ou aos anseios de todos (pelo menos um por episódio), salvando as pessoas e os países do medo, da ignorância e da tirania.
Ora, se bem que os europeus sejam histórica e politicamente aliados dos norte-americanos – concluí –, não acreditam ingenuamente nesta imagem que eles nos querem dar de si próprios.
Satisfeito com a minha resposta lá acabei a minha aula, respondi a algumas perguntas, arrumei as minhas coisas, despedi-me e fomos todos embora. À saída, porém, atrás da porta, ouvia vários deles perguntarem, baixinho, entre si: “Who the hell is McGyver?”

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