quinta-feira, 21 de março de 2019

O Brexit e a arimética






Haveria muito a dizer sobre o Brexit e muito já o disse no passado e muito terei eu para dizer. Mas, mais importante agora que o Brexit, é ver que instrumentos intelectuais têm os publicistas  para o interpretarem. Os  analistas políticos  dizem: O Brexit corresponde  à saída de 19 países da União Europeia. A coisa parece ser de monta. Fazemos as contas, há 28 países, parece que ficamos com 9.



Refaçamos as contas. Como se pode chegar a  tal resultado? É simples: seleccionam-se por ordem de menor dimensão económica os países da União, vão-se somando os produtos nacionais  e chega-se até 19. Não fiz as contas, mas dou de barato.



Façamos a conta de outra forma. O Brexit corresponde à saída de um país da União Europeia, se o ponto de comparação for a França. Ou corresponde  mesmo apenas à saída de 70% de um pais se o termo de comparação for a Alemanha. Afinal nem sequer sai um país, mas apenas 70% de um país. Nada de grave.



Mas, se quisermos dar mais ênfase, podemos usar como estalão os milhares de Celorico de Basto que saem da União Europeia, ou os milhões de Carrasqueiras. É uma questão de escolha. Fazer fracções à moda do merceeiro é sempre fácil;  o difícil é enunciar a sua pertinência.



O que mostra este tipo de observações? A falta de sentido crítico. É que, precisamente os que em alarme referem que saem 19 países da União Europeia, não percebem que se estão a  referir a um dos grandes factores do seu equilíbrio. A distribuição de produtos nacionais totais, mas também a distribuição dos per capita, e contínua na União Europeia. E isso é uma força, não uma fraqueza. Quer dizer que as oposições nunca podem ser rígidas.



Para além dos vários recortes não coincidirem, entre países marítimos e continentais, norte e sul, ricos e pobres, grandes e pequenos, orientais e ocidentais, existe uma distribuição continua de riqueza entre os países da União Europeia.



Já não era assim no II Reich em que a prevalência da Prússia era esmagadora, só encontrando alguma resistência na Baviera. Já não é assim, precisamente… no Reino Unido, em que o peso da Inglaterra é esmagador por comparação com a  Escócia, o País de Gales e a Irlanda do Norte.



Esta continuidade é um elemento estabilizador, exactamente porque torna as cesuras menos cortantes, as transições graduais. Em certas coisas os países de média dimensão pensam como os grandes, noutras  como os pequenos, em certas coisas os países com riqueza média per capita pensam como os ricos, noutras  pensam como os pobres.



Quando numa união, seja qual for, as cesuras são cortantes e coincidem em muitos planos, o efeito natural é a ruptura. Quando o Sul dos Estados Unidos tinha, não apenas um modo de produção, como produtos, como interesses comerciais como cultura social diferente do Norte, houve uma guerra  civil. Na União Europeia estas cesuras são múltiplas, e não coincidentes, e são sempre graduais. É um factor de coesão, não de ruptura.



Por isso, quando o leitor ouvir da próxima vez: o Brexit é como saírem 19 países da União Europeia, pode pensar, ou 70%, ou apenas um elo de continuidade, ou apenas um país fronteiriço, ou apenas… E, não tendo toda a razão, estará a ter muito boa parte dela.



Alexandre Brandăo da Veiga








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