terça-feira, 20 de novembro de 2007

Comentário em forma de post à questão escolar

Este post começou por ser uma comentário ao post anterior do Manel e à resposta do Pedro, só que tornou-se tão longo que tive de fazer o upgrade. Acho que ambos têm razão (não é uma forma de tentar precaver-me contra críticas vossas ao que vou dizer...) quanto à importância da democratização do ensino e todas as estatísticas parecem comprovar isso. O Pedro suscita, no entanto, o problema da desadequação entre o que se ensina e aprende e o que o mercado necessita e relaciona isto com a dicotomia ensino público versus ensino privado. Em parte isto é verdade (embora o ensino não deva ser apenas função das necessidades do mercado, quer porque devemos ensinar mais do que as meras competências necessárias ao mercado, quer porque as necessidades do mercado são sempre conjunturais e necessitamos de pessoas que se adaptem e mudem com elas). Na medida em que é verdade não penso, no entanto, que a resposta esteja apenas no ensino privado. O importante é co-responsabilizar escolas, alunos e financiadores pelos resultados obtidos no mercado com base na formação obtida (fazendo com que todos paguem o ensino e ganhem ou percam com o sucesso ou insucesso do mesmo). É verdade que a lógica do ensino privado leva a que este proceda mais facilmente a essa co-responsabilização mas não seria impossível obter isso no sistema público (por exemplo: um sistema de empréstimos em que as próprias universidades fossem em parte credores e cujo o pagamento dependesse, em parte, igualmente, do sucesso dos seus licenciados).
Por outro lado, em defesa do ensino público é importante lembrar que este tem uma importante função comunitária de inclusividade e de promoção de um espaço público. Confesso que não me sinto muito confortável perante a ideia de um mundo com apenas escolas privadas em que corremos o risco de criar comunidades segredadas que reproduzem sempre os mesmos valores e grupos sociais. Eu já escrevi uma vez sobre isto e chamei-lhes os mundos perfeitos: em que as pessoas vivem de acordo com os seus valores e apenas ouvem o que querem. Só que a ausência de comunicação entre estes mundos pode levar, a prazo, à destruição das condições necessárias à existência de um espaço público e à construção de uma verdadeira autonomia crítica individual (que só se consegue, verdadeiramente, em discussão/relação com a diferença; em intersubjectividade para utilizar uma expressão mais filosófica). Do meu ponto de vista é a este respeito que faz sentido discutir a relação entre ensino público e privado e não em termos de democratização e acesso ao ensino (estes objectivos podem perfeitamente ser prosseguidos através de um modelo assente no ensino privado).

2 comentários:

Anónimo disse...

Os leitores deste blogue notam a ausência de posts de Alexandre Brandão da Veiga nso últimos dias, a única razão pela qual vale pena a sua consulta. Escreva Alexandre, faz-nos falta o seu olhar culto, original, iconoclasta e luminoso

Manuel S. Fonseca disse...

O Miguel alargou bastante, e bem, o âmbito do tema que o meu post abordava. Ponto forte do seu argumentário é quando diz que o ensino não deve “ser apenas função das necessidades do mercado, quer porque devemos ensinar mais do que as meras competências necessárias ao mercado, quer porque as necessidades do mercado são sempre conjunturais e necessitamos de pessoas que se adaptem e mudem com elas”. Subscrevo.