terça-feira, 20 de novembro de 2007

Adivinha quem vem jantar



Também há vantagens na insignificância. Uma delas é que ninguém me convidou para o «tête à tête» entre o nosso primeiro e o Sr. Chávez. A desfeita não me impede de deixar duas singelas reflexões sobre o tema:

1 - O principal argumento invocado para «legitimar» o repasto é da ordem da «realpolitik»: a Venezuela é um grande produtor de petróleo e tem uma das maiores comunidades portuguesas no estrangeiro. Já o disse aqui mas repito: as «power politics» são um privilégio dos grandes e dos poderosos (como de resto o nome indica). Uma das poucas armas eficazes dos estados pequenos (sem dinheiro, sem exércitos, sem recursos naturais) é, num Mundo globalizado e altamente mediatizado, a opinião pública mundial. Portugal percebeu bem isso quando teve entre mãos o dossier Timor. Contra todas as expectativas, contra os interesses de uma potência regional rica em recursos naturais e em meios militares, Portugal fez dos princípios a sua única arma, «jogou» na mobilização da opinião pública, «utilizou» os media, e o resto da história é conhecida.

Infelizmente a coisa não fez escola. Sócrates tem esquecido a lição e gosta de brincar aos «Kissingers dos pequenitos». Recusou-se a receber o Dalai Lama mas lança-se com toda a naturalidade nos braços de Hugo Chávez, prestando-se a ser o instrumento de uma chantagem inconsequente que o Presidente venezuelano ensaia com o governo espanhol. A seu tempo perceberá a cruel transitoriedade da coisa. E que a subserviência dificilmente gera respeito.

2 - Outro dos argumentos para sustentar a pertinência do encontro é a legitimidade democrática de Hugo Chávez. Ora um mínimo de cultura política teria permitido perceber que nem só da regra democrática vivem os nossos regimes. De facto, quando falamos em «legitimidade democrática» estamos, na maior parte dos casos, a invocar uma dupla legitimidade: a democrática e a liberal. Pela simples razão de que as democracias a que fazemos normalmente referência são, de facto, democracias liberais (por oposição, por exemplo às democracias populares).

Ora, se é certo que o regime bolivariano de Chávez passa o teste da regra democrática (no sentido estrito), ninguém no seu pleno juízo defenderá que ele se submete às regras de uma democracia liberal (separação de poderes, «checks and balances», primado da Lei, liberdade de expressão, etc.). Razões bastantes para que não se pretenda emprestar-lhe uma aura de respeitabilidade que só por má fé ou ignorância se pode querer invocar.

3 comentários:

Luís Bonifácio disse...

Espero, ao menos, que exista um plano B para quando Chavéz for apeado do poder. A importância da comunidade Portuguesa na Venezuela assim o exige.

Sofia Galvão disse...

Entre as justificações oficiais e a efectiva razão do encontro bem pode ir um abismo.
Por mim, tenderia a ver o episódio de forma mais chã: Chavéz não resistiu à provocação constituída por este jantar em Lisboa, no preciso momento em que ameaça cortar com Espanha - sobrevoar o espaço aéreo ibérico para vir, de Paris, a um tête-a-tête com o primeiro-ministro português, é gesto para lhe dar algum gozo...; Sócrates, por seu turno, não terá resistido à volúpia de se ver banhado pelos holofotes que garantidamente perseguem o seu convidado - e Sócrates gosta de holofotes, como gosta dos grandes deste mundo, pelo que, ponderando tudo, não deixará que minudências caras à retórica liberal retirem brilho ou impacto ao momento.
Afinal, com o pretexto expresso do petróleo, dos Portugueses emigrados e das relações ibero-americanas, teremos um encontro que a Venezuela valorizará apenas circunstancialmente, mas que Portugal pode tender a sobreapreciar.
Com o tempo, veremos se este jantar fica para a história como uma irrelevância, um erro ou, apenas, um imenso equívoco.

Anónimo disse...

Esqueçam a nossa importancia de outrora por favor.
Realmente, apesar de serem da geração de 60 não se podem esquecer que Portugal por comparação a um passado não muito distante agora nada produz... e quem está no poder? R: aqueles que antigamente criticavam os que na altura pouco produziam!
E quem comenta o Portugal de hoje, tirando daí proveitos financeiros? R: Famíliares e amigos daqueles que pouco produziam!
Venham este e mais Chavez pois são essses que vos vão dando o vosso pão de cada dia.
O resto, o Povo português, mal formado e sem cultura, poderá um dia reagir a tudo isto, mas só quando depois de muitos pedidos mais esmolas não houver.