segunda-feira, 13 de julho de 2009

I. Sinto muito, Nuno Lobo Antunes



Não li este livro por dever de amizade. Mas tenho de denunciar publicamente que o momento em que o fiz decorreu de uma chantagem emocional indecente do autor. Ele pagará e com juros, como ele bem sabe.

Confesso que me agasta um pouco esta situação. A minha relação com as obras foi ou insuspeitada ou em desafio. Insuspeitada quando me apareceu Mozart, Wagner, Leibniz ou Homero na minha vida. Entraram sem eu perceber. Mas mais comummente em desafio: “ah, és tu o tal de Platão? Convence-me”. Sentir-me vergado por uma obra é dos maiores prazeres que pode haver, porque a justa foi dura e a vitória da contraparte merecida. Não há nenhuma humildade nisso. Só presta vassalagem o nobre.

O problema é que parto nesse caso com um pré-juízo favorável do autor. O que não é justo para mim como leitor. E me levou a fazer internamente alguns exercícios de desafio.

Não foi surpresa para mim o tom e o estilo, mas a destreza com que se instala nele. Em suma, coisa rara mas que me parece ainda importante para quem escreve, sabe escrever. Não é coisa pouca, porque apesar de tudo o texto é escrito e agradece-se que o seja bem.

A algumas coisas achei graça, por mostrarem até com ponto a vida dá voltas, entre as quais a referência a uma prima minha. Doutras gostei porque traduzem de uma forma lapidar questões que infelizmente me têm de preocupar no dia a dia.

Apenas um exemplo. Quando fala das coisas que o irritam em Portugal refere-se ao argumento para mim inepto de: “tem muita experiência”. E cita uma frase do seu pai que para mim esgota o tema: “Experiência? Um burro pode fazer andar uma nora a vida inteira. Mas nunca saberá o que é uma circunferência.”

Já citei umas trinta vezes a frase. Sempre que alguém me afirma que tem experiência apenas penso: coitadinho, nada mais tem para oferecer. Quando uma pessoa é inteligente, conhecedora, trabalhadora e honesta inventou-se um conceito que nos poupa trabalho a todos: chama-se de competente. Se se diz de alguém que é experiente apenas penso por isso: é burro, ou ignorante, ou calão ou desonesto, ou isso tudo ao mesmo tempo.

Outras podem ter graça ou não, mas são histórias vividas. Como sou um ignorante em neurociências (embora possa destrinçar o que é argumento cientifico do discurso ideológico que se constrói sobre ele) tinha esperança de aprender alguma coisa sobre neurociências. Não aprendi nada. Não é obra de divulgação científica. É obra de médico.

Sendo neto de médico sempre entendi que quem lida com a fragilidade humana tem o dever de a respeitar sem limites. Nada me provoca mais desprezo que o médico, advogado, juiz, seja quem for, que perante uma pessoa fragilizada dela abusa. Quem se pretende Maquiavel que destrua os fortes. Quem gosta de destruir fracos ou deles abusar é apenas medíocre.

E o Nuno é médico. Lembro-me dos sonhos de Jung com a figura do médico em que ele mostra o que significa profundamente ser um psicopompo, um condutor de almas. Cuidar, como diz o Nuno, ser provedor. Nesse aspecto invejo-o. Durante pouco tempo na minha vida pude ser provedor na minha profissão e bem sei o que compensa. A ficção e a poesia corteses diziam bem mais sobre o ser humano, revelam mais profundamente as suas necessidades e a sua capacidade de construir um mundo mais nobre do que o cinismo é capaz de conceber. Cínico por excelência foi Chamfort, e acabou a odiar os outros... e a sua própria pessoa. Na sua capa de sólido burguês citadino, que gosta de salientar, o autor tem mais de cavaleiro medieval do que a nossa época é capaz de ler. Talvez seja necessário um provinciano de família em curva descendente como eu para o perceber.

2 comentários:

Diogo disse...

Há até quem deseje:

No Daily Show - A nossa única hipótese como país é o Osama bin Laden colocar e detonar uma grande bomba nos Estados Unidos

Jon Stewart: Ontem à noite estava a ver o programa do Glenn Beck na Fox News. Ele estava a falar com um ex-analista da CIA, Michael Scheuer, sobre como esta Administração não nos está a proteger dos terroristas… E depois ouvi uma coisa tão demente que ia caindo…

Michael Scheuer: A nossa única hipótese como país é o Osama bin Laden colocar e detonar uma grande bomba nos Estados Unidos. Só o Osama é capaz de executar um ataque que obrigue os americanos a exigir que o Governo os proteja.

Jon Stewart: Mas que m… foi aquela? E, já agora, sabem o que é fascinante na nossa cultura? Aposto que censuraram quando eu disse merda. Porque o Governo Federal decidiu proteger-vos e aos ouvidos dos vossos filhos desse tipo de linguagem. Entretanto, o gémeo malvado do Pai Natal [Michael Scheuer]... está à vontade para propor um massacre de americanos, para conseguir apoios para o programa de segurança dele.

Jon Stewart: Pois, aquele bin Laden é um desmancha-prazeres! Quando não queremos que ele mate americanos, ele mata, e quando queremos, não mata. É um parvalhão! E quando ele detonar uma bomba na América, esperemos que não seja nas partes "boas e verdadeiras".

Vídeo

Táxi Pluvioso disse...

Dificilmente se pode comparar os portugueses aos burros pois conhecem a circunferência e outras figuras de espantar.