A universidade para agir ou para pensar
A reflexão do Miguel Maduro sobre o fazer e o pensar - e a onda de comentários "internos" que gerou - interessa-me de sobremaneira no que toca às universidades e à estruturação das licenciaturas (em particular, depois de Bolonha). A questão é saber se o plano de curso deve estar orientado para um saber mais abstracto (supostamente mais próximo das "ciências puras" e das ciências ditas "humanas") ou para um saber mais aplicado, mais concreto. A universidade deve ser uma experiência de saber ou uma preparação adequada à vida profissional (e, em particular, ao mercado de trabalho)?
Quando se diz que, em Portugal, há um desfasamento entre a oferta universitária e o mercado, pende-se claramente para a universidade como escola de formação profissional. Em detrimento, obviamente, da ideia de universidade como instituição produtora ou transmissora do saber. Parece-me, pois, que o Nuno Lobo Antunes põe bem a questão quando separa o processo de aprendizagem universitária do processo de treino ou estágio profissional. De algum modo, esta era a minha expectativa quanto a Bolonha: que reforçasse o componente teórico, cultural e universal das licenciaturas e que promovesse a aprendizagem técnica e profissional nos mestrados (ou, pelo menos, numa via possível, e plausivelmente mais frequentada, do "segundo ciclo").
Continuo convencido de que aquilo que nos diferencia na "prática" é a capacidade teórica de que dispomos. Todos aprendem a andar de bicicleta, a nadar, a conduzir, a rezar, a contra prazos judiciais (para usar um exemplo da minha área). Mas nem todos dissertam ou acompanham a dissertação sobre Platão e Kant, a especulação sobre a "natureza divina" de Cristo, a discussão (cada vez mais interessante e apetitosa) sobre o sexo dos anjos.
Defendo, por isso, um reforço da aposta na investigação fundamental e no apetrechamento teórico dos nossos universitários. Nada que impeça ou seja incompatível com uma formação profissional competente e adequada, pós ou pré-graduada.
PS- Achei curioso que o Miguel tivesse posto o assento tónico - pelo menos , em título - essencialmente na distinção pensar/fazer e não tanto na dicotomia já tradicional na filosofia pensar/agir. É que o "agir" parece-me mais vasto e compreensivo do que o "fazer"; este vem a ser apenas e tão-só uma das manifestações daquele (porventura, a mais rica e densa, por implicar um elemento voluntário ou voluntarista). A escolha do "fazer" como uma das polaridades daquela tensão dialéctica é, ela própria, tributária de uma ideologia do "fazer" (que, autopoeticamente, se refere e elege a si mesma como pólo da relação). Na verdade, muitos são os que "agem", e mais ainda os que "reagem", sem "fazer". o fazer tem sempre consequências mais
visíveis e sensíveis do que o agir - faça-se bem ou faça-se mal.
5 comentários:
porque é que os universitários hão-de desenvolver (apenas) os processos intelectuais? para os demonstrarem uns aos outros? os conhecimentos ficarão 'fechados' se ninguém se preocupar em os transmitir -- e quem deve fazer isso, se não forem os que os adquiriram? logo, a universidade tem de adoptar competências executáveis...
Esta Maria desfaz sem rosto nem contraponto. Reincidentemente.
e o que é que a inês dentinho contrapõe...realmente?
Das "competências executáveis", serão um bom exemplo os incompetentes e analfabetos funcionais e incompetentes que povoam os corredores de Bruxelas, e aos quais regiamente pagamos para ( NAO ) defenderem a industria e os interesses dos paises que lhe pagam os ordenados?
errata: que lhes pagam...
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