domingo, 6 de maio de 2007

O Tormento de Sísifo

Afinal o Jornal de Negócios, que na sua edição de 6ª nos dedicou um surpreendente artigo, andava a adivinhar qualquer coisa quando disse que o blog ainda estava morno. De 6ª para sábado, a “Geração de 60” aqueceu. A poucas horas do desfecho Sarko-Sego, com mais de 48 horas de tragicomédia camarária em Lisboa, dois posts, um do Gonçalo, outro do Pedro, fizeram disparar a temperatura.
Genericamente, mas também na especialidade, acompanho o que o Pedro disse (a condição da democracia representativa é a existência de partidos) e, sem querer relativizar ainda mais do que ele, aproveito para sublinhar que o "carácter cada vez mais corporativo e autista da classe política" e estou a citá-lo, não anda longe das pulsões corporativas e autistas que atravessam outras classes, a dos jornalistas ou a dos juízes e magistrados, para dar só dois exemplos. Os políticos são um alvo fácil – mas é bom que o sejam, até porque as suas acções têm consequências mais vastas e imediatas sobre a vida dos cidadãos.
Não acompanho é a visão apocalíptica de Portugal que perpassa no discurso do Gonçalo. O “pobre Portugal” que ele invoca era um ainda mais “pobre Portugal” quando inundou a França com mão de obra que, ao negligente e desdenhoso “regard parisien”, era baratíssima e boçal? E, sobretudo, o “pobre Portugal” de hoje não tem uma ética politica mais pobre do que o “albaniano ou cubano Portugal” que propunha o Campo Pequeno como solução política.
É verdade: a estagnação económica dos últimos anos é uma tortura pior do que a de Sísifo. Mas estamos na Europa e somos mesmo uma das portas da União, com dois fantásticos eixos atlânticos, um que a Norte nos liga aos EUA, outro a Sul fazendo ponte para o Brasil e África. Mesmo uma classe política autista há-de conseguir fazer alguma coisa com este privilegiado potencial. Sobretudo se existir uma muito menos autista classe empresarial que lhe antecipe o caminho. Estamos um bocadinho perdidos na encruzilhada? Não mais do que Colombo que, quando partiu com as suas naus, não sabia para onde ia, ao descobrir novas terras não sabia onde estava e quando regressou a Espanha não sabia donde vinha. Nem por isso a História o cumula hoje com menos honras..

5 comentários:

Gonçalo Magalhães Collaço disse...

Concordo inteiramente com dois dos pontos referidos _ embora me seja ininteligível a relação ao quanto escrito deixei no comentário ao «post» do Pedro Norton: 1) sim, a democracia representativa, nos tempos actuais, supõe a existência de partidos, como uma ditadura sempre supõe a existência de um tirano e uma oligarquia sempre a existência de oligarcas; 2) sim, Portugal viveu já mais graves horas, o PREC, a emigração, a I República, as Guerras Liberais, as Invasões Francesas, os 60 anos de domínio filipino, as Guerras da Restauração, entre múltiplos outros momentos realmente menos felizes e bem mais dramáticos.

Todavia, não obstante a indiscutível pertinência dos pontos anteriores, quanto me interessa verdadeiramente, e daí a razão destas linhas, é a tese segundo a qual Cristóvão Colombo (nome sob o qual o Almirante nunca se assinou) ter ao acaso partido, e ao acaso seguido, na descoberta do Novo Mundo. Nunca tal tese tendo lido e, por consequência, em tal tese ou possibilidade me ter sido dado alguma vez reflectir, muito surpreso e entusiasmado, realmente, fiquei. De facto, talvez seja essa a tese que verdadeiramente explica porque, na viagem de regresso, apanhada a expedição no meio de uma forte tempestade, o segundo navio haja ido aportar à Galiza enquanto o do próprio Colombo, por feliz ou infeliz acaso, a Lisboa. O que talvez explique também porque, receando voltar a perder-se em alto mar, decidido haja o velho Almirante, em consequência, regressar por terra aos domínios dos Católicos Reis, a levar-lhes a boa-nova. E o que explica ainda como, ao passar por Santarém, aí encontrando-se instalado D. João II, tão só por mera fortuna do mesmo acaso, com o mesmo haja podido ter longo encontro e conversação _ para quê, não se sabe, mas também não é isso quanto agora importa.

De facto, o importante é que, a partir de tão nova e magnífica tese, é toda uma outra perspectiva histórica que se nos abre. Bem haja Manuel.

Manuel S. Fonseca disse...

Caro Gonçalo,
Congratulo-me com o facto de, quanto a Portugal, estarmos de acordo. Falta saber o que fazer agora com esse acordo. Como reformar o sistema político e que caminhos pode Portugal seguir, nas suas escolhas económicas e culturais, para adquirir a identidade que parece hoje faltar-lhe? Os eixos atlânticos de que falei, e de que é paladino o professor Ernâni Lopes, bastam? Um repensado turismo de qualidade, conjugado com a busca de um papel relevante na pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias, estarão ainda ao nosso alcance? Mais do que diagnósticos, o que hoje falta são quadros prospectivos: quais são as propostas do Gonçalo?
Quanto a Colombo, seja ele genovês, judeu português, aragonês ou galego, estou longe de merecer as honras de inovação que ironicamente (e olhe que eu gosto de uma boa piada) me atribui. Era só uma graça. Ad absurdum. Ouvi-a a um amigo meu uruguaio e repito-a baseando-me no facto da Coroa espanhola ter pago ao Almirante uma bela viagem, por mares nunca dantes navegados, na crença de que, seguindo o percurso traçado, o grande marinheiro aportaria à Índia. Com essa convicção partiu, com essa convicção regressou. É por isso, por esse redondo engano, que a História o canta. E é por isso, por esse redondo e incensado engano, que o meu amigo latino-americano, faz dele gato sapato. Se a teoria da conspiração, de que o romance do José Rodrigues dos Santos (que sinceramente creio ser o melhor pivot dos noticiários televisivos em Portugal) faz tese, colocando Colombo ao serviço da estratégia da Coroa portuguesa, que assim teria iludido com premeditação os castelhanos (e daí a inopinada visita a D. João II), se essa teoria tem, como disse, algum vencimento histórico, então a minha “joke” é só mais uma manifestação de ignorância, ainda assim mais benigna do que a dos Reis Católicos. Mas mesmo que a conspirativa tese seja verdadeira, anuncio já e publicamente que não me eximirei a repetir a anedota que tem o seu quê de lendário. Tal como o velho John Ford disse, pela boca de um dos seus personagens de “The Man Who Shot Liberty Valance”, “This is the west, sir. When the legend becomes fact, print the legend”!

Gonçalo Magalhães Collaço disse...

Caro Manuel S. Lourenço,

Introduzir mais um comentário ao comentário do comentário, parece-me não só não fazer sentido algum como estar a transformar o Blogue numa conversa de salão para a qual poucos dos leitores estarão interessados. Todavia, não posso deixar de lhe dizer que tenho muita pena que não tenha entendido quanto realmente pretendia significar com o meu primeiro comentário. Evidentemente que não me estava a referir à ficção de Rodrigues dos Santos, obra que não li embora admitida possuir as maiores qualidades.

A questão é bem mais funda e grave: respeita à vergonhosa distorção da História dos Descobrimentos que tem vindo a ser feita por quase todos, estrangeiros e nacionais, com a nossa complacência e mesmo cumplicidade _ quando digo nossa, digo da maioria dos portugueses, historiadores licenciados em primeiro lugar.

Entre a já vasta bibliografia sobre Colombo, pode ler, entre outras obras, se tiver interesse, a «Náutica dos Descobrimentos», do Almirante Gago Coutinho, exactamente para dilucidar questões propriamente náuticas; e «Colombo, Agente Secreto do Rei D. João II», de Mascarenhas Barreto, para enquadramento histórico. Depois, claro, poderá sempre continuar a propalar a versão do seu amigo uruguaio mas, pelo menos, nesse momento, já terá consciência do que estará a fazer.

Esperando que tudo continue a correr pelo melhor na sua Guerra & Paz,

Gonçalo Magalhães Collaço

Manuel S. Fonseca disse...

Caro Gonçalo
A minha interpretação do livro de estilo da "rede" obriga-me a responder, e garanto-lhe que o faço mais com prazer do que para ter a última palavra.
Percebo, mas não o acompanho nessa cultura da queixa que o leva a repudiar "uma vergonhosa distorção da História dos Descobrimentos".
Conheço há anos as teses de Mascarenhas Barreto, até pelas tentativas de adaptação cinematográfica (que, agora, Manoel de Oliveira está a fazer). Na tese de MB admiro a engenhosa arquitectura conspirativa, mas do que nele mais gosto, é das líricas que escreveu para os fados do António dos Santos. O que volto a repetir - e é isso que justifica a "vexata" anedota - é que Colombo continua a ser conhecido e reconhecido, e até se quiser popularmente celebrado, por outras razões, estejam elas cientifica e historicamente erradas ou não.
Em suma, é em consciência que conto as anedotas que conto. Até por em consciência pensar que alguns dos problemas do mundo o mais que merecem é uma boa gargalhada.
Com estima e grato pelas sugestões de leituras.

Anónimo disse...

Colombo é GENOVES!! Mesmo que investigadores portugueses tais como mascarenhas Barreto dediquem uma vida inteira a apresentar Provas Documentais!!

Mascarenhas Barreto nao passa de um portugues!

Alias os portugueses nunca souberam navegar! Aprenderam TUDO com os extrangeiros e Portugal nunca poderia fabricar tal navegador! ;-)))

ler em : christophecolomb.blogspot.com