Agape e Eros em Nygren I
Recapitulemos, porque a
questão é essencial. Correndo o risco de me entronizar como escolástico, e bem
sabendo que as taxonomias valem o que valem neste caso, mas em nome da clareza,
esclareçamos qual a vantagem do conceito de «agape». Este permite tratar com o
mesmo conceito cinco situações diferentes. Chamemo-las de tipos. Três tipos horizontais
e dois verticais. Três horizontais: Tipo
1: o amor de Deus de Si; Tipo 2:
o amor do homem por si; Tipo 3, o
amor entre os homens. Dois verticais: Tipo
4, o amor de Deus em relação aos homens (descendente), Tipo 5, o amor dos homens em relação a Deus (ascendente).
«Agape» pode-se aplicar a
todas estas cinco situações. O que tem de específico o cristianismo é precisamente
a natureza da «agape» ser a mesma em todas estas cinco relações (sem prejuízo
da prevalência do Tipo 5 sobre os Tipos 2 e 3). Nesta matéria, com todos os seus limites (todos os temos),
NYGREN, Anders, Eros e Agape. La Nozione
Cristiana dell’Amore e le sue Transformazioni, Edizioni Dehoniane, Bologna,
2011, é essencial.
Os seus limites são basicamente
dois: concentra-se nas relações verticais (Tipos
4 e 5), praticamente descurando
as horizontais; opõe de forma demasiado cortante o «eros» e a «agape» (e também
a «nomos» de origem judaica). O seu mérito é o de mostrar a importância de
Lutero no cristianismo, ao voltar a colocar no centro o Tipo 4, o amor de Deus em relação aos homens. Uma importância cujos
limites não pode deixar de sugerir, porque precisamente o conceito de «agape»
não é expresso no pensamento de Lutero, embora a ele subtenda.
Vejamos o que diz Nygren sobre
cada uma das «agape». Sei bem que não são cindíveis. Mas é precisamente por terem
sido tratadas em conjunto que muitas vezes não se percebe a assimetria, a
diferença de peso, com que têm sido tratadas.
Quanto ao Tipo 1: o amor de Deus de Si. O esquema
do «eros» não é aplicável a Deus, mas apenas porque Deus é «eros» de si mesmo
para Plotino (p. 173). Lembra por outro lado a trindade agostiniana do amans, quod amatur e amor (p.
552).
Quanto ao Tipo 2: o amor do homem por si. A
«agape» exclui por princípio tudo o que é amor de si (p. 190). Mas para Santo Agostinho
não posso amar Deus sem me amar a mim mesmo (p. 550); é sobre o amor de si
mesmo em que tudo se funda (p. 551), mas a oposição e a coincidência entre o
amor de si e o amor de Deus é tensão permanente em Agostinho (pp. 553, 554); o
«amor sui» exprime o tipo de amor, o «amor Dei» o seu objecto (p. 555). Também
o amor de si é a regra para o amor do próximo (p. 562). O Renascimento inovou
em relação à Antiguidade na sua visão antropocêntrica, a divindade do homem não
é uma divindade carente inferior aos deuses, mas originária, com Ficino (pp.
686, 688). Lutero recusa a «agape» de si (p. 726), o amor de si é vicioso (p.
727).
Quanto ao Tipo 3, o amor entre os homens. Para
São Paulo o amor por Deus e o amor fraterno estão indissoluvelmente ligados um
ao outro (p. 124). Para Santo Agostinho esta ligação é problemática (p. 560). O
Pseudo-Dionísio percebeu o perigo de aplicar «eros» em relação aos próximos,
por isso preferiu a expressão «agape» neste caso (p. 607). Em Lutero é
essencial o amor do inimigo (p. 746), porque o amor cristão é por definição um
amor perdido, Cristo veio também pelos pecadores e não pelos justos (p. 747).
1 comentários:
Obrigado pela exposição dessa obra.
Deus o abençoe
Cláudio Manoel Martins
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