Pobreza da literatura III
Vejamos agora os temas.
Parece que se alargam, fala-se do Terceiro Mundo, a geografia alastrou. Épocas recônditas
parece surgirem da literatura. A que imensa glória assistimos….
Não me parece. Havendo
hoje o conhecimento que existe da História e da Pré-História, poder-se-ia
esperar que isto inspirasse os escritores. Mas nada surge sobre a Pré-História,
nomeadamente a europeia, os indo-europeus não inspiram ninguém, o romance histórico
quase despareceu. Salvo na perspectiva do curioso, do turista. A aristocracia,
quando aparece, é sempre na perspectiva do «eles». «Eles eram assim», «naquela
época eram assim». O ser humano do passado é visto como paisagem.
E mesmo a suposta expansão
geográfica é apenas aparente. As outras culturas são vistas sempre de uma forma
turística. Em suma, o escritor actual confunde a aventura com a sueca que comeu
quando fazia o Interrail ou o Erasmus. Tudo previamente organizado, o risco contido,
sempre com possibilidade de socorro, apoio on
line ou transporte alternativo, ou socorro institucional que acode nas
maiores aflições.
Também desapareceram a politica,
o mundo da finança, a guerra. É verdade aprecem em romances delicodoces que dão
a impressão de vivermos num mundo que sabe desvelar os seus arcanos. Mas a verdade
é que nos podemos perguntar: quantos escritores conhecem os produtos financeiros?
Quanto conhecem os mecanismos do poder?
A novela, a novelita que
se faz, quando traduz alguma verdade existencial, reduz-se assim à autobiografia,
e no pior dos casos, à autobiografia corporativa. O livro sobre o escritor em
crise de criatividade, o livro sobre o escritor na crise da meia idade, o livro
em que o escritor vê os filhos crescer, e se sente velho, o livro em que o
escritor fala do escritor…
O mundo do escritor
reduz-se cada vez mais a si mesmo. E se ainda fosse um mundo fascinante… Mas o escritor
reflecte o seu mundo pequeno burguês, que não vem da grandeza e não vai para
lugar nenhum. O seu impasse, que é mero fracasso, é anunciado em público e celebram-no
por isso. É a sua mediocridade que é publicitada e glorificada… até ser esquecida.
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