segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Apenas o sucesso

Cavaco Silva construiu o seu cv político explicando ao Povo que estava apenas programado para o sucesso. Do armazém de figos, para as boas notas do liceu de Faro; do curso superior em Lisboa, para o doutoramento em Inglaterra; de ministro das finanças de um Governo efémero, para Primeiro Ministro de um Governo íman de riquezas europeias. Contou-nos a sua história como se fosse a de uma escadinha em que a derrota das Presidenciais de 1995 foi o patamar para um novo lance. O Povo acreditou e deu-lhe a confiança do voto sentindo-se, assim, co-vitorioso de sucessivas eleições.
Nem tudo foi virtuoso. Fiel ao guião triunfador, em 1981 Cavaco recusou-se a participar no Governo Balsemão quando o PSD ficou órfão de Sá Carneiro; apressou a queda de Mota Pinto na difícil gestão do Bloco Central com o FMI, em 1985; falhou ao delfim, Fernando Nogueira, em 1995; e recusou-se a dar a cara num cartaz das Legislativas de 2005 depois de ter escrito sobre a boa e a má moeda, a propósito de um PM, também social-democrata. Assim conquistaria a Presidência, sem mais patamares. Já PR, calaria a anterior exigência, no tempo de Sócrates, para ganhar o segundo mandato em Belém. E afastaria o estorvo quando a crise se tornou legenda do Governo socialista, surgindo, de novo, como o salvador da Pátria. Ou de si próprio.

Os méritos académicos não encontraram correspondência na lisura dos comportamentos políticos. O casal Cavaco Silva foi somando pontos que, ligados entre si, formaram um desenho pouco edificante. A lamúria do Chefe de Estado sobre os seus parcos recursos perante um País na penúria; as declarações de Maria Cavaco Silva, numa visita oficial à Turquia prolongada, com os nossos impostos, para uma ida à Capadócia, «onde o meu marido sempre me prometeu trazer» e, agora, a fuga indecorosa de uma escola secundária para que a imagem imaculada do bem sucedido se confirmasse, fizeram cair o pano.

O Rei D. Carlos morreu a 1 de Fevereiro de 1908 porque se recusou a um carro e um percurso que o poupasse, afastando-o do Povo. Em 1986, Mário Soares foi de propósito à Marinha Grande provar que não há ruas proibidas para nenhum português e, ainda menos, para quem se candidata a representar a Chefia do Estado. Também Francisco Assis não deixou de se expor ao perigo de insultos e empurrões, numa acção política no Norte. Já não falo dos cercados do Palácio de Cristal, da Assembleia Constituinte ou do Patriarcado em 1975, resistentes ao que desse e viesse pela convicção e pela coragem. Em todos estes casos, a integridade física estava em causa. Não o incómodo de um apupo para o impecável corredor dos cem metros barreiras.

Cavaco não estava preparado para o seu próprio insucesso. E, como o pássaro a quem a raposa gabou o canto, perdeu o queijo.







2 comentários:

Silva Gaio disse...

Cavaco Silva não foi aluno do Liceu Nacional de Faro, mas da Escola Comercial e Industrial.
Quanto às boas notas, não sei, não vi, mas duvido pelo nível de inteligência que, finalmente, tem vindo ao cimo...

miguel vaz serra....... disse...

Já tinha saudades de ler a Inez…Sempre clara, lúcida e directa ao problema.
Cavaco sempre foi um bluff. Tão claro que eu nunca o votei. Nunca.
Assim como jamais votei esse político apelidado por colegas de partido de “vendedor de automóveis” que a Dra. Manuela Ferreira Leite sempre insistiu em chamar de Eng. Sócrates, talvez por snobeira e para ridiculariza-lo, não sei, de todas as maneiras essas subtilezas são para gente inteligente e tenho a certeza de que o não-engenheiro jamais chegaria lá e o povo menos.
Ainda hoje escrevi sobre o como o senhor não-engenheiro chegou a PM quando era já sabido que era uma fraude todo ele desde que vendia assinaturas para projectos de casas , passando pelos exames por fax em papel timbrado do Ministério onde era Secretário de estado, acabando no FreePort, nos telefonemas gravados que amigos poderosos tentaram esconder mas que afinal algo ainda se soube e vem agora a lume.
Nunca deveria ter ganho essas eleições e Portugal teria tido um futuro bem distinto com um Pedro Santana Lopes empenhado em fazer as coisas bem e com a mira de por a Banca no devido sítio, mesmo contra a escória de certo PSD e PS sob a batuta de Jorge Sampaio.
Talvez o BPN não tivesse sido roubado daquela maneira e não andássemos agora a pagar um preço altíssimo para safar as contas dos “sempre os mesmos”, a dívida não tivesse chegado a níveis pornográficos à mãos de um lunático mentiroso, as empresas criadas para os amigos mamões do loby PS não existiam nem as parcerias públicas tinham chegado onde chegaram.
Se fossemos um povo de verdade e para a verdade, “o” Sócrates nunca teria sido nem Secretário de Estado, quanto mais PM.
Cavaco não teria sido igualmente PR. Nem em sonhos.
O maior insulto que jamais nos deu foi quando disse que teríamos que nascer duas vezes para ser tão honestos como ele.
Depois de ler sobre as acções que ele e a filha compraram e venderam em tempo record com um ganho de 137 vezes mais através do tal BPN e também as permutas das casas no Algarve, fico com a sensação de que eu só nasci uma vez.
Há gente, políticos, que gostam de fazer certa parte do povo de parvos. E são, ou não os teriam votado. Mas têm que contar com alguns menos parvos.
Pois. É uma chatice.
É como Paulo Portas que tanto e bem criticou os monopólios das energias e o preço do combustível ( ia até para Espanha filmar as excursões de Portugueses a meter gasolina lá ) agora é o número dois dum Governo que não paga aos credores, tem Hospitais sem medicamentos imprescindíveis para tratamento de Cancro e uma gasolina a 1,70eu. E não diz nada sobre isso.
Extraordinário como o poder tem essa magia de calar os “incaláveis”!
Nada como ser livre para falar sempre.