Da Visão: Baton na Cueca
Em tempos, em pleno Senado Brasileiro, um político pediu a palavra, sacou de uma pilha de documentos que alegadamente seriam a prova cabal da existência de um escandaloso esquema de corrupção e gritou, a alto e bom som: «Isso aí, seus deputados, isso aí é baton na cueca!». O episódio, delicioso como por vezes é a política brasileira, voltou-me à memória, adivinha-se porquê, com o recente ressurgir do chamado «caso Freeport». Sobre o qual vale a pena escrever algumas notas.
1 – A primeira, sejamos sérios, é que ainda não estamos perante um caso de «baton na cueca». Pelo menos, e parafraseando o senador brasileiro, «na cueca do Primeiro-Ministro». A fazer fé na imprensa, a história está mal contada, «cheira mal» e está plena de contradições. Há demasiadas coincidências, demasiadas declarações comprometedoras, demasiados indícios, para que possa ser ignorada ou para que não seja rapidamente investigada. Mas para já é só fumo.
2 – A segunda é a seguinte: no longo prazo pouco interessará este caso em concreto. O que importa que fique claro, se queremos fazer alguma coisa acerca do futuro deste país, é que, mesmo que desta vez nada de ilegal tenha acontecido, Portugal criou todas as condições administrativas, processuais e legais para que a corrupção possa medrar. A burocracia, já se sabe, é a mãe da corrupção.
2 – O terceiro ponto que vale a pena registar é a excelência e a inteligência da assessoria política e de comunicação de José Sócrates. O Primeiro-Ministro tardou umas horas a reagir, mas quando o fez foi de um profissionalismo desarmante. Pleno de ironia, controlado, dir-se-ia que calmo, pediu que a justiça fosse célere mas sobretudo lembrou a coincidência entre o duplo rebentar deste escândalo e o calendário das legislativas. De uma penada, ressuscitou a tese da cabala e passou da defesa ao ataque. Em poucas palavras: resistiu ao primeiro «round» e passou a bola para o terreno kafkiano dos processos da justiça.
3 – E isso leva-nos ao quarto ponto: o país merece uma explicação sobre os «timings» deste processo. Haverá seguramente muito boas razões para que ele se arraste há tantos anos. Mas, para o comum dos mortais, é de facto difícil de perceber porque reemerge, de tempos a tempos, e sempre em vésperas de eleições. Se não há aqui uma gestão de informação bem planeada, parece. E seria bom, a bem da credibilidade da justiça, que alguém explicasse as razões de tanta coincidência.
4 – Quarta nota: tenho criticado muitas vezes a liderança e a política de comunicação do PSD. É chegada a altura de reconhecer que Manuela Ferreira Leite fez, nesta matéria, o que se espera de um líder da oposição responsável: ficou em silêncio. «A César o que é de César» e a líder do PSD tem-se recusado a comentar (pelo menos não o fez ainda à hora em que escrevo) um assunto que está ainda no domínio da justiça e sobretudo que não parece ficar por aqui. Além de formalmente correcta é a forma mais inteligente de lidar com o tema. Quando falar (se falar), Manuela Ferreira Leite fá-lo-á com uma dupla autoridade: a de quem é reconhecidamente «impoluta» e a de quem soube esperar pelos avolumar de provas que o justifiquem. Guardou para si o direito a desferir a última estocada.
5 – Mas relembro: não andemos, nós também, com o carro à frente dos bois. «Baton na cueca» é coisa séria e, até ver, ainda ninguém o encontrou.
1 – A primeira, sejamos sérios, é que ainda não estamos perante um caso de «baton na cueca». Pelo menos, e parafraseando o senador brasileiro, «na cueca do Primeiro-Ministro». A fazer fé na imprensa, a história está mal contada, «cheira mal» e está plena de contradições. Há demasiadas coincidências, demasiadas declarações comprometedoras, demasiados indícios, para que possa ser ignorada ou para que não seja rapidamente investigada. Mas para já é só fumo.
2 – A segunda é a seguinte: no longo prazo pouco interessará este caso em concreto. O que importa que fique claro, se queremos fazer alguma coisa acerca do futuro deste país, é que, mesmo que desta vez nada de ilegal tenha acontecido, Portugal criou todas as condições administrativas, processuais e legais para que a corrupção possa medrar. A burocracia, já se sabe, é a mãe da corrupção.
2 – O terceiro ponto que vale a pena registar é a excelência e a inteligência da assessoria política e de comunicação de José Sócrates. O Primeiro-Ministro tardou umas horas a reagir, mas quando o fez foi de um profissionalismo desarmante. Pleno de ironia, controlado, dir-se-ia que calmo, pediu que a justiça fosse célere mas sobretudo lembrou a coincidência entre o duplo rebentar deste escândalo e o calendário das legislativas. De uma penada, ressuscitou a tese da cabala e passou da defesa ao ataque. Em poucas palavras: resistiu ao primeiro «round» e passou a bola para o terreno kafkiano dos processos da justiça.
3 – E isso leva-nos ao quarto ponto: o país merece uma explicação sobre os «timings» deste processo. Haverá seguramente muito boas razões para que ele se arraste há tantos anos. Mas, para o comum dos mortais, é de facto difícil de perceber porque reemerge, de tempos a tempos, e sempre em vésperas de eleições. Se não há aqui uma gestão de informação bem planeada, parece. E seria bom, a bem da credibilidade da justiça, que alguém explicasse as razões de tanta coincidência.
4 – Quarta nota: tenho criticado muitas vezes a liderança e a política de comunicação do PSD. É chegada a altura de reconhecer que Manuela Ferreira Leite fez, nesta matéria, o que se espera de um líder da oposição responsável: ficou em silêncio. «A César o que é de César» e a líder do PSD tem-se recusado a comentar (pelo menos não o fez ainda à hora em que escrevo) um assunto que está ainda no domínio da justiça e sobretudo que não parece ficar por aqui. Além de formalmente correcta é a forma mais inteligente de lidar com o tema. Quando falar (se falar), Manuela Ferreira Leite fá-lo-á com uma dupla autoridade: a de quem é reconhecidamente «impoluta» e a de quem soube esperar pelos avolumar de provas que o justifiquem. Guardou para si o direito a desferir a última estocada.
5 – Mas relembro: não andemos, nós também, com o carro à frente dos bois. «Baton na cueca» é coisa séria e, até ver, ainda ninguém o encontrou.
7 comentários:
Pedro,
Não espere comentários a um post com um título destes...
Por causa do baton ou da cueca?
Não comento
Desculpem a frescura, mas acho o título politicamente muito bem apanhado.
O «baton» surge supostamente no melhor pano por causa da súbita, rara e diligentíssima competência na legal aprovação de um projecto que pedia alterações de mapas ecológicos negadas a outros mortais.
Nem a dúvida nem o benefício teríam sido dados a outros Primeiros-Ministros, com cunhas de tios e primos e rombos financeiros na empresa envolvida.
A + B + C + D dará aquilo a que se chama, em matemática pura,(como aprendi na última reunião da Nova Vaga) uma «proposição indecidível»?
Excelente a analogia... e o comentário so senador brasileiro.
O título (e a imagem!) estão fantásticos.
Inez, no nosso país será certamente indecidível - pelo menos até presecrever. Vai uma aposta?
Continuando a terrível analogia do Pedro, numa espécie de política à Clinton, digamos que baton na cueca não há... muito embora já ninguém duvide que cheira tudo muito mal.
Enviar um comentário