Dois pessimismos que são, afinal, um!
Equivocamente, uma certa forma de criticar o mundo contemporâneo é legendada como descrente, negativa ou até niilista. Convém esclarecer que assim não é.
Há dois modos de encarar o pessimismo: ou o atribuímos ao próprio homem ou o atribuímos às circunstâncias em que o homem se encontra. No primeiro caso, por exemplo, o ateísmo é um pessimismo porque não encontra para a natureza humana uma finalidade para além da sua morte o que é contrário a uma natureza que tendo a capacidade de pensar a transcendência fez da sua existência na terra a expressão dessa mesma transcendência pela introdução na sua vida individual e em comunidade de finalidades que não são naturais. No segundo caso, o pessimismo é circunstancial, devendo-se em exclusivo a uma situação que não tem natureza definitiva, e apresenta-se como a consciência de um erro em que se não pode persistir sob pena de permanecer nessa situação que não se deseja, que não augura nenhuma felicidade e que desvia o homem da essência em que se reconhece. O primeiro podemos dizer que é um pessimismo absoluto, o segundo podemos dizer que é relativo. Porém, o primeiro conduz inevitavelmente ao segundo, enquanto o segundo é precisamente um aviso que reconduz à eliminação do primeiro.
O pessimismo relativo não é, por isso, verdadeiramente, um pessimismo. Pelo contrário, acredita, não no que é motivo temporário de descrença ou desânimo, mas no que substancialmente recorre para a razão de haver optimismo.
O homem sempre viveu em situação. E em situação, aquilo que sobressai são os problemas, as condições e os limites. Aquilo de que, em situação, se tem consciência é que o processo humano é uma incessantemente luta de libertação dessa condição e limite precisamente pela superação dos problemas. A raiz humana é optimista porque há uma energia futurante que supera o erro e o mal. O erro e o mal não são absolutos. Como, em boa doutrina, ninguém fica refém de um pecado (com ou sem sentido religioso). A essência do homem está para além do erro circunstancial ou da maldade episódica, ou seja, não se reduz a eles. Então, outra é essa essência que liberta, que renova e que purifica. Ora, é no que for essa essência de liberdade, renovação e pureza que o homem se revê, não obstante existir em circunstâncias que o desviam da limpidez dessa contemplação.
A distinção entre o que se é e o em que se está é fundamental para compreendermos a natureza dos problemas que nos afligem, que nos deprimem e que nos derrotam. Sabendo que a essência não se reduz à existência e que a existência encontra a sua finalidade no acordo (amor?) com a essência teremos de nos interrogar que destino temos nós dado ao pensamento? Que esperanças pusemos nele? Ou a que descrença e relativismo o dotamos? O optimismo e o pessimismo dependem apenas de responder a esta interrogação: que possibilidades atribuímos nós ao pensamento?
1 comentários:
Conheço dois tipos de pessimismo.
Um, aquele de quem nunca teve nada e por isso não tem também razões para acreditar.
Outro, é o pessimismo de pose, de alguém que tendo tido todas as condições, de nascimento, de vida, resolve, ou decide, ser pessimista. Senta-se no café, solta umas baforadas de fumo e diz que está tudo mal!
O primeiro é um pessimismo de barriga vazia, que por isso ainda consigo compreender; o segundo, é um pessimismo de barriga cheia, e por isso inaceitável.
João Luís, se me permite, penso que o pessimismo é um luxo a que muitos de nós não se podem dar.
Veja lá se uma mulher portuguesa que depois de um dia de trabalho,vai buscar os filhos à escola, chega a casa, se não tiver empregada, tiver de arrumar a casa, tratar dos filhos,for atacada de pessimismo?
Deita-se no sofá, pega no jornal e diz mal do mundo, ficando tudo sem banho nem jantar.
Está visto, o pessimismo não é luxo das mulheres portuguesas.
Ou será de algumas: li na Visão uma entrevista de Maria Filomena Mónica, que dizia que não entrava na cozinha, que não sabia cozinhar, que essa era tarefa de empregadas.
Vi logo estar na presença de uma grande pessimista!
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