quarta-feira, 3 de setembro de 2008

O rapaz de Chicago


Tive finalmente a oportunidade de ler o artigo da New Yorker sobre Barak Obama, aquele que vinha no número da revista com a capa controversa. A capa é de facto um pouco excessiva, não tanto pelos disfarces com que Obama e a mulher aparecem vestidos, mas mais pela bandeira dos EUA a queimar na lareira. Enfim, todavia, nada de muito grave.

O que interessa mesmo é o artigo que é muito bom como quase sempre acontece com esta revista. São 18 páginas de biografia política aprofundada, com investigação junto de antigos colaboradores, leituras de colunas de imprensa de sua autoria, entre outras coisas. Esta é sem dúvida uma das melhores revistas do mundo e é nestes artigos que essa reputação foi conquistada.

O jornalista claramente arranjou motivos suficientes para não gostar de Barak Obama, enquanto pessoa. Obama aparece-nos aqui como alguém extremamente ambicioso que passou por cima de algumas coisas para avançar na rápida caminhada que o levou onde chegou hoje. Essa impressão é feita com base na recolha de algumas opiniões de ex-colaboradores que se viram deixar para trás. Parece que em muitas ocasiões teve comportamentos oportunistas. Ninguém se queixa de falta de carácter ou de algo semelhante, mas sim de uma grande ambição. Trata-se, para o jornalista, de um BUPPIE (black urban professional).

Obama define-se a ele próprio como sendo da ala “liberal” do partido já liberal que é o Democrático, algo que lhe poderia ter fechado algumas portas, sobretudo as do dinheiro. Mas não foi sempre isso. Obama foi presidente da Harvard Law Review, um cargo de enorme importância e prestígio. Parece que para conseguir essa nomeação percorreu um caminho muito estreito, satisfazendo os eleitores (de algum colégio eleitoral, presumo) à direita e à esquerda. Tudo isto ia acontecendo num ambiente em que muitas vezes Obama é referido já há algum tempo como futuro primeiro presidente negro da América.

O sucesso da ascensão de Obama teve essencialmente duas vertentes, segundo o artigo da New Yorker. A primeira foi ter conseguido ganhar para si a máquina do Partido Democrático de Chicago, um feito nada pequeno atendendo ao funcionamento da mesma. A segunda foi ter conseguido fazer uma ponte sólida entre os liberais do dinheiro, em Chicago e em outras partes dos EU, e os negros dos bairros mais problemáticos da cidade por onde foi eleito Senador.

A descrição que o artigo faz do funcionamento da política em Chicago mostra um aparelho partidário dominado por grandes caciques e com ligações muito próximas a dinheiros menos limpos. Não é propriamente a democracia na América de Tocqueville. Mas é a democracia na América. Obama, todavia, conseguiu passar por cima dos problemas mais graves e conquistar a nomeação para senador sem sujar as mãos (em Chicago a nomeação assegura a eleição). Foi a sua primeira grande vitória. Para o conseguir teve de arranjar dinheiro e fê-lo com uma facilidade inusitada, granjeando simpatias junto de alguns milionários abonados. Fez isso ao mesmo tempo que conseguia a simpatia das pessoas mais carenciadas através de um discurso convincente e também de ter conseguido levar a cabo algumas reformas, pôr de pé alguns projectos importantes, e livrar-se de políticos agarrados à máquina partidária mas menos populares.

Uma história de ascensão na máquina partidária apoiada por dinheiro e muito faro político. Ou seja, afinal é um homem normal. Só não é tão normal como os outros porque é um homem excepcionalmente inteligente. E também porque é negro. E não por acaso tudo isto aconteceu em Chicago, uma espécie de Massachusetts dos negros. 150 anos depois do fim da escravatura, não se pode dizer todavia que tenha sido cedo demais.

4 comentários:

Táxi Pluvioso disse...

Vai uma mãe chamar ao filho Barraca. Os Europeus estão entusiasmadíssimos no novo messias, que lhes trará petróleo barato e lugar no mundo.

Anónimo disse...

Caro anónimo,
O artigo e o meu post mostram bem que não é um Messias mas sim um homem político normal. É essa a conclusão principal. Vale a pena perder alguns minutos a lê-los. E, sim, os "europeus" estão fartos de Bush. Saudações.

Anónimo disse...

Deixe-me só corrigir em uma unidade a sua afirmação. Eu sou europeu e não estou farto de Bush. Como vê, há pelo menos um cidadão deste velho continente que, no que ao assunto diz respeito, pensa por sua conta e não vai em apreciações fáceis.

Anónimo disse...

Caro leitor, não me esqueci de si. Repare nas aspas por favor. Saudações.