quinta-feira, 10 de julho de 2008

Da Visão: Sinais




Na mesma semana, três casos. Comecemos pela «bola». Depois da triste figura que fizeram na UEFA, há semanas, por entre contradições e desmentidos, os senhores do futebol português continuam empenhados em mostrar ao Mundo que o país desportivo é uma espécie de Zimbabwe dos relvados. Para nossa colectiva vergonha, a Europa do futebol assiste, atónita, a um espectáculo degradante de insultos, acusações, decisões contraditórias e trapalhadas jurídicas que são, afinal de contas, um fidelíssimo retrato do profundo e venerando respeito com que os donos da bola nacionais encaram a «rule of law».
Dirão todavia os mais cândidos que o mundo da justiça desportiva não é o da justiça em geral. Será? Poucos antes desta noite das facas longas na FPF, tinha-se confirmado aquilo que todos esperavam. O celebérrimo «caso Maddie» teria como mais do que provável destino o seu arquivamento. Para trás fica uma longa lista de acusações levianas, de suspeições gravíssimas, de fugas de informação, de declarações contraditórias, de demissões. Tudo sob os holofotes impiedosos de uma imprensa nacional e internacional, muitas vezes irresponsável, que dificilmente terá deixado uma imagem muito abonatória do país e do seu sistema de justiça. E a saga promete continuar.
Para acabar a semana da justiça em beleza, José Luís Judas voltou às páginas dos jornais. O ex-autarca foi acusado, depois de deixar a presidência da Câmara Municipal de Cascais de vários crimes: abuso de poder de titular de cargo político, violação das normas de execução orçamental, burla qualificada, participação económica em negócio, prevaricação. Tenho uma opinião muito clara sobre o seu mandato à frente da Câmara. Não posso obviamente ter nenhuma sobre estes processos em concreto. Mas a acreditar na imprensa do fim-de-semana, fiquei a saber que vão ter o destino habitual nestas coisas: a prescrição está aí a um passo. E esse é seguramente o único desfecho que temos toda a legitimidade para considerar inaceitável.
A sucessão destes eventos convida a comentários irresponsáveis e justicialistas. Gostava de não enveredar por aí. Mas é igualmente insensato não dar a estes sinais a importância que eles merecem. Independentemente da razão que possa assistir a cada um dos protagonistas destes casos em concreto, a verdade é que cada um destes episódios contribui para minar um pouco mais a confiança que os portugueses têm no funcionamento da justiça. Cada um deles reforça a ideia de que vivemos num ambiente de «dois pesos e duas medidas». Num ambiente com regras viciadas. Num ambiente em que «o crime compensa». Este caldo é perigoso. Até porque não é possível deixar de acreditar na justiça e continuar a acreditar por muito mais tempo na Democracia.

1 comentários:

Sofia Rocha disse...

Sobre o desporto, três notas:
1 - Quando, nos inícios dos anos 90 passaram a ser impressos três jornais desportivos diários em Portugal, profissionais do desporto avisados, Carlos Queirós, Artur Jorge ou Jorge Araújo, por ex., declararam publicamente que a partir desse momento iríamos assistir à multiplicação de "casos" "mediáticos".
2 - Inglaterra, país amantíssimo de todos os desportos, de futebol, de rugby, críquete, corridas de cavalos, e outros, não tem jornais desportivos. Os jornais generalistas deixam as últimas páginas para tratar assuntos de desporto.Isto, num país maior do que o nosso, mais populoso, com maior poder de compra, com uma liga de futebol que enche estádios, num país que transforma o desporto num negócio muito lucrativo ( passando também pelas apostas).
3 - Em Maio, a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, organizou um curso de direito desportivo de uma semana, sob orienatação do Prof. Fausto Quadros. Tratámos matéria de contratos, de cláusulas de rescisão, de SAD´s, de justiça desportiva, federações, recursos, UEFA. Estivemos lá juristas, advogados e estudantes. Éramos poucos e não estava ninguém que diariamente emite opinião nos jornais, ou nas tv´s, nem um!
Diz bem da falta de rigor e de pudor com que se fala do que se não conhece e do que verdadeiramente move as pessoas: um desejo doentio de notoriedade e o fervor clubístico.