terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Da Política na América

Estas eleições americanas estão a revelar-se um manual sobre a política no século XXI. O mais interessante não é o confronto de ideologias mas o combate entre formas diferentes de entender a política. Do lado democrata a estratégia de Hillary Clinton é desenhada por Mark Penn (autor de Microtrends: The Small Forces Behind Tomorrow's Big Changes). Penn é alguém que acredita que a sociedade actual é uma simples agregação de pequenos interesses particulares. Numa sociedade deste tipo, fazer política é satisfazer o maior número possível desses interesses. Para quem acredita nisto, as eleições ganham-se propondo políticas que correspondam aos interesses particulares do máximo número possível de grupos. A política transforma-se quase num exercício de aritmética. Não é por acaso que Mark Penn é um especialista em sondagens e não um filósofo ou ideólogo político. Se é verdade que esta concepção pode parecer quase cínica ela não deixa de procurar responder ao que as pessoas realmente querem e reflecte o carácter crescentemente pluralista das nossas sociedades. Já a candidatura de Obama tem um coração liberal e uma estratégia republicana (em termos filosóficos). A ênfase não está nas políticas mas sim na própria noção de política. Obama acredita que ainda é possível mobilizar todos os membros de uma determinada comunidade em torno de um projecto comum. O que ele propõe é menos importante do que a forma como se propõe alcançá-lo: de uma forma inclusiva, mudando a forma de fazer política e, alegadamente, promovendo a contribuição de todos. As políticas sugeridas por Obama servem sobretudo para simbolizar a ideia de mudança e inclusividade (ideológica, racial etc.) que domina a sua candidatura. Não deixa de ser atraente que, para Obama, a política ainda pareça ser a arte de mobilizar um povo em torno de uma ideia e não uma mera arbitragem entre interesses distintos. Por outro lado, esta forma política também tem os seus riscos: é fácil manipular o ideal de uma ideia de futuro.
Do lado Republicano assistimos a um outro confronto de estratégias políticas. Alguns parecem seguir o modelo Karl Rove: as eleições americanas ganham-se mobilizando os "fieis" e não procurando conquistar os independentes. Subjacente a esta estratégia está a noção de que a política perdeu irremediavelmente interesse para uma larga margem da população. Quem decide não são os moderados (demasiadamente desiludidos ou indiferentes para serem decisivos) mas sim os mais radicais, mais fáceis de mobilizar e de fidelizar. Ganha quem levar mais dos "seus" a votar e não quem tenta conquistar os "outros". Huckabee e Romney parecem seguir esta estratégia. Falam apenas para os Republicanos e quase como se falassem para os adeptos do seu clube. MacCain, apesar de ter feito algumas concessões à filosofia Rove, é o candidato republicano que mais busca e necessita do eleitorado independente.
Estas eleições americanas são assim um laboratório sobre o possível futuro da política. Interessam as grandes ideias ou a satisfação do máximo número de interesses particulares? Ganham-se eleições ao centro ou mobilizando os extremos? Terça-feira teremos uma primeira ideia.

1 comentários:

Unknown disse...

Miguel, a minha escolha é clara: Obama é um dos fenómenos políticos mais interessantes dos últimos anos. O teu desafio obriga-me a ganhar fôlego para um post autónomo. Voltarei à política na América.