segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Não compreendo nada...

O efeito pêndulo mantém-se no futuro aeroporto de Lisboa. Depois de se ter tecnicamente descredibilizado a solução Ota, agora que Alcochete parecia tornar-se a solução preferida colocam-se em causa os estudos técnicos desta alternativa. Não faço ideia de quem tem razão nem tenho condições ou conhecimentos suficientes para ser capaz de ter uma opinião. E é aqui que está o enorme equívoco na forma que assumiu a discussão pública sobre o aeroporto de Lisboa: é paradoxal mas o que discutimos publicamente são os estudos técnicos e não as opções políticas…
Já o escrevi antes: em Portugal não somos capazes de gerir a relação entre o espaço da política e o espaço da técnica. Isto tem graves consequências para a qualidade do nosso debate democrático, quer em termos da sua racionalidade quer em termos dos mecanismos de identificação da responsabilidade política. No que concerne o aeroporto de Lisboa, em vez de discutirmos questões de engenharia, seria bom discutir as verdadeiras questões políticas que lhe estão associadas:
1º - Que tipo de aeroporto deve ter Lisboa?
2º - Como devemos estruturar os processos técnicos associados à implementação da decisão política de forma a que estes sejam credíveis e independentes?
São estas as duas questões políticas que devemos e podemos decidir enquanto cidadãos. São elas também que evitam que a técnica seja manipulada pela política e/ou que a política seja "consumida" pela técnica.

2 comentários:

Sofia Galvão disse...

Miguel, em tese, acho que tens toda a razão. Mas, em concreto, talvez nem tanto.
Na verdade, das duas questões que colocas, é a primeira que verdadeiramente ressalta. Essa é a questão política. A outra, embora importantíssima, é instrumental.
Ora, o ponto é que a assunção da questão política enquanto tal supõe que a discussão e as subsequentes respostas possam ser políticas. Ou seja, para colocar politicamente a tua questão - e, portanto, para lhe responder politicamente - importava saber para que quer Lisboa um aeroporto? Qual o perfil de operações em perspectiva e qual o horizonte do negócio aeroportuário? Que mercados desafiaremos? Com quem competiremos? Paralelamente, qual o modelo de desenvolvimento preconizado para Lisboa e o País? Queremos um aeroporto para quê? Para servir quantos? Até quando? Como? E porquê?
Já ouviste os políticos discutir isto, Miguel? Já os ouviste referenciar a questão da localização do aeroporto a qualquer uma das grandes opções políticas em equação?
E, assim sendo, não achas, Miguel, que eles bem podem ter a esperança de encontrar tais respostas numa qualquer nota de rodapé dos vários relatórios, estudos e pareceres nos quais, tão comodamente, delegam a responsabilidade da escolha?
Em concreto, Miguel, acho que nunca haverá aqui decisão política. Porque falta a possibilidade de uma discussão politicamente referenciada... Às questões básicas: um novo aeroporto, para quê?, porquê?, como?, os políticos dizem nada. Apenas e só, porque não têm nada para dizer.

Miguel Poiares Maduro disse...

Acho que estamos de acordo no essencial. Apenas divergimos quanto ao carácter político e relevância do que designas de questão instrumental. A importância política que lhe atribuo resulta precisamente da necessidade de credibilizar e separar (tanto quanto possível) o que tem carácter político do que tem carácter técnico. Só isto permitirá que a técnica esteja ao serviço da política e ajude a racionalizar o debate político. Se não discutirmos nem chegarmos a acordo sobre a natureza que devem ter os processos de decisão técnica o risco é que eles sejam entendidos como estando ao serviço da política (ou até de outros interesses) e que apenas confundam ainda mais o debate político (é isto que tem sucedido). É por isso que para mim a definição dos mecanismos de representação, independência e deliberação dos processos de decisão técnica constitui uma questão política prévia à possibilidade de depositarmos confiança na técnica. Só com essa confiança política na técnica poderemos concentrarmo-nos nas outras questões políticas que tão bem identificas.
Miguel