A grande escola de tradução de Toledo
Jornalistas, políticos e académicos celebram a grande escola
de tradução de Toledo a que devemos a tradução em latim das obras gregas por
via árabe e mostra a grande tolerância da Espanha das três religiões do tempo
da dominação muçulmana. Nada há mais a pensar a propósito, e devemos a partir daqui
apenas celebrar a «diversidade».
Se isto basta a gente bastante a mim não basta.
Vejamos com atenção o argumento. A tradução em latim de
obras árabes? E porque não a tradução em árabe de obras latinas? A resposta do
plebeu é fácil de adivinhar. É que a civilização árabe era superior à latina.
Seja. Daqui resultam duas conclusões: há civilizações superiores a outras, e
uma civilização superior não tem de perder tempo a estudar as inferiores.
Se o moderno aceita este argumento vivo bem com ele. Tomo dele
bem nota para o usar noutras ocasiões.
O segundo aspecto tem a ver com a tradução das obras gregas.
«É a tradutores de Toledo que devemos a tradução de obras gregas». Isto esquece
três coisas
1) 1) Há
continuidade de cultura grega no Sul da Itália
2) 2) Foi
o islão que partiu o Mediterrâneo e dificultou a ligação entre a cultura grega
e a latina
3) 3) Os
tradutores não eram exclusivamente muçulmanos, mas cristãos e judeus participam
activamente nesta tradução
Mas falta um elemento mais divertido. É que esta escola de
tradução de Toledo começa a ser realmente importante a partir do século XII.
Ora Toledo passa a ser cristã desde 1085. Ou seja, o dito ambiente de
tolerância e troca cultural aberto é... cristão.
Caem de surpresa os jornalistas, políticos e académicos? Não.
Os factos são-lhes incomodativos. Já decidiram que o islão é tolerante, que
contribui para a riqueza cultural da Europa e por isso em desespero irão um dia
falar da grande escola de tradução de Albarraque de Baixo sob dominação
muçulmana, mesmo que este nunca tenha tido escola de tradução, mesmo que nunca
tenha tido dominação muçulmana e mesmo que em boa verdade Albarraque de Baixo
nunca tenha existido.
Alexandre Brandão da Veiga