Existem burros no Mali?
Numa rádio pública pontifica uma senhora que
faz questão de citar pessoas de outras culturas. Se a cultura estiver longe
parece-lhe legítima, por alguma razão. Desta vez cita um músico do Mali que
pratica um género musical cuja designação se me escapa. Diz ele, cita-o ela:
este género musical é mais antigo que Bach.
O argumento pareceu-me definitivo e parece-me
bem que o dinheiro dos meus impostos vá para menorizar a Europa. Que um género
musical seja mais antigo que Bach mostra uma superioridade de alguma música do
Mali sobre a música europeia.
Mas retiremos daqui todas as consequências. Ramsés
II é mais antigo que essa música do Mali, pelo que temos uma superioridade de
Ramsés II em relação a esse género musical do Mali. Em nome de Ramsés
desprezemos pois essa música do Mali.
Pessoalmente tive vários tios bem mais altos
que Napoleão, o que, se não retira toda a glória militar a Napoleão, lhe
diminui algum lustre. Antecipemos que a lista de homens na Calábria com pénis
maiores que o de Sócrates seja bem vasta. Anula o seu valor dialéctico? Não. Mas
já podemos adivinhar que há certas situações em que Sócrates foi menos
impressionante que muitos anónimos da Calábria.
Pessoalmente, e embora não goste de dar o meu
exemplo, e durante um certo tempo, estou um pouco mais vivo que Riemann, e
confio um pouco mais nas minhas capacidades matemáticas que nas actuais dele.
É um argumento pertinente que quanto a mim
mancha a grandeza de Bach perante a inequívoca superioridade de alguma música
do Mali, de algum dos seus músicos e de uma senhora paga com o erário público.
Existem burros no Mali? Temo bem que sim. E
noutros lugares . Burras, mesmo. Mas, havendo-os noutros lugares, que me perdoe
o Mali por eu não lhe dar nisto o palmarés.
Alexandre Brandão da Veiga
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