Maldito liberalismo I
O liberalismo tem má imprensa
na nossa época. Como esta não tem grande critério, não é de se levar muito a sério
essa má imprensa. É a sina da imprensa a de não dever ser levada a sério.
A torto e a direito
fala-se do neoliberalismo, quando a ideologia dominante tem muito pouco de
liberal. Basta ver que é usurpada por potencias como a China no que lhe dá
jeito. A abertura dos mercados não é em si um feito do liberalismo. A ideologia
dominante não é liberal, nem relativista, nem aberta. É imperialista, dogmática
e visa a dissolução, a entropia. Sendo parasitária, é apenas uma ideologia de
segunda mão, como todos os «pós» e «neos».
Por isso o liberalismo
não pode ser acusado pelo que não fez. Poucos são liberais. Liberais são-no
apenas o que o são sob o ponto de vista económico, político e moral. E esses
sempre foram minoritários, seja na Europa, seja nos Estados Unidos.
O liberalismo não é anglo-saxónico.
Foi teorizado sobretudo por celtas, os escoceses, e por gente do continente
europeu, ainda ao longo do século XX. As escolas austríacas, alemãs e italianas
são muito mais relevantes na sua construção teórica que toda a literatura americana
e inglesa na matéria. Hayek, Eucken e Bruno Leone são bem mais escorados que
tudo o que Harvard ou a London School of Economics disseram sobre a matéria, já
como Chateaubriand ou o irlandês Burke ou o suíço Constant disseram coisas mais
profundas na matéria que Oxford.
Não vou, pois, tornar-me
em mais um dos acusadores do liberalismo. Vou ser apenas crítico. Em relação ao
liberalismo propriamente dito, não às suas imitações de pacotilha. E se o
liberalismo merece críticas é porque é um movimento profundo. Se as merece é porque
é um movimento feito por seres humanos. Se as merece, é porque é merecedor de atenção.
De tanto se criticar a excrescência
que é o neoliberalismo, a crítica do liberalismo enquanto tal fica em silêncio.
É esse silêncio que vou romper. E são três as críticas que tenho a fazer ao original,
que a merece, porque merece muito, e também do bom e também do mau:
a)
Em primeiro lugar, padece de uma visão
equívoca da escatologia.
b)
Em segundo, ignora a irreversibilidade.
c)
Em terceiro lugar, é etnocêntrico.
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