As fragilidades do laicismo I
Sejamos justos. Depois de
analisar as fragilidades do islão temos de nos confrontar com o instrumento que
se usa na Europa, sobretudo nos países latinos, contra o islão: o laicismo.
Instrumento sobretudo na Europa do Sul, porque a do Norte não confunde
liberdade de religião com laicismo e nunca precisou dele para instaurar a
primeira.
O laicismo é brandido
pelos franceses, mas também portugueses espanhóis e italianos para enfrentar o
islão. Será o instrumento mais adequado? Não me parece, porque, quanto mais se
brande o argumento, mais se vêem as suas fragilidades. Vejamo-las.
Em primeiro lugar, o laicismo
mente quanto à sua origem. O laicismo é filho do cristianismo. O velho «dar a
César…». Os laicos nunca se perguntam por que razão o laicismo nunca foi criado
em terras do islão, ou de budismo. Aceitam o mundo tal qual está e inventam
origens míticas. É filho do cristianismo também pelo valor que supostamente dá
ao homem. A dignidade da pessoa humana é conceito cristão. Assenta no cristianismo
porque colado a ideias eclesiásticas como a de soberania popular (Marsílio de Pádua
no século XIII), ou a votação pelo povo dos impostos que o oneram (Ockham no
século XIV). Herdeiro das chancelarias reais e imperiais, desde sempre dirigidas
por clérigos. Movimento de origem eclesiástica, quer limpar da sua História
todos os traços das suas origens.
Mas mente igualmente quanto
à sua História. A separação entre o Estado e a Igreja historicamente é em primeiro
lugar separação da Igreja em relação ao Estado. O cristianismo, de religião
tolerada, torna-se religião do império. É o imperador que convoca os concílios,
que regula o estatuto da Igreja. Com a queda do Império Romano a Igreja pode-se
finalmente libertar da tutela imperial no Ocidente. Ao longo de toda História
da Europa a luta da Igreja é contra um Estado que pretende intervir na Igreja nomeando
dos bispos (a célebre questão das investiduras), definindo os privilégios eclesiásticos,
por exemplo. Não falo de História longínqua. É nos anos de 1980, em pleno século
XX, que o Estado português renuncia ao seu direito de veto na escolha dos
papas. Se a Igreja criou uma ideologia teocrática em algumas épocas, a ideologia
regalista, galicana e outras foram igualmente criadas por clérigos contra a Igreja.
Os chanceleres imperiais que defendiam o império contra a teocracia eram
bispos, o galicanismo foi também criado por bispos franceses. Nos países protestantes
a máxima autoridade eclesiástica pertence aos príncipes, Pedro o Grande na Rússia
acaba com o patriarcado russo. A ideia de que o torno e o altar se uniram
resulta de uma solução tridentina em que o altar teve de fazer muitas concessões
ao trono com Filipe II e o seu descendente Luís XIV.
O laicismo mente quanto à
sua História intolerante e persecutória. A França revolucionária, a da III República,
Portugal da I República, o México, os regimes nazi e comunista foram tudo menos
de verdadeira liberdade religiosa. Laicismo e liberdade religiosa opõe-se. Os
regimes laicistas na sua maioria foram ditatoriais ou autoritários. Laicismo e democracia
convivem muito mal. E tenderam sempre para o cesaropapismo, ou seja, o domínio da
Igreja pelo Estado. O laicismo esconde assim a sua História violenta, intolerante,
dominadora e sufocadora da liberdade religiosa e do pensamento. O laicista
julga que já superou esta doença infantil da sua benquista ideologia. Mas é doença
de origem, é genética, e corre a todo o momento o risco de ter surtos.
1 comentários:
O Cristianismo foi a vingança das elites judaicas contra o Império Romano:
http://historiamaximus.blogspot.pt/2016/07/o-cristianismo-foi-vinganca-das-elites.html
Enviar um comentário