terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Portugal - structural difficulties, by Luís Amado


A fazer fé no Público (pág. 5), Luís Amado, ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, no seminário que ontem marcou a abertura do ano diplomático, terá confessado a dezenas de embaixadores que Portugal se adaptou mal ao choque da integração na união económica e monetária europeia.

Luís Amado terá reconhecido ainda que a rápida convergência de Portugal resultou num processo de divergência paulatino a partir da integração no núcleo duro da moeda única europeia, há dez anos.

Dito isto, Luís Amado não hesitou em assumir os problemas estruturais do país… “Um Estado pouco eficiente, uma economia pouco competitiva e uma sociedade com pouca autonomia, excessivamente dependente do Estado”.

E, assim, Luís Amado concluiu que, no momento em que a urgência é fazer face à crise, temos, afinal, um Estado com limitações e constrangimentos orçamentais inquestionáveis, uma economia em que sobressaem as fragilidades do tecido produtivo e uma sociedade que evidencia a fraqueza do tecido social.

Para enfrentar o futuro, neste quadro de especial dificuldade, Luís Amado chamou a atenção para a importância de um “acompanhamento meticuloso do desenvolvimento da crise global”. Mais: para o imperativo de “antecipar as mudanças em curso no sistema internacional no início de um longo, complexo e perigoso processo de reequilíbrio”.

Ora, ao ler – com gosto – o diagnóstico e as receitas de Luís Amado, pergunto-me: será que ainda é ministro de José Sócrates? E será que, como os seus concidadãos, ouviu a entrevista do Primeiro-Ministro à SIC? E terá ficado o quê? Incrédulo? Estupefacto? Ou já não se espanta?

É que vale a pena lembrar que o Primeiro-Ministro desprezou os riscos do sobreendividamento português (8% do PIB no primeiro trimestre de 1996, mais de 90% do PIB no terceiro trimestre de 2008), foi irresponsavelmente demagógico em matéria de investimentos públicos (esquecendo o pesadíssimo défice externo português e tentando emular os “grandes”, como a Alemanha, que tem um muito confortável superavit externo), adulterou grosseiramente os números do emprego, manipulou a referência às exportações (passando ao largo do gravíssimo desequilíbrio da nossa balança de transacções correntes), foi tíbio e fugidio em matéria de investimento estrangeiro, defendeu sem pejo a verdade da proposta orçamental…

Ah, e quanto ao tal imperativo de “antecipar as mudanças em curso…”, é bom que Luís Amado tenha ouvido o Primeiro-Ministro garantir que não é vidente! Só para que conte com isso, tendo em vista futuras alocuções diplomáticas.

3 comentários:

Sofia Rocha disse...

Sofia,
Nesse discurso o Ministro falou da importãncia do turismo. De repente lembrei-me da primeira página do Expresso que dava conta que o nosso património ameaça ruína por falta de dinheiro. Parece que o Covento de Cristo está preso por arames. Se é o turismo, porque é que não se protege o património?

Tantas dificuldades e tão estruturais que, conhecendo Sócrates, vamos todos dizer bye bye a Luís Amado, aquela terá sido a carta de adeus.

Anónimo disse...

Parabéns pela brilhante análise e parabéns também pelo seu artigo de opinião no jornal Expresso de 3/1/09, continue, Portugal precisa de pessoas assim.
Inês Pecquet

Anónimo disse...

o que é interessante verificar é que temos um ministro e uma maquina intelectual que o apoia que não fazem distinção nenhuma entre sociedade internacional, sistema internacional, comunidade internacional... Desde a publicação de Waltz acho que em 2003 (o livro é de 1979) em Portugal - numa má tradução que necessita de revisão - que o termo neo-realista (também utilizado pela escola inglesa) de sistema internacional entrou no léxico discursivo das nossas classes dirigentes. O que resultou é uma visão de que Portugal vive num sistema internacional, numa sociedade internacional e numa comunidade internacional portanto (termos que já vinham de antes). Mas predominantemente - ao que parece - num sistema internacional que também é uma sociedade e uma comunidade de quando em vez. Não se percebe o que as palavras querem dizer e de onde vêm e as visões do mundo que estão por detrás das palavras.
Por outro lado o que será que interessa a um ministro de asuntos externos discutir questões de economia internacional? Não lhe compete dar resposta a essas questões. Não compete a um estudante desses assuntos saber de economia internacional per se. Não quer dar contribuições para esse campo. Isso cabe a economistas. O que lhe competia é saber as consequencias políticas que podem resultar desse problemas da economia internacional. Discutir economia internacional é uma coisa, discutir economia política internacional é outra completamente diferente. A interdisciplinariedade é feita da da política para a economia. Não há interdisciplinariedade se se sabe apenas de economia.

O assunto é semântico. Mas por detrás da semantica estão problemas sérios. Dependência intelectual seria a palavra acertada. A maior parte da academia vive agarrada a discussões entre Atlantico e Europa que são alimentadas por um apelo a uma multidisciplinariedade anarquica. Há falta de independência identitária da disciplina e de estudo sério da mesma. Problemas de identificação de objectos de estudo e sobre o modo como os podemos teorizar.

Por todas as academias portuguesas falta dar este salto qualitativo da tradição - por muito que se deva respeitar - para a ciencia e a teorizaçao disciplinar da mesma. Mas só com crítica intelectual da tradição é que se pode fazer alguma coisa. É desse debate de ideias - científicas - que as coisas funcionam.
A educação tem um papel fundamental numa qualquer sociedade que se quer desenvolvida.