terça-feira, 4 de novembro de 2008

O candidato “wiki”


Em 2004, Howard Dean, hoje líder do Partido Democrata, não chegou a ganhar as primárias a John Kerry, mas fez história ao mobilizar milhões de dólares e milhares de voluntários através do seu site. Nesse mesmo ano de 2004, Barack Obama era eleito Senador pelo Estado do Illinois. Escassos quatro anos volvidos, um candidato outrora desconhecido não só arrasou o poderoso establishment da invencivel Hilary Clinton como irá (estamos a horas de o confirmar) prestar juramento como 44º Presidente EUA, no próximo dia 20 de Janeiro de 2009.

Já quase foi dito sobre as razões do espectacular sucesso de Barack Obama. A sua capacidade oratória, o seu carisma e capacidade de sedução, a genialidade da sua campanha, o apoio entusiástico da juventude, a vontade de mudança e a conjuntura económica. Tudo isso é verdade. Mas tenho para mim que um dos mais espectatulares sucessos de Obama está na forma como revolucionou a utilização da internet numa campanha politica. O que Dean tinha inaugurado, Obama levou a um patamar nunca visto. Nada será igual nas campanhas.

Primeiro: o impacto da internet no financiamento da campanha. Enquanto as campanhas do passado dependeram sobretudo do apoio de pequenos circulos de "wealthy and well-connected patrons", Obama recebeu donativos de dois milhões de americanos, a maior parte dos quais de pequeníssimos montantes através da internet (como apoiante registado, fui assediado semanalmente a contribuir). Esta mudança tem um inegável significado politico: a habilidade de um candidato angariar dinheiro de pequenos doadores é já um importante sinal da sua legitimidade política. A partir de agora, um candidato que não conseguir angariar dinheiro desta forma será visto como largamente dependente de grandes financiadores (e dos seus “vested interests”).





Segundo: pelo uso magistral das redes sociais (Web 2.0). Por exemplo, o numero de apoiantes de Barack Obama no Face Book atingia hoje 2,438,270 supporters. O site do candidato vai ao ponto de disponibilizar um simulador, que permite que cada um calcule o impacto da sua politica fiscal no seu orçamento familiar.

Terceiro: mais que um mero site, estamos perante uma plataforma colaborativa, aberta e descentralizada. Onde cada um pode desempenhar um papel, organizando eventos de campanha, encontrando apoiantes seus vizinhos, etc. O site de Obama não só permite como encoraja cada aderente a desempenhar um papel na campanha. Uma mobilização a uma escala sem precedentes que só o cariz descentralizado e aberto da web 2.0 permite – num mundo “comando e controle” isso seria impossivel.

Transparência, participação, poder descentralizado. O paradigma da colaboração, da criação colectiva, da “wikipedia” e do “open source”, aplicados a politica. Não é de democracia directa que estamos a falar, é de melhor democracia representativa. A web 2.0 alia três dimensões de participação, de intensidade crescente: partilha, colaboração e accção colectiva.

A lógica de rede e da rede permite menos barreiras à entrada e a emergência de uma nova liderança política. São boas notícias para a democracia. Há menos barreiras à entrada, há mais liberdade.

Acredito cada vez mais no fim do paradigma do lider político como um “rambo” obcecado com o comando e controlo, que usa o “spin” e todo o poder (real e projectado) para impor o seu rumo. Esse tipo de liderança impressiona pela sua eficácia e será sempre do agrado de alguns. Não tem sucesso nas empresas e tem sucesso limitado na política. É um modelo do passado, que cria dependências, tolhe a iniciativa, inibe a sociedade civil “não controlada”, na qual cria um lastro de cresente desconforto.

O nosso tempo pede líderes diferentes, que prefiram a “orquestração” ao “comando e controlo”. Que se vejam mais como sensores do que como magafones. Que prefiram a verdade ao “spin”.

Líderes assim são capazes de captar a imaginação, de atrair gente de todos os quadrantes, ansiosa por participar, disponível para dar o seu contributo.

Líderes assim vão dominar a política do Século XXI.

7 comentários:

Anónimo disse...

É uma vergonha eu ser o primeiro a comentar isto. Grande post! Se dúvidas houvessem da importância da presença da Web na política elas aqui estão explicadas. Isso e o facto de McCain ter afirmado que não sabia usar email. Este é o resultado, felizmente para nós, acho eu...

Anónimo disse...

E agora Dr.a Manuela Ferreira Leite????Novo ERRO. ??????????

José Luís Arnaut Bem gritou que McCain é a escolha «mais segura», " é o candidato que garante mais segurança e menos riscos", enquanto participava na Convenção Republicana na qualidade de presidente da Comissão de Relações Internacionais do PSD .

Este oráculo da inteligência, José Luís Arnaut , ainda ousava dizer: "Quando me dizem que Barack Obama tem 300 assessores para as questões de política externa, só posso concluir que não tem assessor nenhum", disse, para sublinhar a importância da preparação de quem efectivamente decide.
E este o PSD que temos.............. Já agora este oráculo quantos assessores tinha quando estava no Governo???

Perante a vitória do Obama.............. está tudo dito em relação ao PSD e á gentinha que ali pulula e que ainda por cima é presidente da Comissão de Relações Internacionais do PSD .

Unknown disse...

Diogo,
Em boa verdade o Ross Perot também já foi uma espécie de candidato wiki «avant la lettre».

Luis Melo disse...

Obama ganhou, o mundo será diferente com certeza, mas será para melhor? Esperemos que sim.

Mas á lições mais importantes a retirar destas eleições: Mudar Portugal? - uma lição a aprender

Anónimo disse...

É verdade diogo. é uma boa demonstração do poder do "we", mas também do poder de saber ceder poder. Não é qualquer um...

Anónimo disse...

Diogo, muito bom este seu post. Obrigada pela visão sempre tão incisiva e actual das grandes questões do momento. Devo-lhe a si a inspiração inaugural para o meu blog e o meu upgrade no online e, por isso, quase todos os dias me lembro de si. Especialmente nos dias de maior afluência (e influência!) no blog. Abraço enorme!

Nuno Santos disse...

Amigo Diogo,

lição de ciência política século XXI. bem hajas.

Tive a possibilidade de estar nos EUA, num estado democrata, Washington, numa cidade apaixonada por Obama, Seattle.

Na noite das eleições, fui à sede de campanha, falei com pessoas, senti o ambiente. fantástico. acredito mesmo que o mundo vai mudar, para melhor. e acredito muito na influência da web para esse desígnio.

abraço.

nuno santos