quinta-feira, 10 de julho de 2008

E o título, Martim?

A pergunta parece de brincadeira, mas é séria: se uma ideia derrapa, se uma política falha, se um Governo se angana e, por tudo isso, o país não avança, quantas novas oportunidades devem ser ainda dadas antes de se declarar a falência - ou, no mínimo, antes de se desistir de tentar e procurar novos sistemas? A resposta simples parece ser: existem as oportunidades que forem necessárias. Nunca se desiste de tentar. Muito bem: imagine-se agora esta pergunta aplicada às pessoas, uma a uma. Quantas oportunidades se lhes devem dar? Quantas vezes deve a sociedade (através do Governo) ser fraterna e tentar resgatar todos aqueles que repetidademente desperdiçam as oportunidades que lhes são dadas? Um Liberal responderia: algumas oportunidades devem ser dadas, mas tem de existir um limite que gere o incentivo certo. Pois bem, e se isso fosse verdade para um país?.

Se tudo isto fosse verdade para um país, quem pensa a política deveria perder tempo a discutir esta abordagem filosófica. E investindo nesse assunto, teria de reconhecer que quando uma sociedade se empenha em redistribuir recursos aos mais fracos, espera deles pelo menos o esforço e o engenho de os saber aproveitar. Mas Rawls explicou bem: as lotarias genética e social são implacáveis. E é essa complacência que nos justifica novas ajudas: quem desperdiça um subsídio, um passe social barato, um apoio, recebe novo incentivo, nova oportunidade. O Governo criou mesmo um programa a que chamou: Novas Oportunidades. Mas ninguém discute quantas. Discutindo, o problema deveria ser este: se uma vítima da lotaria genética e social de Rawls falhar uma oportunidade aos 15 anos, deve renovar-se aos 19 e, falhando novamente, insistir aos 22 e, correndo mal, repetir aos 27 para, perdendo-se essa derradeira oportuniadade, permitir ainda novo empurrão aos 32 e, porque não, um outro aos 36, seguindo de um penúltimo aos 40 e, claro, um final próximo dos 45 ou 50anos? Deve ou não deve? Porque se a opinião for deve, então os Governos merecem iguais direitos - quando falham, são-lhe renovadas as oportunidades. Mas isso não sucede. Isto é, aquilo que aceitamos para cada um não alargamos àqueles a quem entregámos a tutela do poder comum. Dito de outra forma: penalizamos o Governo por tentar e falhar, mas aceitamos que dê aqueles que, tentando, falham.
Pode dizer-se: mas os liberais, justamente, à esquerda e à direita, consideram que essas oportunidades têm limites. O esforço individual deve ser exigido aos que beneficiam da redistribuição. Pergunta: se Rawls estiver certo, será mesmo de limitar o número de oportunidades que se dão aos mais fracos? Não existirá uma obrigação moral de insistir, ainda que os que se ajudam despercicem tudo em bebedeiras, por exemplo? A resposta, de novom, parece simples: assim dito, sim, devem ter novas oportunidades, desde que se apertem os critérios e as malhas de exigência.
Se a resposta for esta - e não estou a sublinhar que seja - como se deveria aplicar esse pressuposto ao país, aos governos? As oportunidades devem-lhes ser dadas, para mandatos maiores onde o erro é visto como ferramenta de crescimento? Ou quando um Governo falha mais vale retirar-lhe o poder e passá-lo a outro, dizendo-lhe que o mesmo lhe sucederá se falhar alguma medida? A pergunta merece resposta?
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7 comentários:

Anónimo disse...

Mas Rawls não diz que as lotarias são moralmente irrelevantes e que é por isso que as sociedades democráticas precisam de princípios da justiça equitativos escolhidos em condições de imparcialidade? E onde é que fala em limitar as oportundades?

Martim Avillez Figueiredo disse...

Rawls nao diz que as oportunidades devem ser limitadas - isso é o desafio que lanço eu. E rawls é usado como exemplo, não como base do argumento. O que importa é tentar perceber se, numa visão liberal, as oportunidades que se aceitam dar às pessoas devem ou não ser dadas também às autoridades.

Anónimo disse...

Na visão liberal igualitária de Rawls esse problema não se coloca. Primeiro porque a justiça distributiva não se aplica às pessoas, mas à estrutura básica. Segundo, porque a estrutura básica de uma sociedade democrática distribui bens sociais primários com base em princípios da justiça como equidade. Se o procedimento for justo, então o resultado será justo.

Anónimo disse...

Se falamos de Governos, só tenho uma resposta: estabilidade de mandatos ou uso das figuras constitucionais para "reviralho" democrático.

Se falamos de pessoas, deixo a seguinte reflexão.
Um pai, dois filhos, um borguista e o outro cumpridor.
Deve o pai financiar ambos de igual modo?
E, se os recursos forem escassos, qual deve sentir primeiro o peso da crise?

Sofia Rocha disse...

Sugestão para título: Novas Liberalidades

Anónimo disse...

Sugestão liberal: um novo título.

Anónimo disse...

Novas oportunidades eternas: e a Optimus, merece mais esta opoortunidade de ser subsidiada pela Vodafone e pela PT na assimetria dos custos da terminação? Pois é Martim, a realidade é sempre mais fácil quando é abstracta...