segunda-feira, 14 de abril de 2008

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A Pobreza no Mundo

O Mundo está diferente relativamente ao que era 30 anos atrás. Uma das principais diferenças prende-se que o facto de estar mais livre politica e economicamente. Há mais democracias, há menos conflitos regionais e internacionais. Mas há também menos barreiras aduaneiras, menos controles aos movimentos de pessoas e bens e há um mercado financeiro internacional mais desenvolvido.

A acompanhar essa maior abertura política e económica, o Mundo está também a crescer a um bom ritmo. Mais importante, esse crescimento económico tem vindo a atingir países ou regiões tradicionalmente menos dinâmicas. E esse crescimento tem bases sólidas, uma vez que está associado à transformação das estruturas económicas, com o abandono de ocupações tradicionais na agricultura e o desenvolvimento da indústria e dos serviços. Tudo isso se traduz em benefícios directos para as populações afectadas, que ascendem a maiores níveis de consumo e de satisfação pessoal. Mas não chega a todos.

De facto, o Mundo está diferente também porque os pobres estão a ficar mais pobres em termos relativos e em alguns casos em termos absolutos. Os efeitos da abertura política e económica não se têm traduzido em todo lado na melhoria das condições de vida e isso é particularmente grave nas regiões mais pobres do Globo, incluindo a África entre o Sara e a África do Sul, e partes importantes da Ásia. O que se passa? Passa-se fundamentalmente que os benefícios da globalização não têm chegado a uma parte considerável da população mundial.

Este problema não é novo. Há muito que isso acontece. O que é novidade é que o problema se mantém num período de grande expansão da economia internacional, uma conjugação de factos que põe em causa algumas teorias económicas que relacionam comércio internacional, crescimento económico e convergência. Ora este desacerto entre globalização e redução de pobreza pôs em alerta alguns economistas ligados ao estudo do desenvolvimento económico e renovou a discussão sobre as formas de ultrapassar a pobreza à escala mundial.

Tradicionalmente, desde o fim da segunda Guerra Mundial e depois dos colonialismos, o combate à pobreza, sobretudo em África, tem sido feito através da ajuda externa traduzida em financiamentos dos países ricos aos países pobres, sob a sigla de ajuda ao desenvolvimento. Essas transferências financeiras podem ser feitas bilateralmente ou através de instituições internacionais, como são o caso, particularmente, do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional. Mas a verdade é que essas ajudas são agora muito questionadas, uma vez que os resultados estão abaixo do esperado.

Estas preocupações levaram à produção de três livros intimamente relacionados sobre os problemas da pobreza a nível mundial. São eles o livro de Jeffrey Sachs, The End of Poverty (2005), de William Easterly, The White Man’s Burden (2006) e de Paul Collier, The Bottom Billion (2007). Estes livros são muito diferentes e são complementares, sendo o terceiro seguramente o melhor. Sachs, o economista que todos os economistas amam odiar, escreveu um livro provocatório e voluntarista mas com alguns defeitos metodológicos sérios. Easterley, o economista que abandonou o Banco Mundial, criticando a sua acção na ajuda ao desenvolvimento, escreveu um livro em resposta ao de Sachs, num tom pessimista. Aos livros destes economistas de Nova Iorque, o primeiro director do Earth Institute, da Universidade de Columbia, e o segundo co-director Development Research Institut, da Universidade de Nova Iorque, juntou-se um economista de Oxford com uma perspectiva mais moderada e mais sensata.

Jeffrey Sachs começou por interessar-se sobre politicas de desenvolvimento quando foi convidado, em 1985, aos 30 anos, para aconselhar o governo da Bolívia para pôr termo a espiral inflacionista que o país atravessava. O plano que gizou – ou ajudou a gizar – resultou. Anos depois, com a queda do muro de Berlim, Sachs passou à Polónia e depois à Rússia, onde foi outra vez conselheiro de governos reformistas. O livro fala disso. Mas depois fala também de episódios que Sachs apresenta como semelhantes, na China e na Índia. Estas missões foram de natureza diferente, uma vez que Sachs só foi verdadeiramente conselheiro na Bolívia e na Polónia, mas a verdade é que o autor faz no livro um encadeamento entre as experiências que teve nos diferentes países, levando-nos dos mais desenvolvidos ou, pelo menos, dos que tinham mercados mais desenvolvidos, aos menos desenvolvidos. Esse percurso segue depois, segundo o autor, naturalmente, para a África, que é onde verdadeiramente o livro incide. A identificação dos problemas entre estes países, com níveis de desenvolvimento tão díspares, é uma fraqueza do livro.

Todavia, ao tratar de África, Sachs dá-nos uma impressão de conhecer os problemas, um passo fundamental no desenho das soluções.

Contiuna aqui, em breve, quando tiver mais tempo.

4 comentários:

Helena Forjaz disse...

Caro Pedro, é bom saber que se reflecte sobre este tema. Este fim de semana reparei que apenas o Público de domingo dava conta das declarações de Jacques Diouf Director Geral da FAO. Durante a semana que passou esta organização alertou para o que começa a ser um novo equilibrio das economias mundiais. O crescimento económico da China e da India repercutir-se-á em novos hábitos de consumo que obrigarão a ter em conta problemas com os países mais pobres do planeta e do seu consumo de cereais. Nestes países segundo aquela organização, a despesa com bens elementares (carne, farinha e leite)custará este ano mais 57%. Os gastos em cereais de alguns dos países mais pobres do mundo podem chegar a ser de mais 56% este ano face ao ano anterior. Como se encontrará solução para tudo isto?
Portugal, longe destas preocupações,continua a gastar os seus debates públicos, na imprensa, na televisão ou na rádio nas intrigas palacianas. É lamentavel mas já não surpreende.

Manuel Rocha disse...

Deixo duas notas á primeira parte do texto.

1.O Pedro refere que " esse crescimento ( mundial ) tem bases sólidas". Pressuponho que concordará que aquele crescimento se baseia num modelo de aprovisionamento energético assente sobre os combustíveis fósseis, certo ? Se assim é, julgo que dificilmente discordaremos quanto à falta de elasticidade do modelo e à depend~encia externa que normalmente lhe é intrinseca. Portanto, mesmo sem falarmos da questão das reservas disponíveis, como é que chega à "solidez" do processo que refere?

2. Pertencemos a uma geração formatada num esquema de raciocinio segundo o qual o "abandono da agricultura e das actividades tradiciconais" é um bem em si mesmo. Para o demonstrarmos, determinamos aprioristicamente que o mundo rural é incapaz de mudança qualitativa e compara-se o presente ( alternativo ) com um modo de vida qualquer plasmado há décadas. Pergunto: não estaria já na hora de reflectirmos outras abordagens desta temática ?

andrea disse...

Desculpem o meu pessimismo em relação o estes temas.No entanto estou tentado a dar razão ao Manuel Rocha quando este refere a necessidade de encontar uma nova forma de pensar estas questões.E que ao contrario do que se afirma no post inicial estou convicto que o actual modelo conduz irremediavelmente à conflictualidade entre as nações.
E não infelizmente não e verdade que o Mundo esteja um lugar mais pacifico.
Abraços.
Ricardo Andrea.

Anónimo disse...

É falso que haja hoje menos conflitos regionais do que há 30 anos. Qualquer estatística no-lo dirá. O número de conflitos tem aumentado sem cessar, tal como o número de vítimas (cada vez mais civis) e, ainda mais, o número de refugiados. Só que os conflitos são hoje, predominantemente, no interior das fronteiras de países, e não internacionais. Por exemplo, os conflitos no Iraque, ou no Sudão, ou na Somália, ou na Colômbia, ou no Afeganistão... todos estes conflitos armados causam imensa miséria, imensos mortos (na imensa maioria civis), e um número brutal de refugiados.

Luís Lavoura