Sofia Galvão na Antena 1 ou da denúncia dos tácitos compromissos
Acabei de ouvir a entrevista da Sofia na Antena 1 ao Pedro Rolo Duarte. Falar de Política a partir do chamado espaço público sem estar integrado na intriga dos partidos não é tarefa fácil a não ser que se faça com o sentido de responsabilidade de quem, não sendo deputado nem governante tem de pensar como se fosse, ou seja, não reduzir a sua intervenção a slogans irrealistas e de puro exibicionismo.
Talvez um dos pontos programático mais relevantes tenha sido o de desmistificar a ideia que se tem tornando corrente e limitadora de que os partidos do “centrão” se digladiam pela ocupação do espaço político do outro, esvaziando, assim, temporariamente (ainda que o desejem permanentemente), as oposições. A Sofia identificou o ponto da coincidência quando referiu que ambos identificam o problema e ambos dão as respectivas respostas de igual modo. Aqui está uma sugestão para a nova potencial liderança do PSD: sair do ciclo vicioso e construir um novo discurso de causas, necessidades e respostas para o futuro, que não vá só a reboque dos tempos, mas pretenda construir um novo tempo. Ou seja, alterar a dicotomia Estado Social e Desenvolvimento económico, social e político. O modelo social da chamada esquerda é, sobretudo, baseado no materialismo ideológico e, por isso, reduz-se à sociologia e à economia, apresentadas como ciências que esgotam a realidade da existência humana. Morto o indivíduo, emerge o ser social e genérico em nome do qual o igualitarismo socialista se deve bater. Ora, um novo discurso deve acima de tudo descolar-se desse condicionamento ideológico dentro do qual ninguém se entende nem tem argumentos para se diferenciar.
Num outro ponto, Sofia Galvão retomou a questão da liberdade de intervenção na vida política, reafirmando o franquear das portas pelas estruturas obedientes e seguidistas dos partidos políticos à sociedade civil. Está identificado este fechamento. Quem tem medo da democracia fecha-se numa imitação de democraticidade e limita a intervenção de quem não é seguidista, nem obediente, e pode por em causa os poderes instalados. É típico dos fracos. Mas, posto o problema e devidamente identificado, pergunta-se: como mudar este vício? A verdade é que na política que temos, líderes e prosélitos, ouvem da sociedade civil estas críticas mas não pensam em mudar nada na substância. Pensam, isso sim, em como esvaziar esta consciência através de propaganda política e recorrendo a chavões como o de que em democracia os partidos são estruturas abertas à participação de qualquer cidadão e que, por isso, ninguém tem a sua liberdade de intervenção cerceada. Não sei se esta não é uma das tragédias da política, ou seja, o facto de o poder deter uma operacionalidade sobre o real que lhe permite sempre manipulá-lo sem se beliscar. Há uma encenação constante pelos políticos que estão sempre suportados numa dialéctica mistificadora e, por isso, viciada, que lhes permite, estando no poder, gerir a sua própria perpetuação ou renovação. A partilha do poder é sempre entre os mesmos. E esse é, também, o seu tácito compromisso. Pelo menos, visto de fora.
3 comentários:
Também ouvi com atenção a entrevista da Sofia Galvão. Concordo com o enunciado das questões, mas sobretudo admiro a posição desassombrada, com que, com realismo e clarividência, abordou as questões da ( quase) impossibilidade de participação na vida partidária e pública e da ( falta) de liberdade dessa mesma participação.
Quanto ao diagnóstico, bem feito por João Luís Ferreira, do fechamento e de como mudar o vício, penso que poderá, haver no essencial quatro repostas possíveis:a desistência pura e simples; a tentiva de fundar um novo partido ou movimento( por ex. Helena Roseta); entrar nos partidos sem fazer alarido e depois, de dentro emergir como "diferente"; ou, por último, afirmar a diferença, ab initio, propor um novo discurso no contexto do que existe. Esta última posição é a mais trabalhosa, a mais penosa para quem a escolhe, porque é aquela que suscita mais anticorpos, mas a única que verdadeiramente poderá a longo prazo dar resultados para os partidos e para o País. Ninguém duvida que a Sofia Galvão escolheu a última.
Oiço, varias pessoas darem a Dra. Manuel Ferreira Leite, Como tábua de salvação do P.S.D, quantos já não passaram por essa falsa crença? no entanto penso que a historia mostra que poucos foram capazes de tal realidade.
Também a Sofia Galvão nos deixou a ideia que essa será mais umas candidatura com tal fim…!
E, será?
Do que reza a história, quando Cavaco apareceu, ninguém tinha prometido nada!
No entanto foi o que se viu, julgo que o melhor estadista da historia do, P.S.D.
Deixem a razão ter razão….
Rodrigo Oliveira
Também ouvi a entrevista e foi de uma serenidade e acutilância muito interessantes. É bom ouvir falar de política, não descomprometido, mas distanciado.
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