terça-feira, 4 de março de 2008

I. L'Empereur Fréderic II, Ernst Kantorowicz, Gallimard, 2000


Confesso que sempre desconfiei da “ciência” política. Tendeu sempre a aproveitar material histórico para fazer tipologias, que podem ser necessárias para orientar o discurso, mas acabam por ser sempre empobrecedoras. A técnica é bem conhecida. Comprime-se a realidade humana até se conformar como caricatura para mais facilmente a criticar.

Um delas é a ideia da poliarquia medieval. Haveria uma época chamada Idade Média em que havia poliarquia, em síntese, fragmentação de poderes. Ficamos satisfeitos, a coisa parece clara.

No entanto, a que se oporia esta poliarquia? Para começar ao tão consabidamente centralizado império romano. Mas surge aqui novo problema. Vejamos o Alto Império. Não é preciso esforço de erudição, mas apenas um pouco de raciocínio. Cristo anda de Herodes para Pilatos. Nasceu no tempo de um outro rei Herodes. E no entanto, a Palestina, como a Síria em geral, fazia parte do império romano. A contradicção é evidente. O império seria centralizado, mas havia reis dentro desse império. O que é verdade para a Palestina é-o igualmente para todo o Levante, para o Norte de África, para reinos menores da Península Ibérica. O império romano era poliárquico então.

Só no Baixo-Império se atinge com o dominado a centralização. Mas Diocleciano, o centralizador por excelência, a primeira coisa que se lembra de fazer é criar... uma tetrarquia.

A poliarquia medieval opõe-se igualmente à centralização do Estado moderno. Tirando o caso francês, em que o discurso unificador esconde milhares de pequenos poderes regionais, a verdade é que no Estado moderno, tenha ou não a forma regional ou federal, os poderes se distribuem por sectores geográficos, económicos, sociais.

O sonho tipológico de certa dita ciência política torna-se mera quimera.

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