Incompatibilidades?
Primeiro foi o ex-director do Jornal de Negócios que assumiu funções na Fundação EDP. Agora é o ex-director do Diário Económico que é convidado para um cargo de grande responsabilidade no universo Sonae. Se lhes juntarmos as dezenas de jornalistas que «enxameiam» os gabinetes de marketing e comunicação de boa parte das grandes empresas do país ficamos com uma boa ideia da realidade que constituem as relações perigosas entre o jornalismo e o poder económico.
Provavelmente os exemplos citados não se explicam por outra coisa que não seja a competência dos jornalistas em causa. Mas à mulher de César....
Não terá chegado a hora de os jornalistas estabelecerem, em sede de código deontológico ou de qualquer outro instrumento de auto-regulação, algumas incompatibilidades ou períodos de nojo que evitem que se alastre a toda classe um clima de suspeição que não é saudável nem para o jornalismo nem para a democracia? Ou será que as incompatibilidades só ficam bem aos outros?
3 comentários:
O tema é altamente pertinente (independentemente do pretexto próximo, já que admito que os dois citados sejam bem menos problemáticos do que muitos outros, convenientemente mais anónimos, que por aí andam sossegados). Mas eu, exactamente porque concordo com a premência da discussão, tenderia a propor solução diferente.
A um regime de incompatibilidades, prefiro - por princípio - o registo de interesses. A sério, evidentemente. Um sistema transparente, objectivo, rigoroso e exaustivo de registo de interesses. Não os ensaios tíbios que conhecemos, próformas para descansar a nossa consciência colectiva, sem escrutínio e sem consequência. Uma coisa à inglesa. À medida de uma sociedade madura.
Em Inglaterra, aliás, para além dos políticos - relativamente aos quais basta uma visita ao 'site' do Parlamento para perceber o abismo cultural que nos separa... -, também o caso dos jornalistas é exemplar. Quanto a estes, e sem surpreender, naturalmente, especiais exigências envolvem os jornalistas económicos e financeiros. Paradigmática é, nesse aspecto, claro está, a BBC, cuja 'magna carta' vale a pena conhecer: http://www.bbc.co.uk/guidelines/editorialguidelines/documents/moreguidancefinancialjournalismrevised27thJune1.doc.
Por mim, repito, iria por aqui. Dos jornalistas aos políticos. Até porque, quanto a estes, muitos dos disparates que feriram de morte a qualidade e o nível dos protagonismos começaram ou entroncaram nesta sanha das incompatibilidades. Com ela, e por força dela, dispensou-se gente válida e recrutou-se a nata dos aparelhos (já que um pé no desemprego sempre garante a compatibilidade!). Paralelamente, numa implicação que não é menos grave, negligenciou-se o registo de interesses (já que a boa consciência democrática se foi respaldando no regime das incompatibilidades...).
Enfim, boa matéria para debate. E, como se vê, para algumas divergências.
Caro Pedro Norton,
Concordo muito mais com o comentário da Sofia Galvão do que com o seu. O registo de interesses é mais coerente, para além do facto que o ponto inicial de entrada (isto é o jornalista passa pelo sitio X, Y, Z) dos jornalistas em causa é irreprensivel e sabemos nós que um lugar de direcção já é um misto de jornalista e de "gestor".
Entendo mais preocupante, porque menos conhecido, os que vão e vêm de lugares ministeriais para o jornalismo.
Concretizando: o registo de interesses é mais importante, a classe jornalistica não é diferente dos advogados (que se FAZEM as duas actividades e que como há sigilo, bem sabemos se têm ou não interesses diversos) e temos que pensar numa coisa fundamental, que Deputados queremos? Uma equipa amorfa, recheada de eunucos partidários?
Porque com o que se paga, a nivel local ou nacional, é o que teremos, se a sanha persecutória continuar assim...
Caros Sofia e JMO,
Não estou, no essencial, em desacordo convosco. O regime do registo de interesses tem de facto ínumeras vantagens sobre o regime das incompatibilidades. Mas não serviria para resolver nenhum dos problemas com que ilustrei o meu post. Por uma razão simples: não se pode fazer o registo de interesses a anteriori. E a única maneira de resolver o problema é mesmo impôr (numa base de auto-regulação, repito) um período de nojo. Da mesma maneira que se impõe identico período a um ministro sobre as empresas que tutelou.
Im abraço,
PN
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