Escutas e Atávicos Receios
A designada questão das «Escutas», em particular no que respeita aos designados «Serviços de Informações», tem feito correr muita tinta nos últimos tempos. De súbito, parece não haver por aí um grupo de pessoas que mais terá a fazer do que divertir-se a escutar 10 milhões de portugueses para descobrir as suas fraquezas, morais sobretudo, de forma a reconduzi-los, seja por que meios for, a uma recta e sã vida moral. Será mesmo essa a questão?
Raymond de Bequelle (1968)
Não, essa não é, como é evidente, a questão _ muito embora, pelo modo como surge discutida nos meios de comunicação, quase pareça ser, seja por receios atávicos de uma qualquer nova PIDE, seja por completa incompreensão, segundo se nos afigura, do que poderá verdadeiramente estar em causa: eficácia dos Serviços de Informações; Ordenamento Jurídico e concentração de poder.
No que respeita aos Serviços de Informações, deve ser tida em atenção, antes de mais, a posição geográfica de Portugal e as consequências daí resultantes em termos de posição estratégica de entrada na Europa e interligação com terceiros continentes e respectivas vulnerabilidades daí decorrentes.
Em primeiro lugar, Portugal encontra-se, como qualquer outra nação do mundo actual, ameaçado por actos perpetrados pelos mais variados Grupos de Crime Organizado, sejam Grupos Terroristas, Grupos de Narcotráfico, Grupos de Tráfico de Seres Humanos, Grupos de Tráfico de Armas ou de Falsificação de Moeda, para nomear apenas alguns dos casos mais graves e evidentes, sem irmos mais longe.
Hoje, como é natural, as atenções tendem a concentrar-se nas ameaças terroristas e a reacção imediata é julgar não constituir Portugal, seja para que grupo terrorista for, um alvo principal. Afinal, não se encontram em Portugal nenhumas das tensões que, usualmente, são dadas como causa desses mesmos actos. Temos Comunidade Muçulmana perfeitamente integrada, não sofremos de quaisquer problemas de reivindicações separatistas regionais, mesmo as comunidades de novos imigrantes, possuindo um fundo cultural semelhante ou, pelo menos, com a mesma raiz, tampouco oferecem uma particular preocupação, embora, como é evidente, aqui e ali não deixem de surgir ou suscitar dificuldades e problemas.
Para além disso, dada, uma vez mais, a posição geográfico-estratégica de Portugal e a sua atitude, em geral, mais aberta, reconhecendo o seu valor como eventual base de recuo, mais razões encontram ainda aqueles que defendem a tese de improbabilidade de algo suceder em Portugal exactamente por razões estratégicas de preservação dessa mesma capacidade oferecida pelo nosso território.
Contudo, reconhecendo também as crescentes dificuldades de operação encontradas em outras paragens, não menos defensável será igualmente a tese segundo a qual, exactamente por isso, à medida que o tempo passa, mais e mais aumentam as probabilidades de algo suceder, por facilidade de operação, no território nacional.
Pessoalmente, podemos estar mais de acordo com a primeira tese mas, em termos institucionais, i.e., do ponto de vista do Estado, constituindo uma das suas primeiras e mais importantes obrigações a defesa dos cidadãos, não se afigura aceitável que, por ingenuidade, incúria ou o que for, descurada seja qualquer possibilidade, por mais remota que seja.
Nesse enquadramento, os Serviços de Informações assumem e desempenham, como é óbvio, uma tarefa determinante, decisiva, crucial. Assim, tendo em consideração a importância das Escutas (dito na gíria, capacidade COMINT, ou seja, intercepção de comunicações humanas), tendo em vista a realização, com plena eficácia, da sua missão, não se entende, compreende ou aceita como tal capacidade lhes pode ser ou estar vedada.
Todos sabemos como é suposto o Estado ou Governo ter nascido, como é classicamente referido e aceite, a partir do momento em que os cidadãos, exactamente em nome de uma desejada paz, procurando ultrapassar a fase do «homem lobo do homem», da guerra de todos contra todos, decidiram e aceitaram abdicar de alguma da sua «liberdade» individual, outorgaram ao mesmo Estado ou Governo o direito exclusivo de uso da força como forma de coacção necessária à preservação dessa mesma paz.
Poder-se-á, assim, dizer-se encontrarmo-nos num momento em que aos cidadãos é pedido nova abdicação de uma parte da sua «liberdade» em nome de um acréscimo de segurança, defesa e preservação da referida paz?
Independentemente do entendimento do conceito de «liberdade» aí expresso, não cremos ser essa a situação nem essa a questão. Haverá, por certo, quem entretanto reclame pelos «direitos, liberdades e garantias» constitucionais mas, neste ponto, encontrando-nos já em domínios de Ordenamento Jurídico, a adequada solução não deixará de ser encontrada, seja chamando um Juiz à supervisão ou autorização das referidas capacidades COMINT, seja qualquer outra, tanto mais quanto muito distinta cousa são Informações e Investigação Criminal e, como é evidente, ninguém medianamente inteligente as irá confundir, não se justificando, por consequência, atávicos receios nesse particular, como por vezes parecem surgir.
Reatará talvez uma terceira questão, menos debatida, de algum modo correlacionada com a anterior, a merecer todavia não menor atenção, qual seja a da possível ou já real concentração de poderes, ou seja, concentrar numa mesma figura, mais exactamente, numa mesma pessoa, a tutela das Polícias, Investigação Criminal e Serviços de Informações.
A terceira questão afigura-se-nos ser, de facto, aquela que poderá justificar, neste momento, alguma preocupação e, por consequência, maior debate. Contudo, estando em causa questões, sérias, profundas e graves de Segurança e Defesa nacionais, importará tudo isso discutir, sim, mas sem falsos nem atávicos preconceitos político-emocionais.
No que respeita aos Serviços de Informações, deve ser tida em atenção, antes de mais, a posição geográfica de Portugal e as consequências daí resultantes em termos de posição estratégica de entrada na Europa e interligação com terceiros continentes e respectivas vulnerabilidades daí decorrentes.
Em primeiro lugar, Portugal encontra-se, como qualquer outra nação do mundo actual, ameaçado por actos perpetrados pelos mais variados Grupos de Crime Organizado, sejam Grupos Terroristas, Grupos de Narcotráfico, Grupos de Tráfico de Seres Humanos, Grupos de Tráfico de Armas ou de Falsificação de Moeda, para nomear apenas alguns dos casos mais graves e evidentes, sem irmos mais longe.
Hoje, como é natural, as atenções tendem a concentrar-se nas ameaças terroristas e a reacção imediata é julgar não constituir Portugal, seja para que grupo terrorista for, um alvo principal. Afinal, não se encontram em Portugal nenhumas das tensões que, usualmente, são dadas como causa desses mesmos actos. Temos Comunidade Muçulmana perfeitamente integrada, não sofremos de quaisquer problemas de reivindicações separatistas regionais, mesmo as comunidades de novos imigrantes, possuindo um fundo cultural semelhante ou, pelo menos, com a mesma raiz, tampouco oferecem uma particular preocupação, embora, como é evidente, aqui e ali não deixem de surgir ou suscitar dificuldades e problemas.
Para além disso, dada, uma vez mais, a posição geográfico-estratégica de Portugal e a sua atitude, em geral, mais aberta, reconhecendo o seu valor como eventual base de recuo, mais razões encontram ainda aqueles que defendem a tese de improbabilidade de algo suceder em Portugal exactamente por razões estratégicas de preservação dessa mesma capacidade oferecida pelo nosso território.
Contudo, reconhecendo também as crescentes dificuldades de operação encontradas em outras paragens, não menos defensável será igualmente a tese segundo a qual, exactamente por isso, à medida que o tempo passa, mais e mais aumentam as probabilidades de algo suceder, por facilidade de operação, no território nacional.
Pessoalmente, podemos estar mais de acordo com a primeira tese mas, em termos institucionais, i.e., do ponto de vista do Estado, constituindo uma das suas primeiras e mais importantes obrigações a defesa dos cidadãos, não se afigura aceitável que, por ingenuidade, incúria ou o que for, descurada seja qualquer possibilidade, por mais remota que seja.
Nesse enquadramento, os Serviços de Informações assumem e desempenham, como é óbvio, uma tarefa determinante, decisiva, crucial. Assim, tendo em consideração a importância das Escutas (dito na gíria, capacidade COMINT, ou seja, intercepção de comunicações humanas), tendo em vista a realização, com plena eficácia, da sua missão, não se entende, compreende ou aceita como tal capacidade lhes pode ser ou estar vedada.
Todos sabemos como é suposto o Estado ou Governo ter nascido, como é classicamente referido e aceite, a partir do momento em que os cidadãos, exactamente em nome de uma desejada paz, procurando ultrapassar a fase do «homem lobo do homem», da guerra de todos contra todos, decidiram e aceitaram abdicar de alguma da sua «liberdade» individual, outorgaram ao mesmo Estado ou Governo o direito exclusivo de uso da força como forma de coacção necessária à preservação dessa mesma paz.
Poder-se-á, assim, dizer-se encontrarmo-nos num momento em que aos cidadãos é pedido nova abdicação de uma parte da sua «liberdade» em nome de um acréscimo de segurança, defesa e preservação da referida paz?
Independentemente do entendimento do conceito de «liberdade» aí expresso, não cremos ser essa a situação nem essa a questão. Haverá, por certo, quem entretanto reclame pelos «direitos, liberdades e garantias» constitucionais mas, neste ponto, encontrando-nos já em domínios de Ordenamento Jurídico, a adequada solução não deixará de ser encontrada, seja chamando um Juiz à supervisão ou autorização das referidas capacidades COMINT, seja qualquer outra, tanto mais quanto muito distinta cousa são Informações e Investigação Criminal e, como é evidente, ninguém medianamente inteligente as irá confundir, não se justificando, por consequência, atávicos receios nesse particular, como por vezes parecem surgir.
Reatará talvez uma terceira questão, menos debatida, de algum modo correlacionada com a anterior, a merecer todavia não menor atenção, qual seja a da possível ou já real concentração de poderes, ou seja, concentrar numa mesma figura, mais exactamente, numa mesma pessoa, a tutela das Polícias, Investigação Criminal e Serviços de Informações.
A terceira questão afigura-se-nos ser, de facto, aquela que poderá justificar, neste momento, alguma preocupação e, por consequência, maior debate. Contudo, estando em causa questões, sérias, profundas e graves de Segurança e Defesa nacionais, importará tudo isso discutir, sim, mas sem falsos nem atávicos preconceitos político-emocionais.
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