Plebeus e Elitistas
Outra machadada dialéctica na minha vida. Leitor e admirador de Scruton, descubro que lê-lo, e agora editá-lo, foi pura perda de tempo. Quem, elevando-me de arrasto lá para o céu, “somewhere among the clouds above”, me fez ver cá em baixo a dura realidade, foi o Alexandre, meu camarada de blog, que em quatro vigorosos posts lhe criticou laboriosamente as teses do nostálgico e, julgava eu, belíssimo “England, an Elegy”.
Estou certo de que admiradores mais fiéis e obstinados se vão dispor a terçar argumentos. Mas eu li, percebi e não me vejo a passar por essa vergonha. O motor imóvel da tese da Alexandre não dá margem a discussões: Scruton tem mesmo um problema congénito. Plebeu como é, “falta-lhe –e estou a citar – a elevação de vistas que só pode ter quem nasceu nas alturas.” A fulgurante validade sociológica, filosófica e científica deste autêntico “motor imóvel”, emudece qualquer discussão.
Confesso que aquele impensado classista me recorda, mutatis mutandis, alguns deliciosos e gloriosos episódios dos tempos dos “amanhãs que cantam”. Coisas do meu esquinado passado esquerdista. Lembro-me de que a introdução de algum módico de racionalidade no desvario ditatorial do proletariado era sempre contrariado com essa incapacidade de “elevação de vistas”que a burguessíssima origem de classe me bloqueava e a que só os operários de todo o mundo (e os camponeses na China) poderiam alcandorar-se. Todos “nascidos na alturas”, bem entendido. Ou de como as teorias das elites e a marxizante visão da luta de classes são bons espíritos dispostos a alguma carnal convivialidade...
Longe de mim, qualquer intenção polemizante. Os posts do Alexandre são um refrigério estimável, ainda e quando nos levam mais pelo vale das sombras do que pelo “tumult in the clouds” do velho poeta (aristocrata?) irlandês. E, no fundo, as teses do plebeu metido a elitista que é Roger Scruton são, como tudo o que se escreve, “ficções”.
Estou certo de que admiradores mais fiéis e obstinados se vão dispor a terçar argumentos. Mas eu li, percebi e não me vejo a passar por essa vergonha. O motor imóvel da tese da Alexandre não dá margem a discussões: Scruton tem mesmo um problema congénito. Plebeu como é, “falta-lhe –e estou a citar – a elevação de vistas que só pode ter quem nasceu nas alturas.” A fulgurante validade sociológica, filosófica e científica deste autêntico “motor imóvel”, emudece qualquer discussão.
Confesso que aquele impensado classista me recorda, mutatis mutandis, alguns deliciosos e gloriosos episódios dos tempos dos “amanhãs que cantam”. Coisas do meu esquinado passado esquerdista. Lembro-me de que a introdução de algum módico de racionalidade no desvario ditatorial do proletariado era sempre contrariado com essa incapacidade de “elevação de vistas”que a burguessíssima origem de classe me bloqueava e a que só os operários de todo o mundo (e os camponeses na China) poderiam alcandorar-se. Todos “nascidos na alturas”, bem entendido. Ou de como as teorias das elites e a marxizante visão da luta de classes são bons espíritos dispostos a alguma carnal convivialidade...
Longe de mim, qualquer intenção polemizante. Os posts do Alexandre são um refrigério estimável, ainda e quando nos levam mais pelo vale das sombras do que pelo “tumult in the clouds” do velho poeta (aristocrata?) irlandês. E, no fundo, as teses do plebeu metido a elitista que é Roger Scruton são, como tudo o que se escreve, “ficções”.
Hoje mesmo, e sobre outras “ficções”, João Pereira Coutinho anima o “Expresso” com uma bela prosa. Quando se comparam classes, raças, sexos, passe embora o direito que a todos assiste de escreverem as ficções que muito bem entendam, tenho para mim que há uma obrigação mínima para uma teoria ser galante e aristocrática: a de fugir à fácil muleta da generalização.
Para as ficções que cultivamos, cada um escolhe também o pathos que muito bem entende. O de Scruton quer ser elegíaco e elitista, ilegítimo no berço dirá o Alexandre, mas vertido, digo eu, numa prosa irrepreensível, de um bom gosto limpo de inanidades sobranceiras. Ainda assim, a ser-me dado escolher, neste fim de tarde que o sol de Outono aquece, prefiro deixar-me levar pela interioridade estóica e desencantada que emana destes versos de Yeats. Elitismo? Ou plebeísmo?
Para as ficções que cultivamos, cada um escolhe também o pathos que muito bem entende. O de Scruton quer ser elegíaco e elitista, ilegítimo no berço dirá o Alexandre, mas vertido, digo eu, numa prosa irrepreensível, de um bom gosto limpo de inanidades sobranceiras. Ainda assim, a ser-me dado escolher, neste fim de tarde que o sol de Outono aquece, prefiro deixar-me levar pela interioridade estóica e desencantada que emana destes versos de Yeats. Elitismo? Ou plebeísmo?
I KNOW that I shall meet my fate
Somewhere among the clouds above;
Those that I fight I do not hate,
Those that I guard I do not love;
My country is Kiltartan Cross,
My countrymen Kiltartan's poor,
No likely end could bring them loss
Or leave them happier than before.
Nor law, nor duty bade me fight,
Nor public men, nor cheering crowds,
A lonely impulse of delight
Drove to this tumult in the clouds;
I balanced all, brought all to mind,
The years to come seemed waste of breath,
A waste of breath the years behind
In balance with this life, this death.
2 comentários:
Encontramo-nos todos, elites e plebeus, na poesia e no pó que nos espera.
Inez, se à Senhora de Branco não escapamos, que na vida nos guie aquele "impulse of delight" de que fala o o W.B.
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