quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Da Visão: Os bois pelos nomes

«O PSD não gosta de mim», diz José Miguel Júdice ao Diário Económico em notável entrevista publicada na passada semana. «Em compensação eu adoro-me», imagino-o eu a dizer aos seus botões. A auto-estima, qualquer especialista o demonstrará, é essencial para o equilíbrio emocional de qualquer ser humano. Mas a auto-estima em excesso é, também não sou eu que o afirmo, uma patologia séria. Que acarreta necessariamente os seus problemas. Inebria-nos, faz-nos perder a noção da realidade, turva-nos o raciocínio, e, como parece ser manifestamente o caso, leva um homem inteligente a dizer verdadeiras enormidades intelectuais.
Comecemos pela visão que tem do conceito de independência. Para o Dr. Júdice, independente não é quem opta por não se filiar num partido político por não se rever no seu projecto ou na sua praxis. Não é quem, de forma coerente com essa tomada de posição, aceita com naturalidade o facto de ficar alheado dos mecanismos tradicionais de acesso ao poder político e às suas benesses. Muito pelo contrário. Para o Dr. Júdice a independência confunde-se com despeito e é a mera consequência da ruptura com um projecto político que não sabe reconhecer o seu inestimável valor e tratá-lo com a deferência e o estatuto que sabe merecer. Imagine-se que «o último advogado de Sá Carneiro, o homem que mais teorizou o seu pensamento político» nem sequer é convidado para discursar nas homenagens ao líder histórico do PSD!
Passemos depois pela bizarra concepção que tem do tema das incompatibilidades. Ao Dr. Júdice parece-lhe absolutamente natural que alguém abandone um partido político a que se pertenceu nos últimos trinta anos para se lançar no apoio entusiástico de um projecto rival sem assegurar um período de nojo mínimo. Mais estranho, parece-lhe normal que se venha a saber que a «transição» foi precedida de um apetecível convite, endereçado precisamente pelo partido em que de repente encontrou tantas virtudes. E como se não bastasse, não vê qualquer problema em gerir, em nome do Estado, os destinos imobiliários da zona mais cobiçada do país enquanto continua a representar os mais diversos interesses privados com o seu chapéu de advogado de sucesso e a dirigir um interessantíssimo grupo hoteleiro. Se voltasse atrás «aceitava tudo com muito mais facilidade».
Finalmente observemos a defesa desse bizarro «fetiche» que é a fusão do PSD com o CDS. Não está em causa o diagnóstico certeiro que faz do desnorte ideológico do actual PSD. Não está sequer em causa a avaliação crítica que faz da orfandade de algum eleitorado de centro-direita. Mas sejamos sérios, estará o Dr. Júdice realmente convencido que a resposta a estes problemas passa pela fusão de um PSD que, concordo em absoluto, precisa de abraçar mais enfaticamente um ideário liberal para se demarcar do PS, com um CDS que faz do pior do populismo e do conservadorismo a sua imagem de marca? Será que acredita que essa proposta é no melhor interesse de um partido que sempre fez do «centro» político o seu território natural? Será que verdadeiramente crê que este tem alguma coisa a ganhar por deixar de existir uma referência política mais «radical» à sua direita? Ou será que está mais uma vez a confundir a análise política racional e fria (que tão bem é capaz de fazer) com os seus pessoalíssimos (e absolutamente respeitáveis) desejos? Pois para o Dr. Júdice haverá melhor líder para essa grande confederação das direitas que o próprio Dr. Júdice?

2 comentários:

Anónimo disse...

Não é só o PSD que não gosta do personagem. Eu não sou do PSD e também mudo de canal sempre que o homem aparece. Não há pachorra para ouvir certas pessoas...

Anónimo disse...

Também a mim o Dr. José Judice me tem deixado espantado de há uns tempos a esta parte.

Depois de um trabalho digno na Ordem dos Advogados, voltou-se escandalosamente para os negócios e, simplesmente, voltou costas à força da ideologia.

Penso que a sua passagem descarada para as hostes socialistas não têm a ver directamente com uma alteração naquilo que pensa politicamente, mas sim no seu actual interesse de facturar a todo o custo.

Além dos imensos réditos que já possui, desdobra-se em milhentas actividades comerciais e de influências díspares, com um único fim perceptível: os cifrões.

É curioso observar como, com a idade, os ilustres de famílias modestas se deixam atrair pelo vil metal, pondo em causa ideais e posições relacionadas com princípios.

Por isso vejam-se as "mudanças" do Dr. José Júdice, assim como as dos Drs. Saldanha Sanches (que agora diz que, com a idade, gosta de comer melhor e de beber um bom vinho...), António Vitorino, Garcia Pereira, Basílio Horta, etc., etc.

Enfim...digo eu.

Saloio