quarta-feira, 11 de julho de 2007

III. O discurso de Ratisbona

Continuemos.

Que argumentos invocaram? O de que o papa tem relevância política e que por isso deve conter o seu discurso.

Esta argumentação está exactamente no mesmo plano da que foi invocada em relação a Galileu. Assim como em relação a este uma escolástica tardia (saliento, tardia) invocou argumentos teológicos que nunca sequer foram unânimes na própria escolástica, da mesma maneira se disse que o papa tinha um programa anti-islâmico mais ou menos escondido. Mas o pano de fundo da oposição a Galileu, que de resto quase toda a sua vida foi apoiado pelo papa, era político. Não era altura, em plena Reforma protestante, para abalar a fachada (não os alicerces, entenda-se) de um determinado edifício secular. Da mesma maneira o que se objecta em relação ao papa não é intelectual nem espiritual como pano de fundo, mas político.

Ora a livre discussão intelectual deveria ser livre de considerações políticas. Os opositores do papa são os modernos inquisidores que pretendem levar até às aulas considerandos políticos. Descendentes plebeus de Metternich, dos opositores protestantes e católicos a Darwin, são reaccionários e detestam a livre discussão pela livre discussão. São no fundo opositores à liberdade de pensamento.

Se bem virmos, por outro lado, a argumentação dos opositores era a de que o discurso poderia exaltar os muçulmanos. Seja. Percebe-se a imagem que têm dos muçulmanos. Acham-nos um conjunto de exaltados.

São os mesmos que propalam a separação entre a igreja e o Estado. Os laicos, conceito cristão, se o há. No entanto, estão dispostos a intervir na vida da igreja por razões políticas. Ou seja, não são favoráveis a uma separação, mas a um domínio da religião e da discussão intelectual pela política.
E não apenas domínio, ou um domínio qualquer, há um programa bem mais concreto. Nunca mandaram calar o orador do Londonistão, e muito menos o grande Mufti turco. É a igreja católica que mandam calar. O programa é o de calar a igreja católica para deixar livre curso à espontaneidade islâmica. Ou seja, o seu programa é de submissão, de contenção de uma cultura em favor de outra.

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