domingo, 1 de julho de 2007

Haverá ainda Europa?

As origens da Europa estendem-se por múltiplas raças e por múltiplos movimentos de povos através do continente europeu. A terra em que se definiu a Europa não é em si, enquanto extensão espacial, a sua razão de existir. Podemos sempre dizer que antes de uns estiveram outros e que estes são resultados de fusões, absorções ou misturas daqueles. O que importa não é tanto essa genealogia mas a genealogia de um acordo que deu origem a uma forma de vida e de organização da existência que fez da Europa aquilo que ela pode dizer que é.

Os dois momentos fundadores são o aparecimento da filosofia platónica na Grécia e do Cristianismo. É sobre estes dois pilares que a Europa se ergue. Vários séculos passaram até a Europa triunfar suportada por estes dois pilares. Também vários séculos passaram após a destruição destes dois pilares até que a Europa se extinguisse ou venha a extinguir. Com o repúdio da filosofia que dá a cada um o saber universal pelo saber de si próprio e com o repúdio do Cristianismo que dá realidade ao mundo sensível e o une ao mundo inteligível, consumar-se-á o fim da Europa. Agora, no espaço europeu há apenas um corpo a definhar arrastando os seus trajes rasgados, as suas feridas e as suas angústias.
O novo homem que se ergue confiante de uma nova Europa já não é europeu, é o homem global, um operacional da realidade vazia, reduzida a escombros... a vastas extensões de escombros.
Podia ser diferente? Não importa: não foi. Poderá ser diferente? Depende dos homens e do modo como pensarem a verdade, a justiça e a liberdade. Porque o que a filosofia a partir de Sócrates e a religião com o Cristianismo trouxeram, foi: primeiro a possibilidade do homem ser livre pelo pensamento; e, segundo, a realidade do ideal pela encarnação redentora da verdade. As voltas que quisermos dar fora destes dois pilares serão vias intermináveis e sem saída, como aliás, têm sido. São os sucessivos insucessos que tornaram o homem moderno pessimista quanto ao seu valor e ao valor da sua racionalidade. A negação do pensamento que pensa a transcendência e a negação da verdade transcendente revelada, são a negação de toda e qualquer forma de racionalidade concreta, é o domínio do irracional, da ficção, da fábula.
Fora de qualquer finalidade, o pensamento não é propriamente pensamento. Reduz-se apenas aos raciocínios caseiros, reduz-se ao utilitarismo, ao materialismo e ao sentimentalismo. Fora de qualquer finalidade de redenção a religião não é mais que uma pequena moral de boas maneiras e de outras convenções.
É certo, que o dia-a-dia nos afasta das grandes interrogações, dos pensamentos vagarosos e do firmamento da religião; é certo, que o homem é imperfeito e imperfeitos são os seus actos, imperfeitas as motivações das suas acções, erróneas muitas das suas decisões, erróneas e contraditórias, mas se o caminho for a correcção da imperfeição, a alteração das suas motivações e a superação dos seus erros, é possível descortinar um ideal, uma luz de esperança. Se, ao contrário, o caminho for o de querer reconhecer nessas imperfeições, motivações e erros a própria natureza do homem, torna-se impossível sequer imaginar uma razão de ser para a existência humana. Sem o reconhecimento do erro, do pecado e da culpa não há progresso espiritual, não há vida espiritual, é como se não houvesse espírito e o homem fosse apenas um espelho embaciado ou despolido incapaz de reflexão e de consciência.
Poderá ainda esse espelho reflectir a Europa, uma ideia de liberdade entre povos livres?

1 comentários:

António de Almeida disse...

-Confesso que afirmar os 2 grandes momentos da Europa a filosofia Platónica e o nascimento do Cristianismo acho um pouco (para não dizer muito redutor), passando por cima do império Romano, ainda que o nascimento do Cristianismo se dê em época temporal do império Romano, este já entrou em decadência, e afinal foi um império que durou séculos, mas penso que após o declínio do I.R., e o passar da idade das trevas, o renascimento, o iluminismo, a rev. Francesa, marcaram e muito a identidade europeia, e ainda hoje definem muito do que são a nossa essência, os nossos valores.