quarta-feira, 25 de abril de 2007

Let the Crescent in

Let the Crescent in


A questão da adesão da Turquia à comunidade Europeia é para mim um assunto que desperta razões e emoções nem sempre alinhadas.
Começo por afirmar que a minha posição inicial sobre o tema e que ainda não reformulei é a de concordância em relação à dita adesão.
De facto parece-me importante nos dias de hoje ter a possibilidade de fazer ingressar no nosso espaço europeu um país como a Turquia que se tem batido denodadamente por preservar a separação do poder laico em relação ao poder da religião sobre o estado. Dir-me-ão que a maioria da população turca tem uma matriz social e religiosa bastante distinta da que prevalece nos países europeus e que a sua inclusão no nosso seio acarretará uma desvirtuação dos valores que nos têm caracterizado. Pois não necessáriamente, se tal evolução se der no sentido da inclusão desses 70 milhões de pessoas, permitindo-lhes um acesso mais democrático à livre circulação e debate de ideias, o que em minha opinião é a melhor forma de combater o isolacionismo e ultramontismo que caracterizam qualquer forma de fundamentalismo religioso ou outro.
Do ponto de vista económico, e na perspectiva de um completo leigo, parece-me fazer sentido nos dias que correm de inapelável e diria mesmo saudável globalização juntar esta massa crítica e esta enorma fatia de mercado á nossa existente união. Do pouco que me é dado conhecer da realidade da Turquia parece-me existir uma fatia pequena mas poderosa da população, mais afluente e influente, que se rege por padrões tão ocidentais quanto os nossos, dinâmica e empreendedora tanto cultural como económicamente e que poderá garantir o sucesso de semelhante operação se devidamente apoiada.
Votar ao ostracismo um país que, ainda que de forma inconstante ou não homogénea, demonstra estes desígnios parece-me no mínimo pouco prudente ou mesmo uma perigosa falta de visão ou ousadia políticas.
Quanto à matriz cristã fundadora dos príncipios, valores e da realidade europeia tal como a conhecemos ainda hoje, também aí o argumento contra me parece limitado. Mesmo a nível supranacional a separação entre o estado laico e o religioso deve prevalecer sem que com isso nos ‘canibalizemos’ e sejamos levados a aderir a valores ou condutas que consideramos menos próprias de sociedades ditas evoluídas. Aqui sim, a franca e afirmada supremacia dos nossos valores quando exercidos de forma cordata e sedutora prevalecerá como acontece nas relações com outros países fora do eixo Europa/América, como é o caso da China, Índia e outros quejandos.
É verdade porém que esta posição enferma de várias fragilidades assentes em outras tantas interrogações.
Ao elaborar este meu raciocínio confio e presumo que este será o curso esperado e que o preço que teremos que pagar não venha a ser demasiado elevado. Refiro-me não tanto aos argumentos económicos de um pequeno país como o nosso infelizmente ainda tão dependente da ajuda externa da comunidade (muito por culpa nossa que temos vindo a desbaratar e a absorver mais por interesses particulares, mesquinhos e tantas vezes venais os dinheiros comunitários) mas mais aos argumentos securitários que apregoam a grande fragilidade a que estaremos sujeitos dando assim o flanco ao temível fundamentalismo islâmico.
Também aqui não possuo uma resposta cabal que me deixe totalmente confortável. O meu ‘gut-feeling’ é no entanto que este mesmo argumento poderá constituir exactamente a melhor arma para os trogloditas que despudoradamente se têm apoderado do destino dos milhões de almas que vivem sob o seu jugo, fundamentalmente por poderem garantir um continuado estado de obscurantismo e consequente ausência de informação e esperança a essas populações.
Um factor final que me parece de importãncia primordial: Esta adesão, claramente defendida pelos EUA por razões estratégicas que se me afiguram fáceis de entender, poderá ela mesmo vir a ser grandemente torpedeada pela obstinada política de confrontação que os mesmos EUA têm vindo a desenvolver na era Bush. De facto a détente na região do Médio Oriente para a qual os mesmos EUA tanto poderão contribuir será, a meu ver, uma pedra de toque para garantir o sucesso ou insucesso desta evolução.

1 comentários:

Jorge Buescu disse...

Caro Manuel: partilho inteiramente das suas preocupações.

Se há hesitações quanto à adesão da Turquia, ao contrário de uma Estónia de uma República Checa ou de uma Roménia, é porque 80 milhões de habitantes é mais do que otem o Reuni Unido, a Itália, a França, e o mesmo do que a Alemanha pós-unificação. E a prazo um gigante desenvolvido, jovem e dinâmico seria um perigo para os actuais grandes da União. É este o medo. O resto é conversa.

Para um país pequeno, relativamente pobre e periférico como o nosso, a entrada da Turquia na UE seria um desastre. Era como um senhor gordo a entrar na banheira: saía a água toda. (E daí talvez não fosse mau: acabavam-se os subsídios e tínhamos de mostrar a sério o que valemos).

Estrategicamente, para o futuro da Europa, seria o melhor que podia acontecer. A melhor maneira de combater o fundamentalismo islâmico e o feudalismo obscurantista dos respectivos países não é invadi-los: é os não fundamentalistas mostrarem que afinal compensa ter o espírito aberto. O Egipto é o país árabe mais aberto, e portanto o mais avançado. Só por medo não deixamos que a Turquia se abra. Espero que não nos venhamos a arrepender!