Piergiorgio Odifreddi
A Itália é um país estranho. É um
grande, um imenso país de cultura, e acha-se um pequeno país. É talvez o único
que está nesta situação. O problema de países como a França, a Inglaterra e a
Alemanha é o de correrem sempre o risco de se fecharem sobre si mesmos, sem
disso se aperceberem.
A Itália, como se julga pequena, é ao
mesmo tempo grande com todas as vantagens, e sempre ansiando, aberta ao que se
passa noutros países. Cria por isso personagens com mundo, não estreitas na sua
especialidade.
Este é o caso de Piergiorgio Odifreddi.
Marxista, comunista, matemático, com um
delicioso sentido de humor, vou-o encontrando de vez em quando, seja em livros
seja na Internet. https://www.youtube.com/watch?v=ERO8sOki7aY
Quanto a ele pode-se usar um adjectivo
pouco usado. É jovial.
Tenho pena não o poder confrontar com
problemas do fundamento. Porque Odifreddi como bom matemático, bem sabe que os
grandes teoremas da lógica são teoremas de limitação. Porque não pode um
sistema logico ser consistente e completo ao mesmo tempo como Gödel mostrou? Porque
não pode um sistema logico estabelecer a sua própria verdade, como mostrou
Tarski?
Odifreddi talvez disse, como dizem
alguns matemáticos: porque é assim. Na demonstração tem de se parar, dizia o
bom do Aristóteles. Sem dúvida. Mas isso não o impediu de fazer metafisica. Porque
sabia que o problema da metafísica tem de ir além da demonstração. «Quella non
c’è» (la verità), afirma. Não existem porque são contraditórios. É a sua resposta,
mas então como escolhemos os axiomas de que partimos? A auto-evidência? Quem
define essa auto-evidência? Quem escolhe? Porque escolhe?
A metafísica é uma coisa muito
desagradável, reconheço-o. À partida não me suscita muita simpatia. Mas não
gosto eludir problemas. Conheço bem a atitude: sobre o que não se pode falar
deve ficar-se em silêncio. Não é acaso que Tarski não gostasse de Wittgenstein.
Teve décadas para perceber o seu conteúdo místico. Mas não era tanto o conteúdo
que lhe repugnava. Era o facto de ter sido enunciado. O simples facto de ter
sido enunciado era já ser metafisico.
O nosso velho Aristóteles já o sabia: é
preciso parar a demonstração, não o pensamento.
Talvez cada país tenha o que merece. Mas
tenho pena que em Portugal não haja ateus assim, em que a inteligência e o
sorriso vão de par. Acompanhado de um rapaz não muito dotado intelectualmente,
numa modorra que mal passa por serenidade, a verdade é que Odifreddi brilha
pelo seu sentido de humor.
Alexandre Brandão da Veiga
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