terça-feira, 7 de setembro de 2010

Tagarelice e matemática I







Num maravilhoso e muito claro estudo sobre “O Politico” de Platão, Heidegger mostrou que o seu sentido geral era o de desmascarar a tagarelice. Bem sei que o adjectivo “claro” e Heidegger muitas vezes não vão de par, mas muita da má fama deste filósofo tem a ver com má tradução. É verdade que tem alguma tendência a partir palavras, naquilo a que Jung chamava de estilo esquizofrénico (referia-se a ele e a Joyce sem os nomear, se bem me lembro) o que mostra uma tendência da época algo agastante, reconheço-o. Mas algo não lhe pode ser imputável, porque sabia que tinha de usar a linguagem para falar do indizível, e não era poeta como Goethe.

A verdade é que a obra não é das mais estudadas de Platão e a abordagem, embora muito profunda, pode ser alvo de discussão. Mas as suas ideias parecem-me ainda hoje muito válidas. No espaço público impera a tagarelice, e isso tem implicações não só políticas, como éticas e de ciência.

Comecemos pelas últimas, porque isso nem sempre é mau. A tagarelice, em vez de desvelar, lança um nevoeiro sobre a realidade. Ocupa o tempo, é uma forma de matar o tempo. E mata-o efectivamente. Torna-o inútil. Mas obnubila o ser (continuo a sentir repulsa em maiuscular os conceitos filosóficos, porque me cheira demais a uma tendência para ênfase retórica que apenas esconde a platitude das ideias). Quanto mais se fala de forma desordenada, mais se esconde e desvia do que é essencial.

Eticamente faz nascer o irresponsável, que mais não é que o responsável por acaso, a título fortuito. Numa sociedade humana em que não haja a responsabilidade ética na construção do discurso, este torna-se aleatório e torna-se cada vez mais difícil perceber a diferença entre o sentido e o “flatus uocis”. Entre dois sujeitos falantes, ambos emitem ondas sonoras. Estabelecer os critérios que distinguem o que faz sentido e o que apenas o esconde torna-se cada vez mais difícil.

O ágora foi sempre o local do mexerico, do rumor, e em geral da tagarelice. Seja em que regime for. Mas a democracia inspira e instala um regime de desresponsabilização que tem os seus custos. A ideia é nobre e boa (a democracia é um ideal aristocrático por excelência, é bom de ser ver), mas a prática mostra que à liberdade se segue facilmente a cacofonia.

E é esse o sentido político desta obra. A democracia exacerba a tagarelice, dá-lhe um estatuto de discurso oracular, tende a tornar indistinto o discurso com valor do que o não tem. Não se trata mais uma vez de maltratar a democracia, trata-se tão simplesmente de a olhar com lucidez. A mais bela mulher já teve pontos negros. Esquecê-lo não ajuda em nada à sua limpeza de pele.

2 comentários:

Burberry handbags disse...

Esta mãe devia ter feito alguma pedagogia positiva, dando graças por tudo que têm, numa fase em que há tanta pobreza e desemprego.Mas a sua ambição não deixa de ser positiva, porque provavelmente irá lutar por aquilo que deseja, inclusivé quem sabe encontrar um melhor emprego, apostar em ser uma empresária de sucesso, é sempre bom querer mais, com bom senso e inteligencia, ficar contente com o que já se adquiriu na zona de conforto,não é muito aconselhável!!

Táxi Pluvioso disse...

E graças a Deus que um português salvou o ser do esquecimento: inventado a estátua.