sexta-feira, 26 de junho de 2009

A criança que nunca teve uma infância

Não fui um fã – a fase mais interessante da sua carreira musical aconteceu quando eu era demasiado novo, e Michael Jackson já se tornara num quase-sinónimo de bizarro quando comecei a ouvir música. Dito isto, e com a distância que vem com o tempo, reconheço que esteve envolvido em músicas de pop genial, que ainda hoje têm groove e alma. Provas? Duas, para citar as mais óbvias (mas há mais): Billie Jean e ABC. Derrubou barreiras musicais, levando o som de Motown – ainda que de forma cada vez mais diluída – primeiro à América branca, e depois a todo o mundo. Foi o precursor do pop moderno, também pelo seu lado negativo (por exemplo o predomínio do lado visual na música. Como diz um músico amigo meu, hoje em dias as pessoas já não ouvem música – vêem-na).

Lembro-me de um artigo sobre Michael Jackson, no New Musical Express, no início da década de noventa. O artigo era – talvez um pouco como o seu sujeito – um óvni entre as entrevistas a obscuras bandas que pululavam no NME. Não tenho a certeza do autor (creio que era Danny Baker, na altura ainda um angry young man do NME) mas lembro-me bem do argumento central: o Michael Jackson adulto tentava recriar a infância que nunca teve, e daí o Neverland Ranch, com o seu jardim zoológico e parque de diversões, ou as (at best ill-advised) sleepovers com crianças, que lhe dariam uma reputação a que nunca conseguiria escapar. Enfim, o argumento era puro pop psychology, mas sincero (algo de raro no NME).

Uma década mais tarde, em 2001, Michael Jackson foi a Oxford, para discursar na Oxford Union. Na altura estava lá. Não fui ao discurso mas um amigo meu fazia parte da direcção da Union na altura, e a sua descrição de Michael Jackson no backstage encaixa com a noção de uma criança presa no corpo de um adulto – ou, talvez, de um adulto que procurava tornar-se criança. Quando chegaram à Union, Michael Jackson vinha acompanhado de uma entourage considerável. Nada de surpreendente aqui – afinal, há já algum tempo que o grau de celebridade é medido pela dimensão da entourage. Mas se um dos papéis de qualquer entourage é massajar o ego da celebridade, no caso de Michael Jackson esse papel era desempenhado de forma particularmente literal. Durante o tempo que ele esteve na Union, tanto antes e depois do seu discurso, Michael Jackson estava rodeado por várias pessoas cuja única aparente função era demonstrar-lhe afecto: seguravam-lhe a mão, acariciavam-no, faziam-lhe festas com pretensa terneza - e iam-lhe dizendo “We love you Michael”, “It’s ok, Michael”, “You're doing great, Michael”, em tons semelhantes aos usados com crianças.

Michael Jackson tinha, na altura, 42 anos de idade.

1 comentários:

Anónimo disse...

talk about creepy...