Far west
Mal refeita da gripe,fiz-me à estrada. Deixei Lisboa pela A8, fui para a provincia por uns dias, para o Oeste. Terras saloias, visitar casas de sempre, família. Peniche, aldeias vizinhas, Óbidos, Caldas.
Em Lisboa a minha realidade é igual à das pessoas com quem convivo. Lemos os mesmos jornais, vemos tv por cabo, notícias em canais temáticos, portugueses e estrangeiros, lemos os blogs de referência e comentamos a actualidade. Acompanhamos conflitos e discordâncias nos jornais diários e todos sabemos o que disse Cicrano de Fulano e o que respondeu Fulano. O André Freire que defende a sua dama, o Vital Moreira que contesta, o André Freite que replica.
A informação tem um peso maior em Lisboa, o poder está aqui, a ambição pelos lugares sente-se mais em Lisboa e por isso a guerillha da propaganda sente-se mais em Lisboa.
Saio de Lisboa, passo por montes presepianos verdinhos, prenhes de torres que alternam com os moínhos da minha infância e quando chego a Peniche,o mundo muda de repente.
Ninguém tem televisão por cabo, ninguém escreve/lê blogs, ninguém lê o Público, ninguém vê a Sic-Notícias. Rigorosamente não significa que ninguém o faça, mas fá-lo isoladamente, não em comunidade.
Quando entro no café,a tv não está sintonizada na Sic-Notícias,mas nos programas de entretenimento matinal das televisões generalistas. As pessoas não lêem o Público, lêem o Correio da Manhã, de preferência do próprio estabelecimento.
O círculo em que me movo em Lisboa, fruto das escolhas que fiz na vida, congrega pessoas que fizeram idênticas escolhas, de forma que nos assemelhamos no pensamento e nas discordâncias, e vejo o mundo a partir desse lugar.
O círculo em que me movo quando vou a Peniche é completamente diverso: feito das sobras da pesca, de pequenos comerciantes que despedem trabalhadores e que encerram portas. De octagenários, avós, tios-avós que vivem de pensões ou reformas. Irmãos a acabar de licenciar sem perspectivas de futuro em Portugal.
Desta vez fiz por viver como se vive por lá. A olhar para uma tv de quatro canais e sem net, Portugal parece-me um sítio diferente, mais a certeza de que algo correu muito mal e para muita gente.
De modo que no meio disto quando o Presidente da República vai à televisão fazer o discurso de Ano novo e fala para o povo, o povo da televisão generalista e sem net, tem um enorme impacto.
O que espantou muito boa gente.Tanto, tanto que começaram logo, de seguida, a dizer que sim senhor, que foi bom. Mas atenção,explicando porque é que nada disso terá qualquer impacto positivo no PSD. Que será até muito mau para o PSD que o Presidente teça críticas.
Ora eu, com o pensamento embotado da simplicidade daquele lugar e daquela gente, não consigo ver como é que se o PSD falar para as pessoas, como fez o PR, possa saír prejudicado da façanha.
2 comentários:
Será mesmo a simplicidade que embota o pensamento? Este penicheiro interroga-se...
Queria apenas chamar a atenção para uma coisa que me parece evidente e de que até eu me esqueço e não devia. Convém saírmos da nossa zona de conforto e irmos a outros sítios, que por razões várias até nos podem ser desconfortáveis, observarmos e tentarmos ver o que os outros estão a ver, a partir do seu ponto de vista.
Eu gosto de Peniche e gostei muito do discurso do Presidente.
Sobre a simplicidade não falo que é dos assuntos mais difíceis que conheço.
E sobre Peniche, também não gosto muito, deixa-me triste.
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