terça-feira, 2 de dezembro de 2008

39º Celsius


Crónica falsa e recomendação depressiva encontrados nos perdidos do Pnet Homem


Bati um recorde pessoal. Cheguei aos 39,3º de temperatura. Um febrão como, julgo, só terei tido nos palúdicos tempos de Angola. Foram 48 horas e devo ter delirado, mas pouparam-me às enormidades que possa ter dito. Resultado, hoje, ainda febril e temendo efeitos colaterais, não há crónica. Eu que exagero, e não é pouco, nos adjectivos e outros ademanes literários, ainda acabaria por submergir inocentes e pacientes leitores com inopinados oxímoros ou, o que não seria melhor, corria-os todos a alexandrinos.

Antes destes sintomas se terem manifestado, tinha começado a ler e nos momentos de lucidez, digo eu, continuei e terminei a leitura de um livro que recomendo vivamente. Chama-se "Ennemies Publics" e contem a correspondência trocada, de Janeiro a Julho de 2008, entre dois intelectuais franceses, Michel Houellebecq (um romancista que admiro) e Bernard-Henri Lévy (filósofo de grande inteligência).

A primeira frase do livro, da primeira carta de MH a BHL, anuncia uma empresa de desassombrada racionalidade: "Tudo, como se diz, nos separa - com excepção de um ponto fundamental: somos, tanto um como o outro, dois indivíduos bastante desprezáveis".

A seguir, em pouco mais de 300 páginas, MH e BHL, seguindo um modelo confessional que os aproxima da ideia de literatura como tauromaquia, fazem uma radiografia de quase todos os grandes temas que, na época em que vivemos, podem dar consistência e fundamento ao que, para não estar a complicar muito, chamaria "uma visão do mundo". Política, filosofia, islamismo, judaísmo, sexo, a vida pessoal são debatidos com uma frontalidade pouco habitual, tendo até em conta que o objectivo confessado da correspondência era a publicação em livro. Não percam. Eu consegui chegar aos 39,3º. Mas há febres que valem a pena.



um vídeo esclarecedor

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