Tributo aos leitores de jornais
Henri Cartier-Bresson, Livorno, 1933
A minha leitura dos jornais passa obrigatoriamente pelas «cartas dos leitores». Gosto do vislumbre de esperança permitido pela certeza de que, do lado de cá, a ler o que eu leio, está gente atenta, gente válida, gente crítica.
Vem isto a propósito de uma «carta ao Director», hoje divulgada no Público, que muito me impressionou.
Trata-se de um testemunho sentido e profundo, bem pensado e bem escrito, que tem por título “A apologia do desmérito”. Assina Francisco Queirós, aluno da Escola Secundária Garcia de Orta (Porto).
Eu não fiquei indiferente e julgo que ninguém poderá ficar. Por isso, e sem mais comentários, transcrevo na íntegra.
A apologia do desmérito
Vem isto a propósito de uma «carta ao Director», hoje divulgada no Público, que muito me impressionou.
Trata-se de um testemunho sentido e profundo, bem pensado e bem escrito, que tem por título “A apologia do desmérito”. Assina Francisco Queirós, aluno da Escola Secundária Garcia de Orta (Porto).
Eu não fiquei indiferente e julgo que ninguém poderá ficar. Por isso, e sem mais comentários, transcrevo na íntegra.
A apologia do desmérito
Dissera a Sociedade Portuguesa de Matemática, a propósito do exame nacional do ensino básico, que o facilitismo é desmotivador. Achei o juízo mais uma ideia vaga no longo e eterno debate sobre as questões ligadas ao ensino e à educação que atravessa a sociedade.
Compreendi, porém, a essência da afirmação ao realizar o exame nacional de Matemática A (12.º ano). Uma desilusão. Um tempo desproporcionado para a extensão da prova, perguntas que não iam além do linear… Trigonometria? Nem vê-la!
Um ano inteiro de estudo regular e empenhado, duas semanas de intensa preparação, a vontade de ver o mérito objectiva e rigorosamente reconhecido a nível nacional. Tudo decepcionado por um exame que ilustra a filosofia por que enveredou o sistema de educação. O facilitismo. A cultura da mediocridade. A ávida apologia do sucesso estatístico (obviamente ludibriado).
Haverá beneficiários contemplados nesta cultura? Pois com certeza! O esforço nulo, a preparação ligeira e o alheamento geral não impedem resultados lisonjeiros. Pretensamente lisonjeiros, diga-se com destemor.
Ver no mesmo patamar uma incrível concentração de alunos com diferentes graus de conhecimentos, de dedicação e de esforço pode ser politicamente correcto – numa linha de pensamento que veja, desta forma lamentável, a educação como a promoção da integração social. Pode inclusive ser democrático – num sentido impróprio da palavra democracia. É, contudo, decepcionantemente desmotivador.
É triste terminar a disciplina de Matemática A e concluir que nenhuma função relaciona mérito e bons resultados.
Um ano inteiro de estudo regular e empenhado, duas semanas de intensa preparação, a vontade de ver o mérito objectiva e rigorosamente reconhecido a nível nacional. Tudo decepcionado por um exame que ilustra a filosofia por que enveredou o sistema de educação. O facilitismo. A cultura da mediocridade. A ávida apologia do sucesso estatístico (obviamente ludibriado).
Haverá beneficiários contemplados nesta cultura? Pois com certeza! O esforço nulo, a preparação ligeira e o alheamento geral não impedem resultados lisonjeiros. Pretensamente lisonjeiros, diga-se com destemor.
Ver no mesmo patamar uma incrível concentração de alunos com diferentes graus de conhecimentos, de dedicação e de esforço pode ser politicamente correcto – numa linha de pensamento que veja, desta forma lamentável, a educação como a promoção da integração social. Pode inclusive ser democrático – num sentido impróprio da palavra democracia. É, contudo, decepcionantemente desmotivador.
É triste terminar a disciplina de Matemática A e concluir que nenhuma função relaciona mérito e bons resultados.
(vd. Público, 25 de Junho de 2008, p. 40)
6 comentários:
Carta aberta ao Francisco Queirós: caro Francisco, não encare o ocorrido como uma desilusão, mas sim como um episódio edificante e construtivo sobre o futuro em geral e o seu em particular. E se me permite um conselho, daqui por diante, não se ponha com conversas de mérito, de rigor e de perfeccionismo, corre o enorme risco de ser mal interpretado .
Creia-me sua amiga, Sofia Rocha
para o Chico Queirós: não sejas tão marrão, pá....
Sinceramente, o risco de ser mal interpretado pouco ou nada me afecta... Preocupa-me sim, e reitero o meu ponto de vista, um sitema de ensino que não priveligie o mérito. E não tenho problema algum em falar de mérito. Quem me acusar de arrogância intelectual, de altivez moral ou de outros atributos afins faz juízos muito precipitados sobre mim. Quem me chama "marrão" deveria conhecer-me bem melhor... Até porque não vejo mérito algum em marrar...
Com que então o Francisco anda por aqui? Faz bem. Não me leve a mal, mas eu estava a ser irónica. Se me permite, duas coisas. A primeira, minha e por isso fraquinha, resiliência e sentido de humor. A segunda,a que vale a pena, de um grande escritor português, Cardoso Pires, " Fazer-se de cego, é virtude de quem vê demais". Fique bem e boa sorte Francisco.
Tal como a Sofia Galvão, presto o meu tributo aos leitores de jornais. O gosto pela boa escrita (se tenho alguma) aprendi-a a ler a Bola de 1968 a 1973. Uma Biblia. Se houvesse uma Bola da matemática, talvez a minha alma não penasse no limbo da incompetência. Louvo, por isso, o talento a exigência do Francisco. Pena que a carta seja tão cirúrgica. Muito bisturi e pouco sentimento, diria eu.
o francisco queirós tem toda a razão e quem disser o contrário é um ovo podre. Tá bem assim? já falamos todos a mesma linguagem? tá bom então, beijinhos, vá, txau, com licença
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