quarta-feira, 30 de maio de 2007

IV. A herança de Blair

Internamente deixou igualmente bastas fracturas.

Embora tenha conseguido a descentralização (a “devolution”) da Escócia e em parte do País de Gales, conseguiu alienar o escocês, tradicionalmente anti-conservador e mais trabalhista, para uma cada vez maior simpatia para o Partido Nacional Escocês.

Mostrou com a Guerra no Iraque uma fractura abissal entre a vontade popular e os seus representantes, mais do que uma democracia representativa pode suportar a longo prazo. Pela primeira vez em muito tempo os britânicos sentiram que numa questão essencial o poder popular irreleva. Nesse aspecto é apenas mais uma ocorrência de uma regra geral: a de que, em democracia, quando os povos desprezam os políticos são por eles desprezados. Mas mostrou igualmente os limites do nexo de representação numa democracia, nisso sendo banal e acompanhado pela Itália e pela Polónia por exemplo. Mais uma vez é apenas mais um exemplar de uma regra geral, seguiu o seu tempo, em nada o ultrapassou e em nada anunciou um paradigma para o futuro.

Quis fazer do multiculturalismo inglês o paradigma europeu e acaba o mandato a ter de restringir esse mesmo modelo. Desprezando os conselhos da DST francesa levou quase oito anos a perceber a sua valia, e fê-lo tardiamente. Mostrou-se generoso com os cidadãos dos novos países aderentes, para depois já em relação à Bulgária e à Roménia estabelecer restrições. Esperava que com a entrada da Turquia as emigrações se dirigissem para a Alemanha e para a Bélgica, sendo por isso irrelevante (na aparência) para a Inglaterra, mas começa a ter pensadores políticos que se começam a perguntar se a Inglaterra não terá o impacto directo dessa imigração, o que está a arrefecer algum entusiasmo deste apoio.

Há quem o compare com Gorbachov, mais amado no exterior que no seu próprio país. Comparação algo forçada, porque a obra de Gorbachov, incompleta que seja, foi essencial para evitar ao mundo uma guerra mundial, possivelmente nuclear, o que seria bem credível com um império agonizante. De comum, só o facto de ser detestado pelo seu próprio povo, pouco mais.

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